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Saúde no Brasil é coisa de louco, segundo balanço da OAB

segunda-feira, 16 de agosto de 2004 às 10h41

Brasília, 16/08/2004 - “A saúde no Brasil é coisa de louco”. Esta é a convicção que o presidente da Comissão Nacional de Direitos Humanos do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, Edísio Simões Souto, disse ter firmado diante do saldo da blitz em diversos manicômios do País, realizada no último dia 22 pela OAB em parceria com a Comissão de Direitos Humanos do Conselho Federal de Psicologia.

Ao fazer hoje (16) um balanço nacional das vistorias realizadas em 38 estabelecimentos psiquiátricos de 15 Estados e Distrito Federal, ele explicou o porquê a saúde no País é “coisa de louco”. Estabelecimentos com pacientes que vivem nus, doentes mentais tratados como presidiários, hospitais que não têm plantão médico em finais de semana, muito menos terapeutas ocupacionais ou medicamentos indispensáveis ao tratamento das doenças mentais, compõem um painel dessa loucura, segundo o presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB.

A seguir, a íntegra da entrevista concedida por Edísio Souto sobre o balanço da blitz nos manicômios:

P- Qual o balanço, afinal, que a OAB faz das vistorias nos manicômios brasileiros, realizada em conjunto com o Conselho Federal de Psiologia?
R- Até depois dos relatórios parciais começarem a chegar às nossas mãos, eu ainda brincava, dizendo que no Brasil saúde é coisa de louco. Realmente, nós encontramos na quase totalidade dos manicômios um quadro de extrema preocupação. Encontramos estabelecimentos em que os pacientes vivem nus, em regiões muito frias. Encontramos hospitais tratando doentes mentais como presidiários, com enfermarias trancadas a grades e cadeados. Encontramos hospitais que não têm plantão médico no final de semana, que não têm terapeutas ocupacionais, que não têm medicamentos fundamentais e indispensáveis ao tratamento. Ou seja, faz-se de conta que se trata quando, de fato, sem condições, sem profissionais e sem medicamentos não se está tratando ninguém. Em suma, é um quadro extremamente preocupante. Vamos entregar esse relatório ao Ministério da Saúde, pois o próprio Ministério, através de uma nota em julho, sinalizou que iria fazer ele mesmo uma inspeção completa nas unidades psiquiátricas do País. Essa informação, por sinal, nos deixou esperançosos porque é preciso que o governo levante essa realidade. Há uma reclamação por parte de diretores de hospitais com relação ao pagamento do Sistema Único de Saúde(SUS), argumentam que o quanto o SUS paga não é suficiente. Mas a questão econômica não pode se sobrepor à questão do ser humano. Se não está dando para tratar a pessoa doente, necessitada, então que saia do sistema. O que não pode é fazer de conta que está tratando dela e na realidade não estar fazendo isso.

P - O maior problema também é com relação á fiscalização deficiente?
R - Acho que está faltando fiscalização por parte do SUS. Ele tem uma resolução que estabelece o que é que uma unidade psiquiátrica precisa ter. E nós observamos in loco, no campo, com essa equipe da OAB e Conselho Federal de Psicologia, que vários dos itens das resoluções não estão sendo cumpridos. Como citei há pouco: faltam medicamentos, faltam terapeutas ocupacionais, eventualmente até médicos nos fins-de-semana.

P- Isso fortalece a luta antimanicomial?
R - Com o quadro que nós constatamos - e a OAB, como instituição que não é da área técnica, não pode ter uma avaliação se é favorável ou não a essa luta -, a se manter pessoas em manicômios do jeito que elas estão, que vimos com os próprios olhos, aí a OAB passa a ser a favor da luta antimanicomial. Podemos até admitir, como leigos no assunto, que se tenha a internação, mas internação com dignidade, com medicamentos, com tratamento, com alguém sendo efetivamente tratado. E não fazendo-se de conta que se está tratando.

P - O relatório propõe ações para o governo federal nessa área?
R - Nós entendemos que não seria suficiente apontar os defeitos, ou o que vimos de negativo. Entendemos que seria necessário apontar alguns caminhos. Nesse sentido, estamos apresentando sugestões. Primeiro, é preciso maior fiscalização, o Ministério da Saúde tem que fiscalizar mais, até porque há dinheiro público envolvido, através dos pagamentos do SUS. Então, a fiscalização precisa ser intensificada. Há necessidade também de se fazer a discussão, no nível técnico, se ainda é necessário, efetivamente, ter pessoas internas em hospitais nas áreas de doenças mentais. Há uma corrente que ainda defende a internação, enquanto outra entende que a melhor terapia para o doente mental é sua devolução à família, ou seja, a família seria o melhor terapeuta. E o que é mais grave, principalmente nos rincões mais distantes: encontram-se pessoas com problemas neurológicas, que não têm problemas psiquiátricos, tratadas nas mesmas unidades onde se tratam portadores de doenças mentais. Então, alguém que tem um problema neurológico, mas é são do ponto de vista mental, passa a conviver com doentes mentais. Daqui a pouco, essa pessoa passa a adquirir o problema mental, nessa mistura total, pois não há uma separação no tratamento nessas unidades. Elas tratam um problema neurológico como se fosse uma doença mental. É preciso um basta a essa situação.

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