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Presidente nacional da OAB é entrevistado pelo Diário Catarinense

segunda-feira, 22 de setembro de 2014 às 11h04

Brusque (SC) Em entrevista ao Diário Catarinense, o presidente nacional da OAB, Marcus Vinícius Furtado Coêlho, respondeu questões sobre corrupção eleitoral, defensoria Pública em SC e mudanças previstas para os cursos de Direito.

Confira a entrevista:

DC - Uma questão polêmica e que é bandeira defendida pela OAB e que determina o fim do financiamento das campanhas eleitorais por empresas privadas está em julgamento no STF. Na sua visão o que esta proibição contribuiria para a sociedade?

Marcus Coêlho — A OAB, como voz constitucional do cidadão, entende que é inconstitucional algumas pessoas jurídicas serem mais importantes nas eleições porque possuem mais dinheiro. Isso fere o princípio da igualdade e o postulado republicano de um homem um voto. A legislação que regula o financiamento de campanhas acertadamente proíbe a contribuição de sindicatos e de organizações de classe e religiosas. Assim, não podem as empresas participar da vida política nacional. A Constituição aduz que a legislação deve proteger a legitimidade das eleições, contendo o abuso do poder econômico. A diminuição do "caixa 2" advirá da visualização dos gastos de campanha. Com o alto volume investido por empresas, ele passa a não ser perceptível. A ausência deste investimento protegerá a legitimidade das eleições, tornando evidente o abuso econômico. O partido é a pessoa jurídica de direito privado escolhida pela Constituição para intermediar a vontade do cidadão com o exercício do poder - e empresas não podem participar de partidos. A participação censitária no processo eleitoral fere a igualdade política entre os cidadãos e entre candidatos e partidos. A ação proposta pela OAB não objetiva diminuir a atividade pública nem generalizar ou criminalizar a política. Seu norte é valorizá-las, dizer que são essenciais a todos os cidadãos, independentemente de sua renda. Em uma recente pesquisa encomendada pela OAB, 72% dos entrevistados disseram ser contrários ao atual modelo de financiamento de campanhas.

DC - Sobre corrupção eleitoral, prática ainda muito comum nos estados brasileiros e que gerou uma campanha por parte da OAB no sentido de combater os meios. Qual a melhor forma de reduzir as irregularidades?

Marcus Coêlho — A Lei Ficha Limpa cuidou das consequências causadas pelas falhas do sistema eleitoral brasileiro. Uma reforma política democrática seria o segundo passo no caminho de cuidar das causas, dos desvios de conduta. A corrupção eleitoral é o germe da corrupção administrativa em nosso país. Um grande avanço nesse campo foi a promulgação da Lei 12.846/13, chamada de Lei Anticorrupção. O objetivo central dessa norma é responsabilizar administrativa e civilmente as pessoas jurídicas que cometam atos ilícitos contra a administração pública nacional ou estrangeira, tirando a responsabilidade do poder público e delegando à iniciativa privada a competência para investigar infrações cometidas por seus funcionários. A sociedade tem também o dever de denunciar quem vier a propor a compra do seu voto. realizando o que prega. Nesse sentido, a OAB, juntamente com a CNBB, lançou a campanha “Voto Não Tem Preço, Voto Tem Consequência”, com intuito de informar a população sobre os perigos de vender seu voto. Todas as 1.200 subseções da OAB e as mais de 5.000 paróquias no Brasil estão engajadas na campanha. Também já está sendo veiculado nas rádios de todo país spot alertando para isso. Eleições livres do abuso do poder político e econômico são fundamentais para a consolidação e o aprofundamento da democracia brasileira.

DC - A OAB também defende uma reforma política. Qual a proposta?

Marcus Coêlho — Defendemos uma profunda reforma política democrática que consolide e aperfeiçoe a nossa democracia. É preciso assegurar a igualdade de condições entre os candidatos, fortalecer e democratizar os partidos e estimular o debate programático. Em síntese, o projeto de reforma política defende o fim do investimento de empresas privadas em campanhas, com o estabelecimento de um teto orçamentário por parte do TSE. As campanhas seriam financiadas pelo fundo partidário e pelos eleitores, que também teriam sua contribuição limitada. As eleições seriam proporcionais em dois turnos, com paridade de gênero na lista pré-ordenada, além do fortalecimento dos mecanismos da democracia direta com a participação da sociedade em decisões nacionais importantes. Nas pesquisas recentes realizadas pela OAB, fica claro o descontentamento da sociedade com a efetividade dos direitos básicos garantidos na Constituição.

DC - Processos judiciais são geralmente morosos e podem levar longos anos. Quais seriam os meios alternativos para a solução de conflitos que podem ser adotados para reduzir o grande volume de processos?

Marcus Coêlho — Mediação e arbitragem são cada vez mais uma realidade, sendo uma alternativa extrajudicial que em muito contribuem para o processo a solução de conflitos e são meios complementares de atuação para a advocacia. Mas é importante ressaltar que é preciso um ajuste na gestão dos tribunais. O primeiro grau, que é onde está a maior parte dos processos, precisa de investimentos para atender a demanda crescente de ações. Por isso é necessária a aprovação do novo Código de Processo Civil, que trará uma série de inovações para desburocratizar o processo judicial no Brasil.

