Indicação de Lula para STM é ilegal e um acinte à advocacia
Brasília, 14/03/2006 – O Pleno do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) decidiu hoje (14) que a indicação do secretário-executivo do Ministério da Justiça, Luiz Paulo Teles Barreto, para o cargo de ministro do Superior Tribunal Militar (STM) rasga a Constituição Federal e é um acinte à advocacia brasileira. No entendimento da OAB, o indicado não preenche o requisito expresso no artigo 123, parágrafo único, inciso I da Constituição Federal, que exige a comprovação do candidato de dez anos de exercício profissional como advogado. A inscrição de Luiz Paulo Barreto na Seccional da OAB do Distrito Federal é a de número 22.404 e data de apenas três meses atrás, de 12 de dezembro de 2005.
Os conselheiros federais da OAB classificaram a indicação de Luiz Paulo Barreto pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva um acinte à OAB, uma vez que o indicado para a vaga no STM – destinada a advogado – não tem qualquer condição de comprovar o exercício da profissão. O conselheiro federal da entidade pela Paraíba, Edísio Souto, que ficou encarregado do voto que trará a manifestação do Pleno da OAB, afirmou que a entidade deverá encaminhar ofícios à Presidência da Comissão de Constituição e Justiça do Senado (que tem que aprovar o nome do indicado) e ao ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, para informá-los do entendimento da entidade. Se depois de notificados da manifestação a indicação não for suspensa, a entidade vai entrar com mandado de segurança no Supremo Tribunal Federal para contestar a sua legalidade.
“As indicações dos membros do STM cabem ao presidente da República e não à OAB, mas o presidente tem que fazer suas indicações com base nos princípios legais da Constituição e sem ferir as prerrogativas da advocacia”, afirmou Edísio Souto, lembrando que o artigo 54, inciso terceiro, da Lei nº 8.906/94 (Estatuto da Advocacia) estabelece que a OAB deve zelar pela independência e manutenção das prerrogativas profissionais dos advogados. O exame da matéria pelo Pleno da OAB nacional foi feito com base em consulta encaminhada pela OAB do Distrito Federal.
O conselheiro federal da OAB pelo Distrito Federal, Amauri Serralvo, ratificou que considera um acinte à advocacia a indicação de Barreto para o cargo no STM, indicação esta que vem sendo defendida pelo ministro da Justiça. “É um desrespeito à advocacia que Thomaz Bastos, que já foi nosso patrono e deveria mais do que ninguém zelar pelas prerrogativas da advocacia, apóie como indicado à vaga alguém que possui ínfimos três meses de inscrição na OAB. Me sinto desrespeitado”, afirmou Serralvo na sessão plenária, seguido de manifestações de vários conselheiros federais neste sentido.
A indicação Barreto para o cargo de ministro no STM foi anunciada na última semana pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A decisão da OAB de se manifestar contrariamente à indicação foi tomada durante sessão plenária da OAB, realizada em Brasília, da qual participam os 81 conselheiros federais da entidade, além dos membros honorários vitalícios Hermann Assis Baeta e Reginaldo Oscar de Castro. A sessão foi conduzida pelo presidente nacional da OAB, Roberto Busato.
Segue a íntegra, sem revisão, do comentário feito pelo conselheiro federal da OAB pelo Distrito Federal, Amauri Serralvo, durante a sessão plenária que analisou a indicação do secretário executivo do Ministério da Justiça, Luiz Paulo Teles Barreto para a vaga de ministro do Superior Tribunal Militar:
“Presidente, meus colegas conselheiros.
É óbvio que não se trata do quinto constitucional. A Constituição trata o problema da escolha de ministros do STM de livre escolha do presidente da República. É livre escolha. Entretanto, a Ordem, ao contrário do que muita gente pensa, sempre se posicionou, tendo intervido em outras vezes nesse processo de escolha. A Ordem pugnou na Constituinte para que a indicação passasse, antes, pelo crivo da Ordem, mas, infelizmente, a tese não venceu e a escolha é de livre escolha do presidente da República.
