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As propostas da OAB para a reforma do Judiciário

terça-feira, 23 de outubro de 2001 às 12h28

Brasília, 23/10/2001 - O presidente nacional da OAB, Rubens Approbato Machado, entregou ao senador Bernardo Cabral (PFL-AM), relator da proposta da emenda constitucional da reforma do Judiciário, as sugestões da entidade para evitar que instrumentos que se julgavam extintos voltem a fazer parte da Justiça brasileira. Os pontos críticos da reforma, segundo a OAB, são a "repercussão geral" e a "argüição de relevância", que receberam outras denominações nas sugestões defendidas há poucos dias pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Mesmo com outros nomes, esses instrumentos jurídicos, no entendimento da OAB, são centralizadores e trazem de volta o espírito do "Pacote de Abril", editado em 1977 pelo regime militar e de cunho autoritário. Para a Ordem dos Advogados, se o objetivo da sugestão é dar celeridade à Justiça, o efeito será muito mais danoso para a sociedade. "Trata-se da solução de se matar o doente, ao invés de se matar a doença", observou. Além disso, a OAB alertou para o risco de os ministros do STJ adquirirem poderes absolutos, decidindo o que irão julgar. Para dar maior celeridade ao julgamento dos processos, a Ordem defendeu mudanças na própria estrutura do STJ, ampliando o número de ministros.

No documento entregue ao senador Bernardo Cabral, a OAB também opina sobre controle externo do Judiciário, súmula vinculante, redução do número de recursos, quarentena após a aposentadoria do juiz e nomeação de parentes para o Judiciário.

Além de Approbato, compareceram à audiência no gabinete do senador o presidente da Seccional da OAB do Amazonas, Oldeney Sá Valente, e os conselheiros federais Marcelo Ribeiro e Roberto Rosas.

Abaixo, as sugestões da Ordem dos Advogados do Brasil para a reforma do Judiciário:


1. REPERCUSSÃO GERAL, ARGÜIÇÃO DE RELEVÂNCIA – INSTITUTOS INEFICIENTES, AUTORITÁRIOS E DESPROPOSITADOS

A OAB se posiciona contra o retorno, ainda que dissimulado sob novas denominações, do fracassado instituto da “argüição de relevância” que, na prática, gerou a inexistência da própria prestação jurisdicional do Supremo Tribunal Federal. Trata-se da solução de se matar o doente, ao invés de se matar a doença.

Em 1977, foi editado o chamado “Pacote de Abril”. No bojo da reformulação constitucional, foi criado um instituto que, com o tempo, se mostrou ineficiente e centralizador: a argüição de relevância. Segundo o instituto, o Supremo Tribunal Federal poderia discriminar, em seu Regimento Interno, quais as causas que, para serem examinadas pela Corte, necessitariam da demonstração, pelo recorrente, da relevância da questão federal. Teoricamente, o recorrente deveria, em capítulo do seu recurso, demonstrar que os temas debatidos na causa apresentam relevância nacional, que indicasse a necessidade de manifestação do STF. Na prática, a argüição de relevância simplesmente impediu o acesso dos jurisdicionados ao Supremo.

A restrição ao exame de recursos chegou a tal ponto que, de cada cem (100) argüições de relevância apresentadas, uma (01) era acolhida. Praticamente, portanto, deixou de existir o recurso extraordinário.

Ocorre que o Brasil é um País onde há predominância do direito federal. Há, necessariamente, de haver um tribunal nacional, com competência para julgar recursos oriundos dos tribunais estaduais e regionais. Tal recurso será cabível toda vez que a lei federal tiver sido violada pelas cortes locais. Se assim não for, não haverá unidade do direito federal. A legislação sobre o imposto de renda, por exemplo, será interpretada de um modo no Rio de Janeiro e de outro, completamente diverso, em Minas Gerais. O próprio direito penal não terá homogeneidade.

Além disso, sabe-se que os tribunais estaduais estão, muitas vezes, sujeitos às pressões locais. Recomenda-se, também por isso, a existência de um tribunal nacional que, longe das paixões e tensões regionais, possa decidir de acordo com o melhor Direito.

A argüição de relevância foi usada por mais de uma década no âmbito do STF. Provou-se, apenas, que a concessão de poder aos Ministros para dizerem, subjetivamente, o que desejam julgar, não enseja bons resultados. Na verdade, após alguns anos, o clamor nacional gerado em razão da restrição causada pela argüição de relevância foi tão grande que o constituinte de 1988 resolveu criar o Superior Tribunal de Justiça, o STJ. A esse novo tribunal coube parte da competência antes outorgada ao Supremo: julgar os recursos onde se pretende demonstrar violência à lei federal. Afastou-se do texto constitucional a previsão de instrumentos como a argüição de relevância. Com efeito, não faria sentido algum criar um tribunal para julgar o que o STF não julgava e dotá-lo do mesmo instrumento que acarretou a falta de julgamentos.

Para grande surpresa, contudo, apesar da rejeição da matéria na Câmara dos Deputados, surge, no Senado, proposta semelhante.

Com todo o respeito, trata-se de um total contra-senso.

Não se nega a necessidade de mudanças no Superior Tribunal de Justiça. Uma boa alternativa é o aumento do número de Ministros, muito reduzido para as dimensões do País. Basta ver que a Corte de Cassação da Itália, que tem funções mais simples do que o STJ e se situa em País com população muitíssimo inferior à nossa, conta, hoje, com cerca de 400 (quatrocentos) juízes, enquanto aqui são 33 (trinta e três).

