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Filho quer reabrir caso Lyda Monteiro

quarta-feira, 26 de agosto de 2009 às 10h46

Rio de Janeiro, 26/08/2009 - Quase três décadas depois dos atentados que sacudiram o país na conspiração da direita militar contra a abertura política, o país anda empanturrado de liberdade, mas ainda convive com as perguntas que não querem calar. "Tudo o que quero saber é quem fez e quem mandou? O Brasil tem uma tradição política de barganhar a história. Mas não pode continuar jogando o lixo para baixo do tapete", diz o advogado e professor Luiz Felippe Monteiro Dias, ao lembrar da explosão da carta-bomba na sede do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) que matou sua mãe, a ex-secretária Lyda Monteiro.

Filho único e, à época, órfão de pai, Luiz Felippe tinha 23 anos, era estudante e naquela tarde defendia sua tese de mestrado em ciências políticas na Pontifícia Universidade Católica (PUC) do Rio quando ouviu de um amigo a notícia sobre a explosão no prédio da OAB. O noticiário seguinte já dava o nome de sua mãe, mas informava que ela havia sido apenas ferida.

"Fui direto para o Souza Aguiar. Quando cheguei, ela já estava morta", conta ele, ao recordar o longo e doloroso processo que se iniciava na tarde em que sua mãe foi morta, no dia 27 de agosto de 1980. Lyda Monteiro se transformava num símbolo da luta pela redemocratização exatamente no momento em que a linha dura do Exército radicalizava e respondia com novos atentados os pedidos por abertura política. "A onda terrorista se arrastou até o Caso Riocentro".

No dia 30 de abril de 1981, uma nova bomba explodiu no interior de um Puma estacionado em frente ao Riocentro, provocando ferimentos em um capitão do Exército e matando o sargento Guilherme Pereira do Rosário, cuja imagem se transformou em mais uma peça no intrincado quebra-cabeças que passaria a inquietar nos próximos anos o filho de dona Lyda Monteiro.

"Poucos dias antes do Riocentro ele (o sargento Rosário) foi visto parado em frente ao túmulo de minha mãe no Cemitério São João Batista. Acho que deve ter tido uma crise de consciência", diz o advogado.

A história faz parte dos bastidores da apuração particular em que Luiz Felippe se envolveu para tentar esclarecer a morte da mãe. Segundo ele, o sargento foi reconhecido por uma tia, Palmira, e uma prima, Isis, na foto divulgada amplamente logo depois do acidente com a bomba que explodiu em frente ao Riocentro.

O advogado relata que a tia e a prima acharam estranha e curiosa a postura compenetrada do homem que visitava o túmulo de Lyda. Lembraram dele ao ver a foto estampada em jornais e revistas como um dos envolvidos no atentado do Riocentro. Como o Inquérito Policial Militar (IPM) não chegou a qualquer conclusão, Luiz Felippe acha que Rosário pode ter participação no atentado que matou sua mãe e visitou num lampejo de arrependimento.

Certo ou errada, a suspeita está longe de tirar as dúvidas que o advogado ainda tem na memória. Ele sugere que a OAB e o Congresso cobrem esclarecimentos e o governo, em vez de recorrer aos métodos tradicionais de investigação, entregue o caso a um grupo de pesquisadores preocupado em esclarecer os episódios ainda pendentes sobre os anos de chumbo.

"Não é revanchismo. Hoje há clima para se esclarecer. A indenização (pecuniária) não basta, não é suficiente. É preciso construir um processo de resgate da história do país", afirma o advogado, que hoje vai defender a reabertura das apurações sobre os crimes da ditadura durante a homenagem que será prestada à memória de sua mãe, na sede da OAB do Rio. A solenidade terá a presença do ministro Paulo Vannicchi, da Secretaria Especial de Direitos Humanos (SEDH), que é favorável a responsabilização criminal de quem praticou tortura ou sumiu com os corpos de ativistas mortos durante o regime militar.

Luiz Felippe acredita que o Supremo Tribunal Federal - que vai julgar em breve o recurso da OAB sobre os limites da Lei da Anistia - pode dar uma resposta aos segmentos que lutam pelo esclarecimento das pendências históricas deixadas pela ditadura. "Governo nenhum não enxerga bônus nesse tipo de investigação. Mas é preciso resgatar a história. Nunca deixei de acreditar que seria possível esclarecer", afirma o advogado. Ele explica que esgotou todos os recursos que estavam ao seu alcance para tentar chegar aos autores e mandantes.

Durante dez anos fez parte da Comissão de Direitos Humanos da OAB do Rio, mas as buscas eram boicotadas sempre que apontavam para uma solução. O momento mais próximo, lembra, foi quando a polícia do Rio descobriu a máquina de datilografia usada para escrever o endereço e o nome do advogado Eduardo Seabra Fagundes.

"Nessa época os militares retiraram o inquérito da polícia. Não me conformo com o fato do crime não ter sido apurado. Conseguimos levar o caso para a abertura política, mas ele acabou no arquivo. O crime é imprescritível e a punição é inevitável", diz.

Professor da Universidade Cândido Mendes, Luiz Felippe foi indenizado com R$ 100 mil pelo governo do Rio, recebe uma pensão mensal de R$ 500 e é contra as reparações milionárias que vem sendo concedidas pelo governo. "O que importa mesmo é o esclarecimento. A OAB deveria pedir a reabertura do caso. Hoje há clima". (A reportagem é de Vasconcelo Quadros e foi publicada na edição de hoje do Jornal do Brasil)

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