Íntegra da proposta que prevê foro especial para advogados
Brasília, 25/11/2004 - Segue a íntegra da proposta de anteprojeto de lei que dispõe sobre o foro especial por prerrogativa de função para advogados processados no exercício da profissão. A proposta será apresentada amanhã (26) pelo presidente da Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) de Santa Catarina, Adriano Zanotto, durante a reunião do Colégio Nacional de Presidentes de Seccionais da OAB. A reunião teve início no dia de hoje, em São Luís (MA), e acontece até o próximo sábado (27).
A respeito do foro por prerrogativa de função, para magistrados e membros do Ministério Público, a Constituição Federal, em seu artigo 96, estabeleceu:
“Compete privativamente:
(...);
III – aos Tribunais de Justiça julgar os juízes estaduais e do Distrito Federal e Territórios, bem como os membros do Ministério Público, nos crimes comuns e de responsabilidade, ressalvada a competência da Justiça Eleitoral”.
A Lei Complementar n. 75, de 20 de maio de 1993, que dispõe sobre a organização, as atribuições e o estatuto do Ministério Público da União, em seu artigo 18, disciplina:
“São prerrogativas dos membros do Ministério Público da União:
(...);
II - processuais:
a) do Procurador-Geral da República, ser processado e julgado, nos crimes comuns, pelo Supremo Tribunal Federal e pelo Senado Federal, nos crimes de responsabilidade;
b) do membro do Ministério Público da União que oficie perante tribunais, ser processado e julgado, nos crimes comuns e de responsabilidade, pelo Superior Tribunal de Justiça;
c) do membro do Ministério Público da União que oficie perante juízos de primeira instância, ser processado e julgado, nos crimes comuns e de responsabilidade, pelos Tribunais Regionais Federais, ressalvada a competência da Justiça Eleitoral;
(...);
Parágrafo único. Quando, no curso de investigação, houver indício da prática de infração penal por membro do Ministério Público da União, a autoridade policial, civil ou militar, remeterá imediatamente os autos ao Procurador-Geral da República, que designará membro do Ministério Público para prosseguimento da apuração do fato”.
Apenas para exemplificar, a Constituição do Estado de Santa Catarina, em seu artigo 83, XI, “b”, dispõe:
“Art. 83. Compete privativamente ao Tribunal de Justiça:
(...);
XI - Processar e julgar, originariamente:
(...);
b) Nos crimes comuns e de responsabilidade, os Secretários de Estado, salvo a hipótese prevista no art. 75, os juízes, os membros do Ministério Público e os Prefeitos, ressalvada a competência da Justiça Eleitoral;”
Vê-se, pois, que a Constituição Federal, secundada pelas constituições estaduais e por leis infra-constitucionais, dentre essas as leis e códigos de organização judiciária dos diversos tribunais de justiça do país, consagra aos magistrados e membros do Ministério Público o foro especial por prerrogativa de função, sendo que a esses dois órgãos fica garantido o postulado do juiz natural “diferenciado” (CF, art. 5º, LIII), na forma dos diplomas legais mencionados.
Por outro lado, o arcabouço legal pátrio não deu o mesmo tratamento aos advogados, não obstante tenha preceituado o artigo 133 da Constituição da República que “O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei”.
Na mesma linha de entendimento, o artigo 2o da Lei n. 8.906/94, estabelece que “O advogado é indispensável à administração da justiça” e em seu Parágrafo 1o, acentua que “no seu ministério privado, o advogado contribui na postulação de decisão favorável ao seu constituinte, ao convencimento do julgador, e seus atos constituem munus público”.
Por munus, segundo GISELA GONDIN RAMOS, lembrando ensinamentos de DE PLÁCIDO E SILVA, temos o “encargo, emprego ou função” (Estatuto da Advocacia : comentários e jurisprudência selecionada. Florianópolis : OAB/SC Editora, 2003, 4a ed., pág. 59), o que significa dizer que no desempenho de seu augusto mister o advogado exerce uma função pública.
Já no art. 6o do referido Estatuto da Advocacia e da OAB, temos que “Não há hierarquia nem subordinação entre advogados, magistrados e membros do ministério público, devendo todos tratar-se com consideração e respeito recíprocos”.
No tocante às prerrogativas, na lição de Hely Lopes Meirelles, “são atributos do órgão ou do agente público, inerentes ao cargo ou à função que desempenha na estrutura do Governo, na organização administrativa ou na carreira a que pertence. São privilégios funcionais, normalmente conferidos aos agentes políticos ou mesmo aos altos funcionários, para a correta execução de suas atribuições legais. As prerrogativas funcionais erigem-se em direito subjetivo de seu titular, passível de proteção por via judicial, quando negadas ou desrespeitadas por qualquer outra autoridade.” (Justitia, 123:188, n. 17.)
Pois bem, sendo o advogado “indispensável à administração da justiça”; prevendo a lei que mesmo “no seu ministério privado” “seus atos constituem munus público”, portanto exercente de função pública, nada há a impedir que aos advogados seja atribuído o mesmo privilégio de foro decorrente da prerrogativa de função dispensado aos magistrados e membros do Ministério Público.
Nada há justificar o diferente tratamento conferido aos advogados, magistrados e membros do Ministério Público (todos operadores do direito e da justiça) no tocante à questão aqui explanada.
Aliás, as razões que levaram o legislador a estabelecer o direito de membros do Ministério Público e da magistratura serem submetidos a julgamento por instância superior, são as mesmas que devem imperar quando a parte for advogado que, no desempenho do exercício profissional, se vê processado.
Tal regramento, uma vez criado, garantirá maior imparcialidade e independência do órgão julgador, porquanto o juiz natural para apreciar eventual demanda no qual o advogado seja réu, por fatos ocorridos no desempenho da atividade profissional, será, no mínimo, um órgão do tribunal.
Alie-se a isso que, com a criação da lei aqui proposta, reparada restará a injustiça a que até hoje estão submetidos os advogados, posto não terem em seu favor o mesmo tratamento dispensado aos magistrados e membros do Ministério Público.
Com estas considerações, submeto o anteprojeto de lei à apreciação de Vossas Excelências esperando que a proposição mereça a mais ampla acolhida para ser encaminhada ao Poder Legislativo, a fim de se converter em lei ordinária federal.
Anteprojeto de lei n /2004
Dispõe sobre o foro por prerrogativa de função para os advogados que no exercício da profissão forem processados por seus atos e dá outras providências.
O Presidente da República
Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1º - São prerrogativas do advogado:
I - ser processado e julgado pelos tribunais de justiça, nos crimes comuns, praticados no desempenho do exercício profissional perante juízos de primeira instância, ressalvada a competência da Justiça Eleitoral;
II - ser processado e julgado pelos tribunais regionais federais, nos crimes comuns, praticados no desempenho do exercício profissional perante juízos federais de primeira instância, ressalvada a competência da Justiça Eleitoral;
III - ser processado e julgado, nos crimes comuns, praticados no desempenho do exercício profissional perante tribunais de justiça e tribunais regionais federais, pelo Superior Tribunal de Justiça
Art. 2o – Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.