Editorial: De mal a pior
Brasília, 30/11/2004 - O editorial de "De mal a pior" foi publicado na edição de hoje (30) do jornal Folha de S.Paulo. O jornal paulista faz uma análise do caótico ensino jurídico do país:
"A cada semestre, bacharéis em direito reprovados no exame da seccional paulista da Ordem dos Advogados do Brasil estabelecem um novo recorde. Na primeira prova de 2004, apenas 13% dos inscritos foram classificados, condição necessária para exercer a profissão de advogado. Àquela altura parecia difícil imaginar uma situação pior. Pois ela ocorreu: no segundo exame de 2004, apenas 8% dos candidatos foram aprovados. Nos testes anteriores, as reprovações transitavam em torno dos 80%.
Considerando-se o desempenho de escolas isoladamente, no primeiro exame deste ano, 90,79% dos alunos da Faculdade de Direito da USP foram aprovados; em segundo lugar veio a Universidade Mackenzie, com 77,70%; em terceiro, empatadas, ficaram a PUC de São Paulo e a Unesp de Franca, ambas com 75%. Deve-se também mencionar o grande número de faculdades do interior que se firmaram entre as 15 primeiras colocadas. Daí decorre que várias instituições da Grande São Paulo estão obtendo resultados simplesmente catastróficos.
Não há motivo para surpresa. É cristalina a correlação entre a proliferação de cursos de direito -especialmente na região metropolitana de São paulo- e os péssimos índices de aprovação no exame da ordem.
O caso é ainda mais inquietador pelo que sugere acerca de outras carreiras. Com efeito, seria ingenuidade acreditar que a péssima formação oferecida por muitos cursos superiores está restrita ao direito. É até possível que a situação seja pior em outras disciplinas, como a medicina ou a engenharia, em que basta concluir o curso para estar legalmente habilitado a exercer a profissão.
Existe um sério problema quando o governo reconhece diplomas de médicos ou de engenheiros que desconhecem aspectos básicos de suas profissões. O profissional despreparado pode representar uma ameaça à sociedade. É inaceitável que alunos, coniventes ou não com o ensino deficiente, se formem apenas porque pagam suas mensalidades".