Sociedade repudia prisão de menina com adultos em Goiás
Brasília, 09/02/2008 - A denúncia de que uma adolescente de 14 anos estava detida há duas semanas em um presídio masculino em Planaltina de Goiás repercutiu rapidamente no centro do poder. A Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados abriu uma espécie de inquérito para acompanhar o caso e organizou uma visita a Planaltina de Goiás e Formosa, na próxima quarta-feira, para conhecer a circunstância em que a jovem foi presa. Além disso, o presidente da Comissão, Luiz Couto (PT-PB), encaminhou ontem ofício ao governador de Goiás, Alcides Rodrigues Filho, pedindo “imediatas providências relativas às denúncias. Além da jovem, outros três adolescentes estavam detidos na Cadeia Pública da cidade.
A menina chegou à cadeia em 28 de janeiro, depois de ter roubado uma farmácia. Desde então, ela divide a cela com as quatro presas. Elas estavam na Ala C, onde há, ao todo, 50 detentos. Existe um espaço máximo de dois metros entre uma cela e outra. Assim, a jovem e suas companheiras passam o dia ouvindo ameaças e intimidações por parte dos homens do lugar.
“Constitui violação às normas constitucionais a inexistência de unidade especializada para internação de crianças e adolescentes, razão pela qual são imperiosas as providências para sua imediata construção”, cita o ofício. De acordo com o vice-presidente da comissão, deputado Pedro Wilson (PT-GO), o desrespeito aos direitos dos presos é recorrente no Entorno do Distrito Federal, mesmo ao lado da capital do país. Mas quando os fatos se relacionam a crianças e adolescentes a atenção deve ser redobrada”, comenta. “Houve omissão e conivência do Estado”, completa.
Foi na mesma linha a reação do presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Cezar Britto. “Não podemos admitir uma situação como essa. Não podemos deixar de nos indignar”, ponderou. De acordo com ele, o grande público do sistema carcerário é formado pelos excluídos. “São os pobres, os negros, as prostitutas e, agora, as crianças e adolescentes.”
O ouvidor nacional de Direitos Humanos da Secretaria Especial de Direitos Humanos, Firmino Fecchio, lamentou o fato. “É uma situação triste que causa indignação. Como um país pode tratar uma adolescente assim? Tomamos conhecimento dessa situação hoje (ontem) pela manhã. Agora sabemos que a presença de adolescentes em cadeias é uma situação geral do estado de Goiás. O próprio diretor do presídio nos contou que não é a primeira vez que menores ficam ali.”
Na opinião do diretor da SEDH, Fábio Silvestre, a prisão da adolescente com adultos poderia ter sido evitada com a implantação, pela Secretaria de Justiça do estado, de um equipamento adequado dentro do município para a recepção de menores infratores. “Existem parâmetros para que os adolescentes tenham tratamento adequado e bastaria aos órgãos responsáveis seguir esses parâmetros e desenvolver projetos de cidadania e reinserção desses menores à sociedade”, afirmou. “Após a infração, a garota foi ouvida pela promotoria e poderia ter sido liberada, mas isso não aconteceu porque a família da garota não foi encontrada”, contou Silvestre.
Outro fato destacado pelos defensores dos direitos humanos foi a presença de três mulheres no mesmo presídio masculino onde estava a jovem. A advogada Myllena Calazans, do Centro Feminista de Estudos e Assessoria (Cfêmea), explica que o desrespeito de gênero é comum no sistema prisional. “Cerca de 5% dos presos no país são mulheres, mas nem de longe temos locais para manter as quase 25 mil detentas que esse percentual representa”, comenta. “É conhecido que existe um significativo número de mulheres em celas mistas ou muito próximas de locais repletos de homens”, afirma a advogada. (A reportagem é de Erika Klingl e foi publicada na edição de hoje do Correio Braziliense)