Advogada gaúcha chega à direção da Ordem dos Advogados
Rio de Janeiro, 31/01/2007 - A advogada Cléa Carpi da Rocha, do Rio Grande do Sul, assume amanhã (01) função de direção no Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil. Ela concorre, nas eleições da noite de hoje, em Brasília, à secretaria geral da entidade, na chapa única encabeçada por Cezar Brito à sucessão do atual presidente Roberto Busato. A eleição acontece logo mais e a posse será amanhã. Embora a advocacia tenha se democratizado, com o ingresso cada vez maior de profissionais do sexo feminino, Cléa reconhece a importância do momento.
A participação da mulher nos órgãos de direção da OAB realmente não corresponde a sua forte presença na advocacia, mas isso está mudando, afirmou a advogada, que é conhecida por romper barreiras. Presidente da Associação Americana de Juristas Continental, ex-vice-presidente da Associação Internacional de Juristas Democráticos e ex-presidente da Seccional gaúcha da OAB, Cléa reúne qualidades para defender os interesses da advocacia e da sociedade. Devemos ser firmes nessa defesa, enfatiza.
Segue a entrevista concedida à jornalista Giselle Souza do Jornal do Commercio, do Rio de Janeiro:
P- Na sua avaliação, qual é a importância de uma mulher assumir a secretaria geral, setor considerado estratégico para o Conselho Federal da OAB, tendo em vista que a entidade, historicamente, sempre foi marcada por maior participação de profissionais do sexo masculino?
R - Primeiro, vamos aguardar a eleição. Eu integro a chapa, única é verdade, fruto de um amadurecido consenso que envolve o processo sucessório da OAB nacional, tendo como candidato a presidente o conselheiro federal César Brito. Todavia, constituiu para mim um honroso convite integrar essa chapa, que recebi como um reconhecimento e homenagem ao valor do advogado e da advogada gaúchos ao longo da história da Ordem e do País. Segundo, a categoria não é mais composta em sua maioria por homens, pois advogados e advogadas estão praticamente com a mesma participação no universo da advocacia. No entanto, a participação da mulher nos órgãos de direção da OAB realmente não corresponde a sua forte presença na advocacia, mas está mudando. E penso estar colaborando para isso desde minha a eleição para vice-presidente e presidente da OAB gaúcha e para conselheira federal, e sendo, agora, indicada para concorrer na condição de secretária geral do Conselho Federal.
P - O que faz a secretaria geral do Conselho?
R - Sua competência está fixada no Regulamento da OAB. É de sua responsabilidade presidir a Primeira Câmara, que é a que decide os recursos sobre a atividade da advocacia, direitos e prerrogativas dos advogados e estagiários, inscrições no quadro da OAB, entre outros pontos. Além disso, compete à secretaria geral dirigir os trabalhos da Secretaria do Conselho Federal, secretariar as sessões do Conselho Pleno, emitir certidões e declarações do Conselho Federal, mas a função principal dos diretores do Conselho Federal, eleitos para representar a entidade e os advogados, junto com os conselheiros federais representantes das seccionais dos 27 estados, é de natureza política, consubstanciada na defesa da Constituição, da ordem jurídica do Estado Democrático de Direito, dos direitos humanos, da justiça social, e na luta pela boa aplicação das leis, pela rápida administração da justiça e pelo aperfeiçoamento da cultura e das instituições jurídicas, sem esquecer da representação, da defesa, da seleção e da disciplina dos advogados em toda a República Federativa do Brasil.
P - Quais são as suas propostas à frente da secretaria?
R - Serão as propostas decididas pela Diretoria, tendo como meta principal a efetivação das decisões do colegiado.
P - Haverá alguma política específica para a mulher advogada?
R - A OAB tem uma comissão especifica muito importante nessa área. Entre os objetivos sobreleva a valorização da mulher advogada, combate a sua discriminação no exercício profissional e incentivo a sua participação nos órgão diretivos da entidade.
P - Qual sua avaliação quanto à ascensão da mulher no Judiciário, por exemplo, com o crescimento do número de juízas e de uma mulher haver assumido a presidência do Supremo Tribunal Federal?
