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OAB quer participação popular nos rumos do País

domingo, 14 de novembro de 2004 às 11h04

Rio,14/11/2004 - Reforçar e ampliar a participação popular nas decisões nacionais. Este é o objetivo da Campanha Nacional em Defesa da República e da Democracia, que será lançada, amanhã (15, no Rio, pelo presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Roberto Busato. Com a campanha, a Ordem pretende que se desenvolva um movimento destinado a gerar condições para incentivo à participação popular nos rumos do País. Busato afirma que a idéia é propiciar meios para uma cidadania ativa, fazendo com que o cidadão participe, cada vez mais, da vida política e institucional brasileira. Durante o lançamento, a OAB vai apresentar a proposta de um projeto de lei para regulamentação de plebiscitos, referendos e projetos de iniciativa popular no Brasil.

Desde que assumiu a OAB, em fevereiro deste ano, Busato tem se mostrado preocupado com as questões que envolvem a advocacia e a magistratura. A baixa aprovação nos exames da OAB, a qualidade dos cursos jurídicos e o desvio de funções do Ministério Público também são assuntos prioritários para o presidente do Conselho.

Em entrevista à jornalista Simone Garrafiel, do Jornal do Commercio, Roberto Busato falou da Campanha e de outras realizações em sua gestão, além de opinar sobre questões relativas ao Judiciário nacional.

JORNAL DO COMMERCIO - Quais as idéias principais da Campanha Nacional em Defesa da República e da Democracia, que visa à regulamentação do direito que o povo tem de exercer sua vontade por meio de plebiscitos, consultas populares e referendos?

ROBERTO BUSATO - A campanha foi idealizada pelo advogado Fábio Konder Comparato. A proposta é fazer a defesa da República e despertar a reflexão e o conhecimento da população sobre sua participação nas decisões nacionais. Queremos que o povo passe a assumir sua representação, participando do movimento eleitoral, por exemplo, de maneira a fazer uma avaliação crítica de quem irá votar. Essa campanha visa também à segurança do cidadão. Por esse motivo escolhemos o Rio de Janeiro para o lançamento, já que foi a cidade impulsionadora da República e, 115 anos depois, encontra-se neste descalabro, sendo um dos cenários mais violentos do Brasil. Houve perda da República. Nesta segunda-feira, haverá um ato público para o lançamento dos fundamentos da campanha, que tem o apoio de diversas personalidades, autoridades nacionais e locais e entidades da sociedade civil. Mas não será um movimento teórico. Nossa primeira ação será encaminhar um projeto de lei de iniciativa popular, que garantirá a participação mais ativa do povo na República, facilitando o acesso das pessoas a plebiscitos, consultas populares e referendos. Criamos a Comissão Nacional de Defesa da República e da Democracia, composta pelos advogados Fábio Comparato, Carmem Lúcia Rocha, Ercílio de Castro Filho, Claudineu de Mello e Arx Tourinho, a qual será o laboratório de projetos a favor da causa. A OAB dará o respaldo instrumental para viabilização dos projetos desenvolvidos. A OAB se preocupa também com a valorização das prerrogativas dos advogados, tendo deflagrado uma campanha, neste semestre.

P- Quais têm sido as iniciativas do órgão para assegurar essas prerrogativas?

R- No próximo dia 6, haverá um encontro nacional, no qual vamos debater diversos assuntos e, ao final, faremos uma pauta de atividades relacionadas às prerrogativas. Vamos partir das idéias para os projetos. Essa reunião terá a participação de presidentes e representantes das seccionais brasileiras da OAB, e do evento surgirão, certamente, inúmeras proposições. Haverá também três conferências magnas, para as quais convidamos os ministros Márcio Thomaz Bastos, Nelson Jobim, que foi dirigente da OAB e relator do seu Estatuto, além de ter a visão de magistrado, e Edson Vidigal, que tem visão de vanguarda e poderá trazer pontos fundamentais para a inserção na advocacia no Poder Judiciário. Outra ação será o encontro das escolas de advocacia, com o objetivo de incluir temas das prerrogativas nas grades curriculares nacionais.

P- No início deste mês, a OAB instalou a Comissão de Advocacia Pública do Conselho. Quais as principais atribuições desse instituto?

R- A Comissão visa a, justamente, defender as prerrogativas dos advogados, que são criticadas e menosprezadas, principalmente, pelo Poder Público. É preciso que se tenha ciência de que a atuação do advogado é fundamental e que esse profissional precisa de independência. É necessária a preservação dessas prerrogativas para que os advogados não sejam forçados a defender teses descabidas do Poder Público que, muitas vezes, é o maior litigante na Justiça.

P- A Resolução 399, do Conselho de Justiça Federal (CJF), aprovada no mês passado, disciplina os procedimentos para saque e levantamento dos depósitos realizados pelos Tribunais Regionais Federais, que, a partir de 2005, passarão a ser feitos diretamente na conta bancária do beneficiário, dispensando o alvará. A OAB fez críticas a essa Resolução, que modificou o pagamento das sentenças cíveis. Quais foram as alegações?

