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"OAB está unida pelo impeachment", afirma Lamachia em entrevista ao jornal O Povo-CE

segunda-feira, 4 de abril de 2016 às 12h00

Brasília - Confira a entrevista do presidente nacional da OAB, Claudio Lamachia, publicada pelo jornal O Povo, do Ceará, na edição deste domingo (03):

Se a crise política causou algum racha por causa de pensamentos divergentes, não foi na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Pelo menos é o que fala Claudio Lamachia, presidente nacional da instituição que esteve durante esta semana no centro de um debate jurídico sobre a legalidade do impeachment de Dilma Rousseff (PT), após enviar novo pedido à Câmara dos Deputados.

Além da situação da OAB, Lamachia falou também sobre a divulgação dos grampos de telefone dos advogados de Lula feita pelo juiz Sérgio Moro. Segundo ele, a Ordem está analisando o caso e não vai admitir essa atitude. “O grupo requererá ao STF que destrua evidências coletadas de forma ilegal”. Confira os principais textos da entrevista.

OPOVO - No dia 18, a OAB declarou apoio ao impeachment da presidente Dilma Rousseff e, na última segunda, protocolou novo pedido na Câmara dos Deputados, em meio a confusão. A reação contrária de diversos advogados já era esperada?

Claudio Lamachia - A OAB apoia o impeachment da presidente da República porque assim decidiu a advocacia brasileira, através dos legítimos representantes eleitos pelo voto direto dos quase um milhão de advogados e advogadas do país. O Conselho Federal da OAB, formado por 81 conselheiros federais, três de cada estado e do Distrito Federal, foi quase unânime ao decidir que a OAB deve apoiar o impeachment. Das 27 Unidades da Federação, 26 concluíram que a Ordem dos Advogados do Brasil deve pedir o impedimento da presidente. Em toda instituição democrática há opiniões divergentes. Dentro da OAB, lidamos com as divergências de forma civilizada. Por exemplo: no dia em que protocolamos a petição do impeachment na Câmara dos Deputados, recebemos, pela manhã, um grupo de aproximadamente 20 advogados que me pediram para não entregar o documento. Expliquei, e eles entenderam, que não poderia deixar de cumprir determinação quase unânime do Conselho Federal.

OP - Entre as críticas de alguns advogados contrários está a de que quando o apoio ao impeachment foi declarado não havia decisão de envio de novo pedido. Houve algum mal entendido nesse sentido?

Claudio Lamachia - Os representantes eleitos pelo voto direto dos advogados e advogadas de todo o país decidiram que a OAB deve ingressar com o pedido de impeachment da presidente da República. Essa decisão foi tomada em uma sessão pública, que teve ampla cobertura pela imprensa e foi transmitida, ao vivo, pela internet. Está tudo registrado de maneira transparente.

Essa sessão do Conselho Pleno da OAB, instância máxima de deliberação da entidade, foi precedida por uma ampla consulta à advocacia brasileira. Durante meses a sociedade cobrou um posicionamento da Ordem sobre o tema do impeachment. Nesse período, integrantes do Conselho Federal da OAB e das OABs estaduais estudaram a questão. Das 27 OABs estaduais, 24 tiveram a chance de organizar consultas. Todas as 24 concluíram pela necessidade de abrir um processo de impeachment. Só depois de consultados os estados, o tema foi levado ao Conselho Federal. Na instância nacional, 26 dos 27 Estados concluíram pelo apoio ao impeachment. Esse amplo processo democrático e o resultado quase unânime mostra o quão unida está a classe em torno da decisão final.

OP - Outra crítica, essa já em relação ao novo pedido da OAB, é que ela não aponta claramente um crime de responsabilidade da presidente Dilma Rousseff, além de levar em consideração acusações não comprovadas, como as da delação premiada de Delcídio do Amaral, e pedaladas cometidas no mandato anterior da presidente. Como o senhor responde a essa questão?

Claudio Lamachia - A denúncia entregue pela OAB à Câmara dos Deputados está disponível na íntegra no site da OAB (www.oab.org.br) e foi amplamente analisada pelos veículos de comunicação. Na denúncia, a OAB aponta quais crimes foram cometidos pela presidente da República. Pedaladas fiscais, renúncias fiscais ilegais em favor da Fifa e a intenção de beneficiar um aliado, alvo de investigação judicial, conferindo-lhe prerrogativas de ministro. Essas são bases do pedido de impeachment apresentado pela OAB. A Constituição deixa claro que ocorre crime de responsabilidade quando o presidente da República pratica atos contra o livre exercício de algum dos Poderes, contra a probidade na administração, contra a lei orçamentária ou contra o cumprimento das leis e das decisões judiciais. A presidente também cometeu infrações à lei 1.079/50. Essa lei inclui entre os crimes de responsabilidade a infração de normas legais no provimento de cargos públicos e o transporte ou excesso, sem autorização legal, das verbas do Orçamento.

