SNI ainda está vivo, diz presidente da OAB da Bahia
Brasília, 10/09/2008 - "A bisbilhotagem está centralizada nas mãos da Agência Brasileira de Informações (Abin), que, para mim, continua sendo o SNI. Ele ainda está vivo". A afirmação é do presidente da Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) da Bahia, Saul Quadros, que condenou hoje (10), veementemente, o estado se insegurança e de intranqüilidade que se criou no País em decorrência das recorrentes instalações ilegais de grampos telefônicos de que se vem tendo notícia. "Nossa intimidade e privacidade estão sendo invadidas por todo mundo e o que é pior: invadidas oficialmente, pelo governo federal."
Saul Quadros, que foi líder estudantil e preso na época do regime militar, lembrou que, na época da ditadura, o governo tinha o Serviço Nacional de Informações (SNI), o Dops e diversas outras entidades que bisbilhotavam a vida de todos. No entanto, hoje a coisa sofisticou-se e a "bisbilhotagem" migrou para as mãos da Abin e da Polícia Federal, que, segundo ele, deveriam desempenhar atividades distintas. "Estamos, sim, vivendo no país da grampolândia, onde ninguém respeita ninguém".
Saul Quadros, que acredita que todos os que falam ao telefone hoje têm receio de terem sua intimidade violada por mecanismos de escuta, criticou o uso em exagero do que chamou de "grampolândia", ainda que por determinação judicial. "Hoje, a polícia fiscaliza as pessoas em si e não em busca de atos delituosos que, eventualmente, podem acontecer", afirmou o dirigente da OAB baiana. "A Constituição está sendo tão desrespeitada que talvez fosse necessário apresentarmos uma PEC para acabar com o direito à intimidade e com o direito à privacidade. A ficar do jeito em que está, a Constituição está sendo rasgada.
A seguir a íntegra da entrevista concedida pelo presidente da OAB da Bahia, Saul Quadros:
P - Qual a sua visão dessa grampolândia que existe hoje no Brasil? O senhor está falando
tranquilamente ao telefone?
R - Todos que falam ao telefone hoje têm receio porque a sua intimidade pode estar sendo invadida. Hoje, a polícia fiscaliza as pessoas em si e não em busca de atos delituosos que, eventualmente, podem acontecer. Então, qualquer um hoje que fala ao telefone precisa ter cuidado porque a conversa com sua esposa, com o seu filho, com seu amigo todo mundo pode ter acesso. A Constituição está sendo tão desrespeitada que talvez fosse necessário apresentarmos uma PEC para acabar com o direito à intimidade e com o direito à privacidade. A ficar do jeito em que está, a Constituição está sendo rasgada.
P - Qual a sua avaliação sobre o caso Abin, em que um servidor teria supostamente instalado uma escuta ilegal para flagrar diálogos do presidente do STF, ministro Gilmar Mendes?
R - Eu vivi intensamente o período de 1964 para cá. Fui líder estudantil, fui preso, respondi a processo. Acho que essa história da Abin ainda é o ranço do SNI e isso precisa ser corrigido. Essa história de se invadir a privacidade, mesmo com ordem judicial, precisa ser muito bem regulamentada. O preferível é que não existisse isso, mas como não podemos ficar isentos ao combate ao crime e temos que buscar aqueles que estão infringindo a lei, principalmente no que diz respeito àqueles que cometem crime de corrupção, essa prática tem que ficar muito bem regulamentada. Do contrário, prevalecerá a bisbilhotice.
P - E em relação à Polícia Federal, já que o senhor citou a época da ditadura militar. Hoje, o papel da Polícia Federal é semelhante ao papel que ela desenvolvia na ditadura?
R - Não, naquela época se tinha o SNI, o Dops, diversas entidades que bisbilhotavam a vida de todo mundo e andavam cortando jornal pra ver o que a gente fazia. Hoje, a coisa sofisticou-se. A bisbilhotagem está centralizada nas mãos da Agência Brasileira de Informações, que para mim continua sendo o SNI, e estendeu-se à Polícia Federal, que desempenham atividades absolutamente distintas. A PF vai investigar possíveis crimes que estão sendo praticados. A Abin é uma agencia de assessoria à Presidência da República. Isso é muito ruim, pois um desvia a finalidade da outra. Com isso, estamos, sim, vivendo no país da grampolândia, onde ninguém respeita ninguém. Nossa intimidade e privacidade estão sendo invadidas por todo mundo e o que é pior: invadidas oficialmente, pelo governo federal.