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Artigo: Medida é precedente perigoso

sábado, 28 de agosto de 2010 às 08h29

Brasília, 28/08/2010 - O artigo "Medida é precedente perigoso" é de autoria do presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Ophir Cavalcante, e foi publicado na edição de hoje (28) da Folha de S.Paulo:

As recorrentes discussões que se travam em torno dos salários nas três esferas do Poder Público, e em especial do Judiciário, nos levam a concluir que a reforma promovida pela emenda constitucional nº 45 ainda é uma obra inacabada, de que resultam, não raro, iniciativas com vistas a estabelecer supostas equivalências com outros setores da administração pública sem o devido zelo que o assunto exige.

É o caso da recente decisão do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) de estender aos juízes benefícios garantidos aos integrantes do Ministério Público Federal, como licença-prêmio, auxílio alimentação, dentre outros.

Não está em discussão se os nobres juízes são merecedores de tais vantagens, mas, sim, o modo de como fazer para obtê-las.

Em tempo, um: já é assente no próprio Supremo Tribunal Federal a jurisprudência de que benefícios dessa ordem não podem ser objeto de decisões administrativas, requerendo uma lei própria aprovada no âmbito do Poder Legislativo e sancionada pelo chefe do Executivo.

"Ipso facto", como, aliás, dessa forma procedeu diligentemente o Ministério Público, sem o que pareceria mero capricho ou, se preferirmos, "arranjo" interno, aparentemente legítimo mas ilegal, com ares de um jeitinho à moda daquilo que nos esforçamos tanto a extirpar da administração pública.

Em tempo, dois: ao enviar projeto de lei à Câmara estabelecendo novos parâmetros para os salários da magistratura, o Supremo arguiu o artigo 37, inciso X da Constituição Federal, segundo o qual as remunerações e subsídios dos agentes públicos devem ser estabelecidos por lei específica.

Isto é matéria fresca, do último dia 12, e ensejou do presidente da corte, Cezar Peluso, nota oficial justificando o gesto, exatamente em razão da curiosidade pública sobre o assunto.

Em tempo, três: não foi outro, se não o próprio plenário do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), que, em decisão recente, obrigou promotores do Piauí a devolver gratificações de desempenho que vinham recebendo ao longo de 11 anos, por obra e graça de "resolução interna" do colégio de procuradores daquele Estado.

Na prática, as gratificações configuravam um reajuste salarial camuflado, sendo digna de nota a conclusão do órgão de controle, segundo a qual justificar tal postura "é o mesmo que admitir que os membros do colégio de procuradores desconhecem a Constituição".

Ora, pois. A se aplicar esse raciocínio, estaria também o Conselho Nacional de Justiça avalizando decisões administrativas que transformariam os tribunais do Brasil afora em ilhas de autonomia, emprestando um péssimo exemplo a quem foi delegado o papel de guardiões das leis. Causa e efeito.

Um precedente sem dúvida perigoso para um órgão que nasceu com o firme propósito de planejar o Judiciário de acordo com o que a sociedade brasileira espera e, fundamentalmente, promover sua necessária transparência administrativa.

Em um país que registrava, até o ano passado, 40 milhões de processos em fase de execução, está evidente que o Judiciário, em muitos aspectos, ainda apresenta características de Terceiro Mundo, em completo descompasso com sua poção desenvolvimentista.

Daí, porém, inferir que disso pode tomar decisões em causa própria vai uma distância.

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