OAB: Declaração de Curitiba completa 30 anos
Curitiba, 12/05/2008 -O auditório da Universidade Federal do Paraná (UFPR) ficou lotado naquele 12 de maio de 1978. Centenas de pessoas se acomodaram na sala ampla para acompanhar o encerramento da 7ª Conferência Nacional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). O evento ficou marcado pela Declaração de Curitiba, que pedia a volta do voto livre, a anistia geral, defendia o habeas corpus, o movimento sindical e a instalação de uma assembléia constituinte independente. A mensagem foi a "primeira manifestação aberta de uma entidade de classe contra a ditadura", explica o professor de Ciência Política da UFPR, Adriano Codato. "Há dez anos não havia manifestações da classe média contra a ditadura e essa mensagem marcou a volta delas", diz.
A ação dos advogados contou com a cobertura maciça dos meios de comunicação e ganhou a capa de jornais de todo o país. "A sala de imprensa que montamos ficou cheia e olha que não era uma salinha pequena", lembra o presidente da sessão Paraná da OAB na época, Eduardo Virmond. A cerimônia de abertura, realizada no Teatro Guaíra, reuniu cerca de 2.800 pessoas, entre advogados e estudantes de todo país. Nomes importantes da magistratura brasileira discursaram sobre a importância daquele encontro e a necessidade de se restabelecer o Estado Democrático de Direito no Brasil.
A fase mais obscura do regime militar brasileiro começou em 1968, quando o governo do então presidente Costa e Silva editou o Ato Institucional Nº 5. O AI-5, como ficou popularizada a ferramenta utilizada pelo regime para garantir os seus atos de perseguição política , durou dez anos, sendo revogado em 31 de dezembro de 1978, já no governo de Ernesto Geisel. O ato dava o poder ao presidente de decretar recesso do Congresso, intervenção em estados e municípios e cassar os direitos políticos de qualquer cidadão por dez anos. O texto também acabava com o direito ao hábeas corpus no caso de crime político e ainda tirava a estabilidade dos funcionários públicos, podendo o governo demitir ou aposentar aqueles que tomassem alguma atitude contrária ao regime.
Segundo o professor de Ciências Políticas e Econômicas da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR), Carlos Magno Bittencourt, o ato foi uma resposta dos militares aos movimentos liberais que ocorreram no Brasil em 1968. A marcha dos 100 mil - protesto realizado por estudantes no Rio de Janeiro contra o regime militar - e o discurso do deputado Márcio Moreira Alves (MDB) pela liberdade causaram a fúria dos militares na época e a resposta foi o AI-5.
Para o ministro aposentadodo Supremo Tribunal Federal (STF), Sepúlveda Pertence, o encontro foi um momento singular na história da OAB. "O papel da Ordem naqueles tempo foi um marco extraordinário porque se caminhava para um processo de abertura e essa conferência se tornou uma testemunha daquele período", afirma Pertence, que esteve presente em 1978 - era membro do Conselho Federal de Justiça.Na opinião de Sepulveda, o papel que a OAB assumiu no cenário político naquele momento a partir da Conferência não se repetiu depois na história. "Sem dúvida foi o momento mais eloqüente da Ordem no cenário político. Foi uma das poucas situações em que os advogados tiveram uma opinião unânime", comenta o ex-ministro. Ele estará em Curitiba em junho para participar do evento que será realizado pela OAB-PR para comemorar os 30 anos da Conferência.
Segundo Codato, aquela mobilização não influenciou diretamente o processo de abertura política do país. No entanto, na visão dele, conseguiu unir os movimentos contrários ao regime da época em torno de um só objetivo: a instalação imediata de uma assembléia constituinte independente. "Quando Raimundo Faoro (então presidente nacional da OAB) lançou essa palavra de ordem, ele conseguiu unir as reivindicações de diversos setores em uma só bandeira, a qual seria muito importante nos anos seguintes", diz. Essa bandeira, no entanto, não teve exatamente os resultados esperados. A Constituinte não foi independente e o processo de abertura política do país continuou a se desenrolar lentamente. "A Conferência não teve reflexo direto no andamento da abertura porque o processo político era controlado pelo presidente Geisel e o grupo em torno dele. Ela não teve influência nem no ritmo, nem na direção da abertura política", explica. (Gazeta do Povo)