Arcebispo da Paraíba apóia campanha contra custas elevadas
João Pessoa (PB), 28/10/2005 – O arcebispo da Paraíba, dom Aldo Pagotto, deu seu apoio integral à campanha deflagrada pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), de repúdio aos valores exorbitantes de custas judiciais na Paraíba. Ao conhecer os termos e reivindicações do movimento, lançado na última segunda-feira durante a visita ao Estado do presidente nacional da OAB, Roberto Busato, o religioso afirmou que irá se engajar na luta por custas mais baixas na Paraíba. “Se os preços são astronômicos, bloqueando, dificultando ao máximo e inviabilizando o próprio trabalho dos advogados, se assim for, acaba que só os grandes da pena têm o privilégio de buscar os seus direitos”, afirmou dom Aldo Pagotto, em entrevista a este site.
Ainda segundo o arcebispo paraibano, que se diz “de alma lavada” com o lançamento do movimento pela OAB-PB, havendo critérios e meios para se recorrer com eqüidade, “nós vamos nos engajando nesta luta, que é pela cidadania e pela ordem social”. Na entrevista, dom Aldo Pagotto comentou, ainda, sobre o referendo do desarmamento, a crise política por que passa o país e sobre a falta de segurança pública no Brasil.
Questionado sobre o projeto de transposição das águas do rio São Francisco, o religioso acredita que é preciso deflagrar uma mobilização social pacífica e democrática entre os Estados – principalmente os que seriam contemplados com a água, entre eles a Paraíba – para postular a revitalização e a integração das bacias.
Durante sua visita à Paraíba, ao longo de toda esta semana, Busato afirmou que as custas judiciais no Estado atingiram patamares intoleráveis e enfatizou que esse problema “tornou-se mais que uma exploração da economia popular, um obstáculo entre a cidadania e Justiça, configurando verdadeiro atentado ao Estado democrático de Direito”. Busato chamou a atenção para o fato de que, num Estado pobre do Nordeste, as custas judiciais paraibanas chegam a inviabilizar a apresentação da ação, inibindo a busca do direito pelo cidadão por impossibilidade de meios financeiros.
Na visita às seis Subseções da OAB no Estado – Guarabira, Catolé do Rocha, Cajazeiras, Sousa, Patos e Campina Grande –, Roberto Busato esteve acompanhado do presidente da OAB da Paraíba, José Mário Porto Júnior, e do conselheiro licenciado do Conselho Federal da OAB, Edísio Simões Souto.
A seguir, a integra da entrevista com o arcebispo da Paraíba, dom Aldo Pagotto:
P – Dom Aldo Pagotto, como o senhor avalia essa campanha da OAB, de redução das custas judiciais no Estado?
R – Nós lavamos a nossa alma. Os pronunciamentos todos colocaram em descoberto o arbítrio com que se queira fazer justiça. Se os preços são astronômicos, bloqueando, dificultando ao máximo e inviabilizando o próprio trabalho dos advogados, se assim for, acaba que só os grandes da pena têm o privilégio de buscar os seus direitos. Uma vez que haja, objetivamente, critérios e meios para se recorrer com eqüidade, com a probabilidade de uma causa defendida com leveza, com transparência, nós vamos nos engajando nesta luta, que é pela cidadania e pela ordem social.
P – O Brasil foi às urnas para dizer sim ou não ao desarmamento e a resposta da sociedade, em grande maioria, foi pela manutenção da comercialização de armas. Como o senhor analisa essa situação, um país tão violento quanto o Brasil dar essa resposta nas urnas?
