Sob ameaça, Frei Henri ganha proteção da PM
Brasília, 25/02/2005 – O frei e advogado Henri Burin dez Roziers, de 75 anos, da Comissão Pastoral da Terra, integrante da lista de marcados para morrer no sudeste do Pará, está sob a segurança diuturna da Polícia Militar paraense desde a noite da quarta-feira, quando um cabo da PM de Xinguara já dormiu no quarto de hóspedes de sua residência. Ontem de manhã, às 9, quando o Estado chegou à sede da CPT para entrevistá-lo, ele descia de seu carro acompanhado por outro cabo PM, Epaminondas Silva Pereira, 37 anos, 15 de corporação, evangélico e com a experiência de já ter dado proteção a 13 juízes da região.
O ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, só soube do fato às 8 da manhã de ontem, quando telefonou para Henri. Ia informá-lo de que o governo federal estava providenciando sua segurança e soube pelo próprio que o governo do Estado lhe tomara a dianteira. "Ele ficou surpreso, mas mesmo assim garantiu que a Polícia Federal vai me procurar", contou o frei.
Os dois já se conheciam, desde a época em que o advogado criminalista Bastos atuou na defesa de sindicalistas assassinados, como Expedito Ribeiro, presidente do sindicato de Rio Maria, em dezembro de 2001. Por mais de uma vez Frei Henri esteve em São Paulo, com ele e com o advogado Luiz Eduardo Greenhalgh, hoje deputado federal, também atuante em casos do gênero. O ministro o convidou para uma visita em Brasília, em breve. Henri disse que vai.
À paisana, imediatamente simpático e visivelmente orgulhoso da função, o cabo Epaminondas trazia, no cós traseiro da calça, uma pistola ponto 40. "Não tive outro jeito senão aceitar", disse seu protegido, em bermudas apropriadas para o calor paraense, já tinindo no meio da manhã.
Meia hora depois, para visível frustração de Epaminondas, um tenente do 17.º batalhão, sediado no município, foi à CPT substituí-lo pelo cabo Manoel dos Santos Ferreira, da mesma idade e religião, há 18 anos na PM e simpático do mesmo jeito. A partir de ontem, em turnos de 24 horas, é Ferreira, sem experiência do gênero, que está fazendo a segurança. Ele revezará com o cabo Sílvio Costa Lima.
Detalhe: Lima, 34 anos, 13 de PM, é filho de Raimundo Ferreira Lima, o Gringo, assassinado por pistoleiros em 1980, no primeiro caso contemporâneo de repercussão nacional em crimes de pistolagem. Foi o próprio Frei Henri que o escolheu, com a concordância do major Ricardo Lima Júnior, comandante do 17.º BPM e, como tal, o principal responsável direto pela operação. Frei Henri já conhecia Sílvio e sua família por causa do crime de 1980 e porque Sílvio, quando ainda soldado, em 1996 e 1997, fez sua segurança e a do padre Ricardo Rezende quando atuavam na CPT de Rio Maria.
Indícios
Alertados pela OAB nacional e paraense de que Frei Henri corre risco de ser mais um morto, depois da irmã Dorothy Stang, os governo federal e estadual se mexeram. Ele não queria segurança - e disse-o ao ministro da Justiça e ao capitão da PM de Xinguara que na noite da quarta-feira o procurou para informá-lo de que o cuidado começaria a partir dali, por ordem do governo do Estado.
"Eu sei que corro risco por parte de poderosos que têm ódio do trabalho da CPT, mas, no meu caso, embora haja indícios um pouco preocupantes, não vejo risco iminente", disse. "Não recebo nenhuma ameaça de morte concretizada ou de fonte segura desde 2001." Houve um telefonema anônimo que o ameaçou, no fim do ano passado, conta. "Não dei maior importância, porque não tenho medo dessas coisas." Henri acha que a situação está mais perigosa em Anapu e em Rondon do Pará, "que devem continuar a receber atenção prioritária".
Um dos indícios um pouco preocupantes a que se refere está relacionado aos ataques públicos que sofreu, em 2003, no Sindicato Rural de Redenção, a 100 quilômetros de Xinguara, por sua atuação contra o trabalho escravo. "É um dos fatos que eu considero como uma incitação à violência e ao ódio que pode levar a me matarem", diz. O advogado não esconde seu incômodo com a segurança da PM: "Já sei como é - e não é nada agradável ter sempre alguém acompanhando os meus passos", reclamou, conformado. A reportagem é do jornalista Luiz Maklouf Carvalho, especial para o jornal o Estado de S. Paulo (SP).