Editorial: O fim do nepotismo
Vitória (ES)- O editorial "O fim do nepotismo" foi publicado na edição de hoje (29) do jornal A Gazeta do Espírito Santo:
"A decisão do Conselho Nacional de Justiça, de proibir o nepotismo no Poder Judiciário, representa um passo importante para a modernização de todas as instituições públicas, não apenas para o poder em questão. Por efeito cascata, uma vez proibido o nepotismo no Judiciário, os outros poderes tenderão a seguir o exemplo. A decisão do CNJ, que foi criado para fiscalizar a atividade dos tribunais, fortalece as manifestações da sociedade civil, que tem se revelado contra essa prática.
A medida é saudável para a administração pública por pelo menos duas razões imediatas: ela impõe novos padrões de moralidade na contratação de funcionários, e também de eficiência gerencial na máquina administrativa.
A contratação eventual de um parente, por si só, poderia ser justificável pelo critério da competência técnica. Exemplo notório é a atuação do economista André Franco Montoro Filho na equipe de seu pai, Franco Montoro, que governou o Estado de São Paulo de 1982 a 1986. Franco Montoro é tido como um dos grandes governadores daquele Estado. Atuaram em sua equipe personalidades como José Serra, José Gregori, Michel Temer e Geraldo Alckmin. E ele nunca foi acusado de nepotista, justamente pelo reconhecimento profissional de seu filho.
Há outros exemplos. Na própria magistratura, há vozes que defendem uma espécie de cota para a possibilidade de livre nomeação de um parente para cargo de estrita confiança. Mas não é isso que se costuma criticar. O que causa indignação na sociedade é a contratação indiscriminada de familiares, sem critérios claros, não apenas no Judiciário, mas também no Executivo, no Legislativo e no Ministério Público, a um nível tal que, aos olhos da população, é natural que a prática seja vista mais como uma forma de reforçar o orçamento familiar.
Num mercado de trabalho cada vez mais competitivo, em que estudantes e profissionais buscam permanente qualificação para disputar espaços, é de causar repulsa que prevaleça a lógica dos laços de família para preenchimento de cargos públicos. Quando há famílias inteiras instaladas no mesmo poder, há que se perguntar: serão mesmo todos tão brilhantes?
A Ordem dos Advogados do Brasil tem sido uma das mais contundentes críticas do nepotismo. Para a OAB, a preponderância de familiares na ocupação dos cargos pode levar a uma cultura de compadrio, avessa à transparência e à eficiência.
Não por acaso, os princípios da moralidade, publicidade e impessoalidade na gestão da coisa pública estão inscritos na Constituição Federal. Aliás, o Supremo Tribunal Federal e o Tribunal Superior do Trabalho já proíbem o nepotismo.
A sessão de terça-feira do CNJ durou mais de 5 horas e ainda não está clara a extensão da nova norma. Sabe-se, por ora, que será proibida a contratação, para cargos comissionados, de parentes em segundo ou até terceiro grau de magistrados ou de funcionários da Justiça.
Mas somente na próxima reunião do CNJ, no dia 18 de outubro, é que se definirá a data de publicação da norma, o prazo para desligamento, a forma com ocorrerá a comunicação do número de parentes existentes em cada instância, a punição para quem desobedecer à regra e, principalmente, qual grau de parentesco será efetivamente considerado nepotismo.
De todo modo, trata-se de uma conquista: a decisão está tomada, e ela representa um avanço para renovar a credibilidade de nossas instituições.