OP - As delações de Delcídio, as gravações dos grampos, as pedaladas em mandando anterior... Isso pode ser usado juridicamente pra endossar um pedido de impeachment?

Claudio Lamachia - A OAB não considera em seu pedido de impeachment as escutas telefônicas. O documento, que está público no site da OAB, mostra quais elementos foram considerados como base da denúncia após ampla consulta à advocacia. O posicionamento da OAB é técnico-jurídico. A Ordem dos Advogados do Brasil está pedindo o impeachment porque há fatos e leis que justificam essa ação.

OP - Sobre as gravações dos grampos, a OAB tem analisado os grampos de advogados de Lula. No que isso pode resultar?

Claudio Lamachia - A OAB criou um grupo de trabalho para analisar esse caso concreto. A OAB não admite grampos em conversas entre advogados e seus clientes em nenhuma situação. Há uma lei que proíbe esse tipo de escuta, pois fere um princípio básico que é o da inviolabilidade da relação entre advogado e cliente. O grupo requererá ao STF que destrua evidências coletadas de forma ilegal. O Brasil tem uma chance ímpar de caminhar para um futuro melhor. Seria um desvio de rumo combater o crime cometendo outros crimes.

OP - Em relação aos advogados que discordam da posição da OAB, alguns formaram, inclusive, grupos que estão organizando manifestações, como o movimento Juristas pela Legalidade e pela Democracia aqui no Ceará. Há um racha na OAB?

Claudio Lamachia - Não há nenhum racha na OAB. A decisão de apoiar o impeachment foi quase unânime. Nós lidamos com uma divergência apresentada por um grupo de advogados. É normal dialogar com grupos divergentes, respeitamos a posição dos colegas que tiveram voto vencido. Mas as reuniões que aconteceram em todo o país antes que a OAB tomasse uma posição sobre o impedimento da presidente da República deixaram claro que não existe racha.

OP - E essa falta de unidade interna, que difere do que aconteceu em 1992 com o impeachment do ex-presidente Fernando Collor de Mello, pode agravar o cenário nacional, que também está dividido? Ou, mesmo, reflete essa divisão da sociedade?

Claudio Lamachia - Na classe representada pela OAB, a decisão de apoiar o impeachment foi quase unânime. A OAB vive, portanto, uma situação interna de unidade. Há pequenos grupos, dentro da OAB, que ficaram ideologicamente contrariados com a decisão final. Mas essa unidade vivida pela Ordem dos Advogados não se reproduz na sociedade como um todo. De fato, existe a percepção de que há um acirramento entre defensores e críticos ao governo nas manifestações que acontecem pelo País. Há uma gigantesca diferença entre o pedido de impeachment de 1992 e o de hoje. O então presidente Fernando Collor não tinha uma base aliada, não representava uma ideologia, nem a sociedade funcionava como vemos atualmente. Hoje o governo tem história política, base aliada, representa uma ideologia. E também a sociedade participa de maneira mais abrangente, especialmente em razão das redes sociais. Esses fatores nos trazem a um momento de ânimos mais acirrados.

OP - O ex-presidente da Ordem, Marcelo Lavenére, foi um dos votos contrários ao apoio da OAB ao impeachment. Como a posição dele, pela sua importância na instituição, aprofunda a ruptura entre os membros da instituição?

Claudio Lamachia - Não há ruptura entre os integrantes da OAB. Respeitamos a opinião e a trajetória do presidente Marcelo Lavenére. Felizmente, a OAB saiu unificada do processo de decisão a respeito do impeachment. Compreender e respeitar as decisões, especialmente quando tomadas de maneira tão democrática e por ampla maioria, quase consensual, é um sinal de maturidade democrática.

OP - O juiz Sérgio Moro tem sido o centro de debates sobre sua atuação na Operação Lava-Jato, se agiu de forma ilegal, exagerada ou com motivações políticas em algum momento. A OAB tem algum posicionamento sobre isso?

Claudio Lamachia - A OAB é, historicamente, a favor do combate à corrupção e à impunidade. Vivemos um grande momento de exposição das engrenagens ocultas que drenam os recursos de nosso país. Como guardiã dos direitos e garantias individuais, a OAB zela pela legalidade nas ações de todos os agentes públicos. Por isso, a Ordem está alerta com relação a possíveis abusos e ilegalidades cometidos no processo de apuração dos escândalos, notadamente no que diz respeito às garantias e prerrogativas da advocacia, que são as prerrogativas da própria cidadania. Não vamos admitir grampos em conversas entre advogados e seus clientes, por exemplo. Em nenhuma situação o grampo de conversas entre advogados e clientes é admissível. Não se pode combater o crime praticando-se outro crime. Vou repetir essa frase à exaustão.

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