R – Eu não vejo a situação pelo foco da compra de armas e de munições. Eu vi que o referendo não aprofundou a questão da erradicação da violência, porquanto o Estatuto do Desarmamento já prevê, asseguradamente, a paz com a justiça social. E nós vemos que os que defenderam o sim defenderam a paz pró-ativa; os que defendem o não, da mesma forma, porém, sob forma de protesto, mostrando a fragilidade das estruturas governamentais, que infelizmente não estão garantindo essa segurança pública. Nós todos exigiremos, certamente – e esse é o grande recado –, que o governo nos dê um plano e estratégias para podermos ter garantida a segurança pública. Queremos o entendimento entre as polícias, a inteligência, o investimento, a colaboração e, por fim, o envolvimento da população. Eu estou supremamente feliz. Não me sinto derrotado. Embora pacifistas, nós não podemos ser ingênuos e sonhar com as nuvens. Precisamos ter, concretamente, os meios práticos de obter a inserção social. E digo: é pela educação e, sobretudo, pela educação profissionalizante, que vamos ter melhores quadros, inserção social e, portanto, a paz pró-ativa.
P – O senhor acha que foi uma resposta da sociedade à falta de segurança pública no país? Foi uma resposta diretamente ao governo Lula?
R – Perfeitamente, eu concordo. Há duas ou três semanas, eu li muito, discuti, observei, participei de entrevistas nas quais pessoas das mais altas qualidades e categorias, se expressaram. Não pelas pessoas que queiram se armar até os dentes para se defenderem, mas por parâmetros, por estruturas indispensáveis, inadiáveis, tal que a segurança, uma política de segurança política interagindo com outras tantas políticas públicas, da educação, da saúde, da ocupação e renda, enfim, que elas se intercalem, inter-relacionem. É essa a grande novidade. O grande recado que, acredito, as urnas revelaram.
P – O senhor está satisfeito com os três anos de governo Lula?
R – Não, absolutamente não. Eu não votei Lula. Outro dia, há uns meses atrás, antes de deflagrar esse processo, eu dei nota três ao governo e continuo muito reticente, embora eu queira, nos critérios que me caibam, colaborar. Não queremos a desestabilização, mas, até agora, há uma decepção amarga pois tudo tende a uma grande pizza na responsabilização de pessoas que tinham culpa, que tinham, enfim, as evidências de crimes contra a nação. Se eles atentaram contra o erário, cadê a devolução disso? Deve haver, em primeiro lugar, a responsabilização e, em segundo lugar, a devolução para o erário. As coisas vão sendo empurradas com a barriga e o povo não vai perdoar isso. Nós vamos ter respostas muito claras nas próximas eleições, pois precisamos de novas lideranças decentes. É fácil falar. Difícil é a gente suscitar, formar essas boas lideranças, bons quadros de pessoas em quem se possa confiar.
P – O senhor acha que o presidente Lula sabia de tudo o que estava acontecendo, a questão do caixa dois de campanha, a questão do pagamento de “mensalão”, enfim, ele estava a par de tudo?
R – Acredito que sim. Um homem como o Lula, preposto a cargos de altíssima e de suprema confiança como é, no caso, o de presidente da República... É claro que ele deveria saber de tudo. Nos causa espécie ou então risos a informação de que ele não sabia. Ou vai para o lado do ridículo ou vai para o lado da ignorância, ou do “empurra com a barriga”. Como é que ele não sabia das coisas? Por favor, por favor, ninguém acredita nisso.
P – O senhor acha que há clima para impeachment?
R – Não. Impeachment, infelizmente, desestabilizaria ainda mais o governo. Acredito que, no começo da crise, o senhor presidente deveria ter convocado o Conselho da República, que nunca foi convocado para nada, e chamar, por exemplo, a OAB, pessoas assim, que tenham um patamar de responsabilidade social, para se aconselhar. Nós estamos vendo, também, esse conluio entre o Congresso Nacional e o Planalto. Acho que as coisas ficaram ajeitadas. É o “jeitinho brasileiro” para tudo. Mas isso aí eu acho que nós não podemos engolir, nas próximas eleições.
P – Para concluir: o senhor conversou com o presidente nacional da OAB, Roberto Busato, sobre a questão da transposição do São Francisco. Qual é a sua visão?
R – A minha visão é que nós precisamos, ao menos os quatro Estados contemplados – Ceará, Rio Grande do Norte, Pernambuco e a nossa Paraíba – deflagrar uma mobilização social pacífica, democrática, postulando imediatamente a revitalização e a integração das bacias.