Editorial: A reeleição
Vitória (ES), 08/10/2008 - O editorial "A reeleição" foi publicado na edição de hoje (08) do jornal A Gazeta (ES):
"Reeleição. Era inevitável que esse tema voltasse à discussão após os resultados das eleições para prefeito, no último domingo.
Viu-se uma farra do poder. Todos os 20 prefeitos de capital que tentaram repetir o mandato foram reconduzidos ou vão disputar o segundo turno. No Espírito Santo, dos 50 que tentaram a reeleição, 33 conseguiram.
Analistas consideram que esse quadro configura a reeleição como uma tendência para o chefe de Executivo com mandato bem-sucedido. Garantia, não. Nas urnas não há resultado prévio. O número de votos reflete o somatório de um conjunto muito complexo de variáveis. A virtude do homem público, compreendida pela população, tem se mostrado decisiva. Felizmente.
Historicamente, a tendência da reeleição tem sido bem aproveitada, nos níveis estadual e municipal. Isso ocorre desde o pleito de 1998, o primeiro após a aprovação, em 1997, da emenda constitucional que instituiu a recondução. Nas eleições realizadas em 2000, nada menos de 16 dos 23 prefeitos de capitais foram reeleitos (69,5%); em 2004, o percentual foi maior: 8 dos 11 candidatos (72,7%) ganharam mais quatro anos frente às municipalidades.
Chefes de Executivo dos Estados também caminham com competência na estrada da reeleição. Veja: em 1998, dos 21 governadores que tentaram bisar o mandato, 14 conseguiram (66,6%); em 2002, lograram o segundo mandato consecutivo 10 dos 14 candidatos (71,4%); em 2006, foram reconduzidos 14 dos 19 que se candidataram com esse objetivo (73,7%). Portanto, a cada pleito o percentual é maior. Disseminou-se o aprendizado, e isso alimenta ainda mais a polêmica sobre a reeleição.
Em discurso pronunciado há exatos três anos (em 3 de outubro de 2005), na abertura do 5º Congresso de Metalúrgicos, na sede da entidade, em São Bernardo do Campo, o presidente Lula disse que a reeleição "a gente constrói". É justamente esse o ponto de controvérsia. Ou seja, quem cumpre mandato tem vantagem competitiva em relação a quem não pilota a máquina administrativa. Entende-se que a freqüente exposição na mídia já representa, em si, uma força eleitoral.
Considerando essas razões é que em 1997 o PT votou contra a emenda constitucional que criou a reeleição, apoiada pelo PSDB, que objetivava o segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso. Pela mesma razão, os partidos que agora são da oposição criticam esse mecanismo. Ressaltam, entre vários argumentos, que o eventual uso político da máquina pública deturpa a sua finalidade, o que, obviamente, não deve ser tolerado.
A esse respeito merece reflexão o discurso pronunciado em 22 de fevereiro de 2006, no Tribunal Superior Eleitoral, pelo então presidente da OAB, Roberto Busato: "Canteiro de obra não é palanque. Fazer crer a uma sociedade como a nossa, em larga escala iletrada e despolitizada, que as obras públicas são dádivas do Estado, do governo ou mesmo de determinado partido ou governante, constitui logro político". Mas a verdade é que essa percepção nem sempre se torna nítida. Às vezes há exagero na acusação, ou entendimento equivocado. O exercício do cargo legitima a presença do chefe do Executivo, esteja só ou acompanhado da sua equipe, no canteiro de obra, da pedra fundamental à inauguração.
A possibilidade constitucional da recandidatura também é assunto que pode ser tratado no âmbito de uma reforma política. Mas é muito importante o engajamento da sociedade, inclusive com manifestações por meio de suas entidades de classe."