Há, na verdade, muitas opções a serem estudadas. A ampliação da competência dos Juizados Especiais, por lei ordinária, por exemplo, seria uma saída. O que não se pode, passivamente, aceitar é que, pela ressurreição de um antiquado, ineficiente e centralizador instrumento, se conceda aos Ministros do Superior Tribunal de Justiça poderes absolutos, sem controle e totalmente discricionários, de decidirem o que vão julgar. Com isso não pode concordar a consciência jurídica nacional. Realmente, não é possível que os cidadãos fiquem privados do acesso a um dos mais importantes tribunais brasileiros, por força de uma lamentável criação do passado que, não se sabe porque, alguns querem ver de novo em vigor. Com isso, certamente, não haverá de concordar a Casa da Democracia, o Senado Federal.

2. REDUÇÃO DO NÚMERO DE RECURSOS

A OAB tem proclamado a necessidade urgente e imperiosa de uma reforma infra-constitucional, no que tange às normas processuais, a fim de torná-las menos burocráticas, mais ágeis, inclusive com a adoção de medidas tecnológicas modernas, capazes de ativar os atos processuais, sem, obviamente, criar qualquer cerceamento ao direito de defesa e ao contraditório. A norma processual deve estar a serviço da efetivação concreta do direito material. Desse modo, sempre se vê com bons olhos medidas capazes de diminuir a distância entre o pleito inicial e a decisão final, diminuindo-se atos e recursos meramente burocráticos, bem como diminuindo-se, por fixação na lei, os graus de jurisdição em determinados tipos de ações, ao mesmo tempo em que se extinga, no processo de execução, a possibilidade de novas discussões de caráter procrastinatório.

3. CONTROLE EXTERNO DO JUDICIÁRIO

A OAB é, rigorosamente, a favor do controle externo do Judiciário. Dentro do próprio Poder Judiciário, uma enorme parcela de seus componentes se põe francamente em favor desse controle, além daquele que, internamente, é feito pelas Corregedorias.

É óbvio que esse controle não pode ser feito em relação à atividade-fim do Judiciário, que é a prestação jurisdicional, sujeita ao controle revisional pelas instâncias superiores através dos recursos cabíveis.

De outro lado, o controle há de ser externo e não simplesmente interno, como uma outra “Corregedoria”, ainda que composta de juízes de Tribunais diversos. É necessária a presença, nesse colegiado, daqueles que, mesmo não integrando o Poder Judiciário, são, por definição constitucional, essenciais à prestação jurisdicional, como os advogados, os membros do Ministério Público, defensores públicos, entre outros. Ressalte-se, contudo, que, para evitar mágoa ao princípio da separação dos poderes, não pode o órgão de controle externo ter, em sua composição, membros dos outros Poderes da República.

4. SÚMULA VINCULANTE

A OAB se posiciona contrariamente à adoção da súmula vinculante. Há outros mecanismos mais eficazes de impedir o acúmulo de recursos nos Altos Pretórios, tais como, exemplificativamente:

A ampliação, pela legislação infraconstitucional, da competência dos Juizados Especiais. As causas menores, de pequena complexidade, devem ser decididas nos Juizados. Assim, haverá, como já vem ocorrendo, sensível diminuição da carga dos tribunais, inclusive do Superior Tribunal de Justiça.

A aplicação das penas relativas à litigância de má-fé, na reiteração de recursos sabidamente procrastinatórios. Essa pena será aplicada, também, ao Poder Público que é o recordista de recursos nos Tribunais Superiores, insistindo em teses superadas.

A súmula vinculante, além de não gerar efeito imediato na contenção de recursos, irá impedir a evolução jurisprudencial; a criação de novas teses ensejadoras da obtenção de uma Justiça mais atualizada; o estímulo aos juízes e tribunais de graus inferiores à sua produção intelectual; o livre convencimento dos juízes na apreciação individual dos pleitos. Criar-se-á o que já foi chamado de “computador de toga”, em que se despreza a evolução do conhecimento humano.

5. “QUARENTENA” APÓS A APOSENTADORIA DO MAGISTRADO

A proposta da OAB era no sentido de que a quarentena fosse de três (3) anos. Esse período teria por finalidade preservar a imagem do Poder Judiciário, bem como de seus integrantes, inclusive daquele que se aposenta. A idéia é evitar que se crie a impressão de tráfico de influência em um Poder que deve, necessariamente, dele estar isento.

Na Lei 4.215/63, havia um dispositivo que vigorou por mais de 20 anos, que estabelecia um interstício de 2 anos entre a aposentadoria do magistrado e seu ingresso ou reingresso nos quadros da OAB. Tal dispositivo foi declarado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal. Sua reinstituição, por emenda constitucional, contudo, seria possível e motivo de aplauso.

6. NOMEAÇÃO DE PARENTES PARA O JUDICIÁRIO, SALVO CONCURSO

A OAB é contrária a qualquer forma de “nepotismo”, seja ele direto ou indireto. Desse modo, a OAB concorda com a proposta de impedir a nomeação direta ou indireta de parentes dos membros do Poder Judiciário, ressalvado, por óbvio, o ingresso através do concurso público.

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