R - Com naturalidade. As mulheres vêm, há muito tempo e gradativamente, ocupando o seu espaço na sociedade. Por isso, foi com alegria que compareci à posse da ministra Ellen Gracie na mais alta corte do País, sabedora de seus méritos, num caminho trilhado com idealismo e competência, inclusive na própria OAB-RS. Tive a oportunidade de saudá-la pela Seccional do Rio Grande do Sul quando assumiu a presidência do TRF em Porto Alegre. O nosso Estado só tem motivo de orgulho, não só de suas juízas, promotoras e defensoras públicas, como do destacado trabalho e atuação de todas as advogadas gaúchas. E noto que há uma grande sintonia com os operadores do direito, independentemente de gênero. Isso é salutar para a unidade e o congraçamento da classe e me dá incentivo e redobra a minha responsabilidade.
P - Tendo em vista que a função dos conselheiros da Ordem é de natureza política, como será sua atuação, principalmente no tocante à defesa das prerrogativas?
R - A relevância da advocacia na administração da Justiça acha-se proclamada na Constituição Federal. Decorrência natural da importância atribuída à função do advogado é a responsabilidade dos que exercem esse ministério. Por isso, inviolabilidade do advogado por seus atos e manifestações no exercício da profissão é princípio do qual não abro mão. A inviolabilidade do advogado, por seus atos e manifestações, enquanto vinculada ao exercício profissional, não pode ser entendida como privilégio, senão como garantia das partes que representa: o cidadão, seja no âmbito da Justiça ou no terreno extrajudicial, a exemplo dos predicamentos da magistratura, requisito indispensável ao próprio funcionamento dos órgãos da Justiça e da estabilidade do estado de direito e, por conseguinte, da própria democracia. Trata-se de uma conquista maior da sociedade, na defesa da cidadania.
P - E como será sua atuação no âmbito da política nacional?
R - Os conselheiros federais têm por dever a defesa da Constituição, da ordem jurídica do Estado Democrático de Direito e dos demais princípios antes referidos. Devemos ser firmes nessa defesa. Acima de nossos direitos individuais e subjetivos, e justamente fortalecendo-os, está a sociedade civil organizada. As questões políticas nos dizem respeito diretamente, delas dependendo o respeito ou o ultraje à cidadania. Através da política se articulam os poderes e o convívio social, traçam-se os projetos de todas as áreas da sociedade e as garantias de sua execução, de acordo com o bem comum. Estarei atenta, junto com meus colegas e minhas colegas, a que a OAB continue fiel a esse propósito.
P - O que a senhora pensa a respeito dos desvios éticos ocorridos recentemente no cenário político?
R - Todo desvio ético deve ser combatido. Não existe boa ou má política. A política sempre será ética. Desviando-se da ética, será corrupção ou tirania, nunca política. Diante do escândalo público ou da denúncia, há outro dado: as coisas não ficam mais encobertas por muito tempo. E uma vez averiguado o desvio da norma, da conduta, apurar a responsabilidade dos atos indevidos, condenando seus agentes, e reparar o dano são medidas sociais que se impõem. A vigilância civil é um dever não só dos advogados, mas de todos os cidadãos.
P - Como a senhora vê as leis que visam ao aperfeiçoamento do Judiciário?
R - Devem ser apoiadas, mas não admitimos, jamais, a exclusão do advogado na administração da justiça, pois sem ele há a possibilidade de pelo menos uma das partes sair prejudicada.
P - Na sua avaliação, qual deve ser a contribuição da OAB para o aperfeiçoamento do Judiciário e demais poderes?
R - A Ordem sempre contribui. Um vigoroso exemplo foi a luta da OAB pelo controle externo do Judiciário. Quanto aos demais Poderes, a Ordem também está vigilante e atuante, denunciando e agindo inclusive com ações judiciais precisas, como foi o caso do impeachment do presidente Collor e, recentemente, contra o abusivo aumento dos subsídios dos deputados federais. Assim, a vigilância da manutenção da ordem democrática e das instituições, obedecidos os princípios que informam a justiça social, a colaboração para aperfeiçoamento dessas mesmas instituições, incluindo aí uma maior celeridade na prestação jurisdicional é, em síntese, a contribuição da OAB para o aperfeiçoamento do Judiciário e demais poderes da nação.