Fortaleza (CE), 16/06/2009 - O artigo "Lá ninguém se lixa" é de autoria do presidente da Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) do Ceará, Hélio Leitão, e foi publicado na edição de hoje (16) do jornal O Povo (CE):

"Verbas parlamentares empregadas na compra de esterco de cavalo para adubar canteiros de flores em casa de campo. Um outro parlamentar solicitou verba para ressarcir despesas que efetuara para quitação de hipoteca de um imóvel seu. Estes e outros tantos desvios, muito semelhantes ao escândalo das verbas indenizatórias que corroem a já combalida imagem do Poder Legislativo brasileiro, deram-se recentemente na Inglaterra, pátria que inaugurou o constitucionalismo com a imposição da Carta Magna ao Rei João Sem Terra e uma das mais sólidas democracias do planeta.

Até pela simultaneidade com que ocorreram os episódios lá e aqui, a comparação se faz inevitável e conduz a reflexões. É certo que as instituições democráticas devem passar por um processo permanente de aperfeiçoamento, devendo estar sujeitas a rígidos controles sociais e submissas ao crivo da opinião pública. Quando falham ou se revelam frouxos os controles, dá no que deu. No Brasil ou na Inglaterra.

As similitudes, todavia, param por aí. Na Inglaterra a comoção social gerou a renúncia do Presidente da Câmara dos Comuns, Michael Martin, coisa que não acontecia há trezentos e quatorze anos. O Primeiro-Ministro Gordon Brown, atingido pelos escândalos, sofreu derrota nas eleições legislativas municipais, renúncias em seu gabinete e está na iminência de cair.

Já no Brasil a reação popular não vai além de uma difusa e inconseqüente indignação. A cidadania não consegue fazer de sua revolta uma força geradora de mudanças e instrumento de pressão que produza reformas políticas sérias e penalize de forma pedagógica os responsáveis por delitos éticos. A impunidade grassa a ponto de um obscuro deputado tocar as raias da insensatez ao dizer que se lixa para a opinião pública.

Esta parece ser a nota distintiva entre os escândalos nacionais e os ingleses. Lá, na velha Albion dos romanos, ninguém se lixa."