R- A medida guarda a clara noção de desprestígio à advocacia. Ela apresenta o advogado como uma pessoa desonesta, quando da finalização da sentença. Não podemos aceitar essa diminuição de prerrogativas. Os advogados interpretam a sentença e verificam se os descontos e os créditos foram feitos com exatidão. E somos rigorosos no que diz respeito à honestidade do profissional ao efetuar essa prestação de contas ao cliente. Essa resolução impede que os advogados recebam os numerários que lhe são de direito.

P- A OAB apresentou uma avaliação sobre o projeto de custas e honorários do STJ. Que impressões o senhor teve do documento?

R- Em audiência com o presidente do Superior Tribunal de Justiça, discutimos alguns assuntos, entre os quais a questão dos precatórios. Na ocasião, elogiei a posição da Corte que, pela primeira vez, submeteu à OAB, para apreciação, o projeto que modifica as custas judiciais. Na OAB, montamos uma comissão para tratar desse assunto, a qual apresentou um relatório com as opiniões da entidade sobre alguns dos dispositivos do projeto. No documento, chamou-nos a atenção, por exemplo, o aumento excessivo das custas judiciais na Justiça Federal, que deveria ser a mais democrática, evitando excluir a sociedade do acesso à Justiça. Houve aumento de cinco vezes do valor mínimo das custas, o que é um despropósito, levando-se em consideração o clima de desestabilidade econômica do País. Não podemos discriminar a população. Um estudo feito pelo Banco Mundial diz que, para evitar a exclusão social, é preciso garantir o acesso do povo ao Judiciário, mais do que dar saúde e alimentação, porque tudo tem origem no direito do cidadão. Aumentando-se as custas, exclui-se a população da Justiça.

P- As aprovações no exame da OAB não têm alcançado o êxito esperado. Como o senhor avalia essa situação e a que atribui o alto índice de reprovação?

R- Os resultados têm sido preocupantes, pois é o exame da Ordem que dá habilitação ao profissional. Não é um exame rigoroso, exige o mínimo de capacidade postulatória, até porque nosso objetivo não é fazer um ranking dos melhores alunos, mas, sim, aferir o mínimo de capacidade de cada um, para exercer sua função de acordo com a necessidade do povo. Hoje, vemos a mercantilização do ensino superior e não o oferecimento de vagas que garantam qualidade. Este ano, em Santa Catarina, por exemplo, a reprovação atingiu 83%, e 69% dos aprovados eram de universidades federais. Os jovens estão sendo enganados pelas faculdades e, futuramente, serão algozes de seus clientes. A OAB não pode ser conivente com isso, nem representar uma cena, aceitando diplomas que não valem nada. Não podemos ter um ensino jurídico ineficiente.

P- A sociedade exige do Judiciário acessibilidade, previsibilidade de decisões e sentenças em tempo tolerável. Na sua opinião, a Justiça está caminhando para esses objetivos?

R- O Judiciário não pode permanecer em uma redoma de vidro, alheio ao que o cerca. Estamos caminhando com dificuldade, mas evoluindo. Temos a reforma do Judiciário sendo encaminhada, tendo se transformado em prioridade. Estamos chegando ao final de um trabalho de 12 anos. Entidades como a AMB, a Ajufe e a Anamatra estão mais abertas a modificações, muitas delas mudando seu perfil. A demora dos processos não serve mais a ninguém e vamos conseguir a inversão dessa situação com a reforma dos códigos. Afinal, não adianta colocar um motor de avião em um automóvel. Costumo dizer que a reforma constitucional é a preparação do campo e a reforma infraconstitucional é a semente, que gera a boa safra. O ministro Thomaz Bastos está desenvolvendo uma série de projetos visando a esta área.

P- O "enxugamento" da Constituição, proposto pelo ministro Jobim, do STF, é uma proposta bem vista pelo senhor?

R- O ministro Jobim tem um compromentimento com a Constituição, tendo sido o relator de algumas de suas emendas. Ele é a memória da Constituição de 1988 e, como participante, deve cumprir suas normas. Acredito que, para que haja modificações, seja preciso um trabalho grande, com a instalação de uma assembléia constituinte.

P- Está em discussão, no Supremo Tribunal Federal, o poder de investigação criminal por parte do Ministério Público (MP). Qual sua posição sobre o papel e os limites do MP?

R- O Ministério Público tem uma função importante na República. Com a Constituição de 88, teve sua importância social aumentada. O problema que vejo no MP está em sua administração sem comando, onde cada procurador faz o que bem entende, tem autonomia. Isso é ruim, pois alguns extrapolam sua função e agem de forma irresponsável. Há membros que fazem com que se invertam valores e verdades, para que a sua verdade seja considerada a correta. Eles precisam agir nos limites da lei, mas alguns querem fugir disso. Eu digo que a investigação não é um show, mas alguns procuradores a vêem assim. É preciso que as ações sejam éticas.

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