Em decisão inédita, TST substitui sindicato e firma acordo
Brasília, 11/06/2002 - A resistência do sindicato de trabalhadores em firmar um acordo coletivo, apesar da aprovação da matéria pela maioria dos empregados de uma empresa do interior paulista, levou a Seção de Dissídios Coletivos (SDC) do Tribunal Superior do Trabalho a uma decisão inédita. Pela primeira vez em sua história, o TST supriu judicialmente a ausência de uma entidade sindical e deu o consentimento necessário à homologação de um acordo coletivo.
“Cuida-se de dissídio coletivo inédito e sui generis em que a empresa aciona a Justiça do Trabalho para obter endosso a acordo coletivo de trabalho firmado diretamente com Comissão de Negociação dos Empregados para a implantação de banco de horas, em virtude da alegada recusa do sindicato da categoria profissional à negociação coletiva”, explicou o ministro João Oreste Dalazen ao se manifestar sobre a questão e aderir ao voto do ministro Wagner Pimenta, o relator do processo na SDC.
“O ineditismo repousa na circunstância de tratar-se de dissídio coletivo que, em derradeira análise, tem por escopo (objetivo) um suprimento judicial de consentimento não alcançado da entidade sindical representativa dos empregados visando à adoção de banco de horas na empresa”, esclareceu o ministro João Oreste Dalazen.
A controvérsia trabalhista, que originou a decisão inédita do TST, aconteceu entre a empresa Brascabos Componentes Elétricos e Eletrônicos Ltda. e o Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias Metalúrgicas, Mecânicas, de Material Elétrico e Ourives de Limeira e Região. As duas partes não chegaram a um consenso sobre a proposta patronal de implantação do chamado banco de horas na empresa, sistema que adapta a duração da jornada de trabalho às oscilações de mercado, a fim de baratear a produção, e compensa o trabalho extraordinário por meio da concessão de folgas aos empregados.
Apresentada no final do ano de 1997, a proposta de implantação do banco de horas foi objeto de uma longa controvérsia entre a empresa e o sindicato profissional. Segundo os autos do processo, logo após a eleição de uma comissão de negociação interna (dezembro de 97), a diretoria da firma formulou o primeiro convite formal ao sindicato para negociar o banco de horas (janeiro de 98). Diante da recusa reiterada da entidade sindical em promover a assembléia para deliberar sobre o tema, uma consulta direta registrou a concordância de 79,69% dos empregados com a proposta patronal.
Na falta do acordo coletivo necessário, em dezembro de 98 foi pedido o arquivamento, junto à Delegacia Regional do Trabalho, de um acerto diretamente firmado com a comissão de negociação a fim de validar o banco de horas. No mesmo mês, houve fiscalização do Ministério do Trabalho na empresa e foram lavrados três autos de infração uma vez que o acordo firmado diretamente com os empregados não foi reconhecido.
Diante do impasse, a Brascabos ajuizou um pedido de dissídio coletivo junto ao Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (sediado em Campinas – SP). Durante a realização de audiência de conciliação e julgamento no TRT, foi acertada, para o dia 28 de abril de 1999, a realização da assembléia, na cidade de Rio Claro (SP), para tratar do banco de horas. Dois dias antes, contudo, o sindicato profissional estabeleceu em 95% dos interessados o quórum para a instalação da assembléia e dois terços dos votos para a aprovação do banco de horas.
De um total de 472 funcionários com interesse direto na proposta, 425 compareceram ao encontro e 57% deles (241 trabalhadores) votaram pela instituição do banco de horas. Outros 177 empregados optaram pela proposta formulada pelo sindicato de adoção de um instrumento de compensação de horas acrescido de uma proposta de estabilidade provisória.
Conforme as regras firmadas pelo sindicato, a implantação das mudanças na jornada de trabalho necessitaria de 283 votos. Por este motivo, o sindicato considerou insuficiente o índice de 57% dos votos favoráveis à aprovação do banco de horas. No âmbito judicial, o TRT da 15ªRegião julgou improcedente o pedido de dissídio coletivo formulado pela Brascabos a fim de que a Justiça do Trabalho suprisse o consentimento negado pela entidade sindical à homologação do banco de horas.
Para alterar este quadro, a empresa ajuizou um recurso ordinário no TST, onde um dos principais temas discutidos foi o quórum exigido para a assembléia. “A questão central do recurso ordinário em dissídio coletivo prende-se ao exame da validade do quórum deliberativo especial imposto unilateralmente pela diretoria do Sindicato profissional”, sustentou o ministro Dalazen durante o julgamento da causa na SDC.
O ministro do TST afirmou, também, que o art. 612 da CLT autoriza celebração de acordo coletivo de trabalho por deliberação de assembléia geral especialmente convocada para esse fim, com a presença de um terço dos membros. Outra fonte citada foi o próprio estatuto do sindicato paulista que prevê a maioria simples como o quórum necessário para as deliberações em suas assembléias em oposição às exigências estabelecidas pela entidade sindical em relação à empresa Brascabos. “Entendo que a elevação unilateral do quórum para deliberação encetada pelo sindicato afigura-se não apenas arbitrária e desprovida de respaldo na lei, como também contrariou o próprio acerto firmado pelo sindicato perante o TRT da 15ª Região”.
Ao fazer o histórico de toda a controvérsia judicial, o ministro Dalazen se disse “impressionado” com o comportamento do sindicato, “que sistematicamente recusou-se a consultar os associados interessados e injustificadamente se antepôs à negociação com a empresa, o que, evidentemente, é bem diferente de, negociando, defender uma posição contrária aos interesses do empregador”.
Ao concluir seu voto pela validade da manifestação de vontade dos empregados e convalidação do banco de horas, o ministro do TST sustentou que “o sindicato não é a categoria; ele representa a categoria, cuja manifestação é soberana, como vontade última de seus desígnios”. Segundo Dalazen, “não é concebível, sobretudo, admitir-se que a vontade artificial do corpo diretivo do sindicato, por mais respeitável que seja, sobreponha-se à vontade livre e soberanamente manifestada dos empregados consubstanciada em deliberação de assembléia geral especialmente convocada para tal fim”.
Os ministros da SDC que votaram contra a concessão do recurso à empresa Brascabos se apoiaram no dispositivo da Constituição Federal (art. 8º , VI), onde é expressa a participação obrigatória dos sindicatos nas negociações coletivas de trabalho.
(Fonte: Assessoria de Imprensa do TST)