DC - SC foi um dos últimos estados a adotar o sistema de Defensoria Pública, uma estrutura que já recebeu críticas por estar muito aquém para atender toda a demanda. Na sua avaliação qual seria a saída? Seria viável um sistema misto como existem em alguns estados com a Defensoria Pública e também Defensoria Dativa?

Marcus Coêlho — A OAB acompanha com muita preocupação a questão da assistência judiciária aos mais necessitados. O presidente Tullo Cavallazzi tem se colocado a disposição do governo para encontrar uma solução que atenda aos interesses da sociedade. Ao que sabemos, atualmente são 90 defensores públicos para atender o Estado todo, o que obviamente é insuficiente. Com o modelo anterior, de defensoria dativa, havia 7.000 advogados cadastrados para o atendimento.

DC - Atualmente é comum observar que vários processos se arrastam por anos. Um dos entraves é a possibilidade de recursos disponíveis até chegar ao STF. O senhor acredita que seria possível uma mudança onde o rito processual pudesse ser mais curto e consequentemente mais célere?

Marcus Coêlho — Cerca de um quarto dos recursos são providos pelo Supremo Tribunal Federal. No Superior Tribunal de Justiça são aproximadamente 60 mil por ano. O remédio contra a morosidade do judiciário é gestão e investimento nas áreas onde o problema é maior, que é a primeira instância. Há garantias constitucionais que devem ser asseguradas. Não se pode mexer em uma clausula pétrea, que é o princípio da presunção da inocência e o direito à ampla defesa.

DC - Qual a avaliação da OAB sobre o processo eletrônico usado como saída para acelerar trâmites na Justiça?

Marcus Coêlho — A advocacia não é contra o processo eletrônico, mas sim a sua implantação açodada. Temos a garantia do novo presidente do STF, ministro Ricardo Lewandowski, de que as críticas e sugestões da OAB e da advocacia quanto ao sistema serão levadas em consideração, para que o sistema seja constantemente aprimorado. Precisamos sempre ter em mente que a sociedade brasileira padece com o péssimo serviço prestado pelas empresas de telefonia e internet. Se o “apagão” das conexões é algo usual nas capitais, nas cidades que integram as regiões mais distantes das metrópoles a realidade é ainda pior. A Ordem tem buscado junto aos tribunais e ao CNJ para que ajustes sejam feitos de maneira permanente. Um bom exemplo a ser seguido é a declaração de Imposto de Renda. Antes de transformar o sistema, a Receita trabalhou por anos com a opção de declaração por meio físico. Ao longo do tempo, com os devidos ajustes no sistema, e com a confiança do contribuinte, o sistema eletrônico foi se tornando a opção para a imensa maioria. Esso é um bom exemplo de transição segura.

DC - Qual sua avaliação sobre o projeto que permite que bacharéis sem OAB atuem em funções jurídicas, o chamado paralegal, que foi aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ)?

Marcus Coêlho — O projeto é um verdadeiro equívoco. Trata-se de um passo atrás para a qualificação da carreira jurídica no Brasil. Acaba sendo um desestímulo à qualificação do bacharel para a aprovação no Exame de Ordem, que é um balizador de conhecimento mínimo para a garantia da defesa dos direitos da sociedade. A proposta não oferece avanço algum à sociedade, criando uma subclasse de advogados que não passaram no exame da OAB.

DC - O Exame da Ordem já recebeu críticas por muitas vezes estar incompatível com os cursos de direito do país. Quais as mudanças propostas pela OAB nos cursos de direito. Como está o projeto?

Marcus Coêlho — Em primeiro lugar é preciso destacar que em menos de 15 anos o Brasil passou de 150 para 1.260 faculdades de Direito, formando cerca de 100 mil bacharéis por ano. A incompatibilidade está no método de ensino, não na avaliação. Sabemos muito bem do drama que enfrentam os bacharéis. A grande maioria dos que não são aprovados no Exame de Ordem são, na verdade, vítimas de um estelionato educacional, promovido por faculdades caça-níqueis, muito mais preocupadas com o lucro fácil do que com a devida formação dos alunos. A Ordem busca junto ao MEC uma ampla reforma no ensino jurídico do País, para que alunos sejam verdadeiramente preparados para a advocacia. São muitos os critérios a serem alterados, como a análise periódica da qualidade do conteúdo e do corpo de professores, da quantidade de vagas disponíveis, do número de alunos por sala de aula, da qualidade das bibliotecas, da supervisão adequada do período de estágio.

DC - Como o senhor vê o judiciário do futuro? Em sua opinião o que falta avançar?

Marcus Coêlho — O judiciário valorizado e independente é fundamental para o estado de direito. Acredito na democracia e na prevalência da constituição, pautado no respeito à harmonia e independência entre os três poderes. Vivemos em uma sociedade globalizada, multicultural e diversificada. A OAB irá somar esforços para que o judiciário cumpra com o seu papel de garantidor dos direitos do cidadão.

DC - O que este congresso que será realizado em Brusque pode contribuir para advogados e sociedade em geral?

Marcus Coêlho — A Conferência não é um evento qualquer. Trata-se de um espaço deliberativo que deve servir de local de deliberação e de participação dos advogados nas decisões sobre os rumos da entidade. A Ordem, no papel de ser a voz constitucional do cidadão, também norteia sua atuação em prol da sociedade com as deliberações aqui propostas.

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