Artigo: A OAB e o orçamento nacional
Brasília,01/02/2005 - O artigo "A OAB e o orçamento nacional" é de autoria do vice-presidente do Conselho Federal da OAB, Aristoteles Atheniense:
"Ao completar o primeiro ano de sua fecunda administração, o presidente Roberto Busato instituiu uma comissão no Conselho Federal, que promoverá o levantamento dos motivos da carga tributária brasileira, reconhecida como sendo das mais elevadas do mundo.
Num governo marcado por contradições como o atual, a proposta virá colocar a limpo muitas incertezas que vêm afetando as camadas menos privilegiadas da sociedade.
Certamente que não há interesse do Executivo em esclarecer o que já deveria ter sido aclarado.
A melhor prova deste receio consistiu na recente providência do Ministro interino do Planejamento, procurando impedir que dados fornecidos pelo IBGE fossem divulgados sem o prévio conhecimento do titular daquela Pasta.
Como bem acentuou o jurista Ives Gandra Martins, integrante da mencionada Comissão: “se todo governo emana do povo, é inaceitável que o povo fique permanentemente submisso aos interesses do governo”.
A malsinada MP 232, editada na virada do ano, afetou exclusivamente as pequenas e médias empresas, afrontando o princípio da isonomia e concorrendo para que muitas destas empresas voltem a informalidade. Em razão dessa medida abusiva, ficou comprometida a ação de pequenos e médios empresários, enquanto que os grandes não foram atingidos por ela.
Há, pois, o flagrante desencontro entre o que se afirmou em Davos, na última semana, com o que se pratica no Brasil.
A esta altura, tornou-se evidente o “marketing” político exibido no exterior, através de uma doutrina artificiosa que o nosso povo vem repelindo em sucessivas oportunidades, a exemplo do que ocorreu em Porto Alegre.
O trabalho que o presidente Roberto Busato pretende levar adiante compreende, obviamente, a elaboração do orçamento, palavra de origem italiana (“orzare”) que significa “fazer cálculos”.
Se o Estado é o ente responsável pela concepção do bem estar social, no atendimento de suas necessidades básicas, é incompreensível que se administre um país tendo em vista, apenas, a sua imagem em outros continentes, sem se preocupar com o futuro.
O que vem acontecendo no Brasil extrapola o razoável, pois a alta carga tributária corresponde a 40% do PIB, enquanto que na década de 80 esta mesma relação apresentou um índice médio de 24,9%.
O orçamento, segundo Celso Ribeiro Bastos, é antes de tudo uma peça jurídica, ainda que aprovada pelo Legislativo para figurar como lei, tendo por objeto a atividade financeira do Estado, quer do ponto de vista das receitas quer das despesas.
A alta taxa a que chegamos não é conseqüência do desempenho insatisfatório na obtenção de receitas, mas decorrente, sim, de juros da dívida interna e externa, de contratos com taxa de correção exorbitante e do montante das despesas desnecessárias e alheias à função estatal.
Temos, pois, um Estado perdulário, cujo Presidente não se acanha de ostentar um avião luxuoso, como se este, por si só, representasse o elevado padrão de vida do povo brasileiro. É um Estado que além de gastar muito, também gasta mal.
Assim, em razão do conteúdo jurídico do orçamento justifica-se a atuação da OAB, por força de seu Estatuto, de forma que a Lei de Meios venha a se tornar, segundo aquele tributarista, em “instrumento de exercício da democracia pelo qual os particulares exercem o direito, por intermédio de seus mandatários, de só verem efetivadas as despesas e permitidas as arrecadações tributárias que ESTIVEREM AUTORIZADAS NA LEI ORÇAMENTÁRIA” (in “Curso de Direito Financeiro e de Direito Tributário”, 2ª edição, Saraiva/1992, p. 74).
A indagação formulada por Roberto Busato, em 2005, é a mesma que José Américo de Almeida sustentou em 1937: “Onde está o dinheiro?”Até hoje, ninguém conseguiu explicar a razão do estado calamitoso de nossas estradas, da mesma forma que não foi esclarecido o aproveitamento dos recursos obtidos através do CPMF.A nossa capacidade de tolerância há de ter um limite.
Justa a preocupação da OAB em enfrentar a voracidade fiscal, na esperança de que o Judiciário não faltará em seu papel de acolher as medidas que lhe forem dirigidas e que possam por fim a este descalabro.