Artigo: Apuração rigorosa, sim
Vitória (ES), 22/05/2009 - O artigo "Apuração rigorosa, sim" é de autoria do presidente da Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) do Espírito Santo, Antonio Augusto Genelhu Junior, e foi publicado na edição de hoje (22) do jornal A Gazeta (ES):
"Ninguém, com um mínimo de respeito pelo ser humano, pode aceitar as condições do sistema penitenciário capixaba, de resto não muito diferente dos demais Estados da Federação. Qualquer que seja a unidade federada que se visite, certamente se encontrarão homens amontoados em celas feitas para receber um número significativamente menor de pessoas, submetidos a tratamento cruel, com seus direitos desrespeitados cotidianamente, aviltados pelo silêncio cúmplice dos que deveriam velar pelo respeito à sua integridade.
A inércia, a inação, o desprezo pela liberdade e pelo ser humano acabaram ficando como uma marca, gerando a revolta e culminando no pedido de intervenção no Estado. É preciso que as denúncias de tortura, gravíssimas, sejam apuradas com todo o rigor.
Não é possível que, em pleno século XXI, nossa consciência ainda aceite formas tão bárbaras de tratamento aos seres humanos que se encontram submetidos à custódia do Estado. Se alguém, algum dia, pode imaginar que celas metálicas seriam a solução para um desafogo momentâneo para a questão do excesso de presos, a realidade demonstrou o equívoco em que incidiram.
Todas as Declarações de Direitos Humanos, desde os seus primórdios, proclamam que ninguém pode ser submetido a tratamento cruel, desumano ou degradante. Não se pode compactuar com a tortura, o mais hediondo de todos os crimes, o mais bárbaro e primitivo de todos os delitos. Por isso, cada denúncia de disparo de balas (ainda que de borracha) para dentro das celas tem que ser investigada, punindo-se os seus autores e quem eventualmente tenha sido omisso na verificação dos ilícitos.
A situação é dramática e não pode continuar.
Mas, esse quadro dantesco, onde se unem de forma siamesa barbárie e omissão, é caso de intervenção federal no Estado? Penso que não. Embora a tortura mereça a mais exacerbada condenação, temos, no Espírito Santo, condições de apurar todas as denúncias, punindo seus autores e os que foram coniventes com a prática delas.
O que é necessário, portanto é a apuração dura, séria, rigorosa, com o acompanhamento dos órgãos da sociedade civil. É preciso aceitar os reclamos dos advogados, que contribuem efetivamente para a administração da justiça, com suas críticas e sugestões.
Vale registrar, ainda, que, ao julgar o pedido de Intervenção Federal 144, do Mato Grosso, o Supremo Tribunal Federal decidiu pelo indeferimento do pedido, em ementa da qual se extrai lição que é a síntese do que penso: "Embora a extrema gravidade dos fatos e o repúdio que sempre merecem atos de violência e crueldade, não se trata, porém, de situação concreta que, por si só, possa configurar causa bastante a decretar-se a intervenção federal no Estado (...). " Mas é fundamental que seja rompida a inércia, examinados os casos apontados e dadas as respostas que a sociedade civil anseia e exige. Se aí, sim, o Estado falhar, há de se pensar em outras soluções."