O caso do ministro José Coelho Ferreira, do STM, citado aqui nominalmente pelo meu colega Guaracy da Silva Freitas ( conselheiro federal da OAB pelo Amapá ), é diferente. O ministro José Coelho tinha efetivo exercício da advocacia por mais de vinte anos. Ele era advogado do Banco Central, foi, inclusive, chefe do jurídico do Banco Central e havia a condição primeira, de preencher a qualidade de advogado.
O caso Aloísio Alves, que acompanhei muito de perto porque, inclusive, fui eu quem impetrou o mandado de segurança contra ele, ao lado de Lacerda Neto, que era o presidente da Seccional. Nós impetramos o mandado de segurança contra a nomeação do Aloísio Alves porque ele nunca tinha assinado uma petição sequer. Infelizmente, havia inscrição dele na Ordem, anterior ao tempo que se exigia. Por isso foi indeferido o mandado de segurança, ele tinha o pressuposto da inscrição. Mas a posição fez com que o tribunal se negasse a dar posse a ele e, depois, que ele desistisse da inscrição. Então, a atuação da Ordem foi eficiente, ao contrário do que muitas pessoas pensam, de que não houve sucesso. Houve sucesso.
A Ordem já interferiu até de outra forma. Eu me lembro uma vez que eu fui indicado pelo nosso presidente, Ernando Uchoa Lima. Ele dizia que a Ordem não participava, mas que na opinião do Conselho Federal, deveria ser escolhido o advogado Amauri Serralvo. Foi o presidente Ernando que fez isso. Então, eu me lembro bem desse fato também, que a Ordem participou ativamente.
Acontece que essa questão, de conhecer-se por consulta ou não, nós já vimos que o secretário-geral Cezar Britto já nos trouxe a notícia de que há uma provocação, inclusive, de um outro advogado. Então, nessa questão específica, não é que a Ordem deve se manifestar não. Ela precisa se manifestar a teor do que foi dito aqui antes. Ora, o que está na Constituição? São exigidos dez anos de efetivo exercício da profissão. Eu fico até meio constrangido porque este rapaz foi meu aluno na faculdade de Direito, há uns 20 anos atrás, e eu tenho até um relacionamento de amizade com ele. Mas ele se inscreveu na OAB, na Seção do Distrito Federal, em dezembro de 2005. Isso é um acinte! Porque se ele tivesse exercício profissional antes de dezembro de 2005, ele seria criminoso, não teria idoneidade moral para se candidatar a uma vaga de ministro.
Ele não possui o requisito constitucional e a OAB se calar num momento desse, comete um crime de omissão porque a Ordem é obrigada a zelar por isso, como já foi dito pelo eminente medalha Rui Barbosa, professor Fábio Konder Comparato. Então, a bancada do Distrito Federal se coloca aqui, por unanimidade, inteiramente a favor da tese contrária, infelizmente, à minha querida amiga Fides Ommati ( conselheira federal da OAB pelo Piauí), mas no sentido que temos o dever de nos manifestar. E de nos manifestar com veemência contra e se persistirem no erro, a Ordem deve impetrar um mandado de segurança. Se não ganhar, não tem nem importância, mas marca posição.
A Ordem dos Advogados do Brasil não pode é se acovardar e se calar num momento importante como esse, em que solapam as prerrogativas do advogado porque é uma prerrogativa do advogado poder se candidatar a uma vaga no STM. Infelizmente, ele tem que ser amigo do presidente da República, mas, só advogado pode. A Ordem não escolhe, mas o presidente da República só pode escolher dentre aqueles.
E eu lamento profundamente que quem esteja capitaneando essa candidatura seja o meu particular e queridíssimo amigo Márcio Thomaz Bastos, que é um ex-presidente desta Casa e não podia comprar esta briga da forma como comprou. Ele tem o dever, como ex-presidente desta Casa, de se portar como um aliado nosso e nunca contra as prerrogativas nossas. É a posição que eu quero deixar clara aqui”.