Susane Richthofen volta para cadeia em São Paulo
Brasília, 16/04/2006 - Depois de nove meses em liberdade, Suzane passou o Domingo de Páscoa na cadeia. A farsa armada por ela e seu advogado foi desmascarada aqui no Fantástico.
Noite de segunda-feira, dia 10/04/2006. Menos de 24 horas depois de exibida a reportagem no Fantástico, Suzane Von Richthofen se entrega à polícia, em São Paulo.
Uma mulher de 22 anos, que usa roupas da Minnie e pantufas de coelhinho. Na entrevista de domingo passado, orientada pelos advogados, Suzane pretendia mostrar um ar infantil e ingênuo, uma personalidade confusa e influenciável. Não deu certo!
"Foi um circo, mas um circo mal armado, de baixíssima inspiração, com atores canastrões e um diretor sem nenhum talento para dirigir artista", acusa Roberto Tardelli, promotor de Justiça.
A estratégia da defesa foi desmascarada. Suzane e os advogados se esqueceram que o microfone, instalado com o conhecimento e o consentimento deles, estava ligado. Os editores do Fantástico também perceberam somente depois, revendo as fitas, o teor das declarações.
"Isso revela de um lado a personalidade dela. Do outro, o padrão ético das pessoas que a estão amparando", comenta Roberto Terdelli.
O tutor e advogado de Suzane, Denivaldo Barni, deu outra versão para o diálogo. O choro seria para comover o irmão dela, Andréas.
"Suzane, está na hora de você chorar para o seu irmão. Tem que ficar de joelhos, pedir moradia", justificou Barni.
Em outro momento da reportagem, o advogado Mário Sérgio de Oliveira reforça a orientação para Suzane chorar diante da câmera e acusar o ex-namorado, Daniel Cravinhos - assassino confesso do casal Richthofen, junto com o irmão, Cristian.
"Acabou. Mais nada. Começa a chorar e fala: "Não quero mais"... O que ele mandava...Ele mandava, sempre dizendo que se eu o amasse, era para fazer... E "pelo amor de Deus, não quero mais tocar nesse assunto, que me faz muito mal". E chega", orientou o advogado para Suzane na ocasião.
O Fantástico não usou qualquer truque de edição, não fez montagem e nem manipulou a fala de Mário Sérgio de Oliveira. E respeitando o pedido do tutor de Suzane, a reportagem de Fabiana Godoy também não recorreu a imagens de arquivo. O teor da entrevista foi mantido, de acordo com a seqüência dos fatos.
O Fantástico só decidiu exibir as gravações, captadas ao acaso, por considerá-las como uma informação relevante para a reportagem. Do contrário, estaria se deixando usar como instrumento para beneficiar Suzane. A seção paulista da Ordem dos Advogados do Brasil abriu sindicância para investigar a conduta dos advogados.
"Evidentemente a forma como se portaram os advogados foi um tanto quanto extravagante", comenta Roberto Busato, presidente nacional da OAB.
É direito do advogado instruir o cliente da forma que julgar necessária. Ele pode, inclusive, orientá-lo a mentir, porque a lei não obriga o réu a se incriminar. Por isso, Mário Sérgio de Oliveira e Denivaldo Barni devem receber, no máximo, uma advertência por escrito. Mas, será que é uma atitude ética pedir ao cliente para chorar, simular um sentimento?
"Não, absolutamente não! O processo não é teatro. Uma infração ética de um advogado atinge a todos os advogados. Se o objetivo foi criar uma boa imagem para a ré, dentro desse processo, realmente o feitiço foi contra o feiticeiro", garante Roberto Busato.
Suzane passou a noite de segunda para terça-feira algemada e acorrentada no Departamento de Homicídios de São Paulo, um procedimento considerado injustificável e abusivo da polícia.
"Isso é crime. Não podemos admitir a tortura no nosso país", acusa Ademar Gomes, presidente da Associação dos Advogados Criminalistas de São Paulo.
No dia seguinte, ela foi transferida para a Penitenciária Feminina de Santana, mas não ficou lá muito tempo.
"A Suzane Richthofen não tem segurança nenhuma. E as presas recomendaram aos funcionários que ela vai morrer", alertou uma pessoa, que não quis se identificar.
Na quinta-feira, Suzane voltou para o presídio onde viveu de agosto de 2004 a junho de 2005: o Centro de Ressocialização de Rio Claro.
Ela foi mandada de volta para a cadeia porque colocava em risco a vida do irmão, Andreas. Esta é a justificativa que a Promotoria apresentou para o pedido de prisão preventiva. Suzane e Andreas brigam na Justiça pela herança dos pais assassinados.
"Eu diria que ela é potencialmente perigosa. Ela tinha acesso à casa do irmão, sem que este soubesse. Ou pior: sem que este permitisse esta presença dela em sua casa", argumenta o juiz Richard Chequini, do 1º Tribunal de Júri de São Paulo.
Segundo o promotor, Suzane se diz a única e legítima herdeira e quer o direito de administrar todos os bens da família.
"Ela manda contar tudo quanto é talher, prato, garfo, panela, assadeira, porta-retrato, copo, garrafa, que tinha na casa", conta o promotor.
De acordo com Denivaldo Barni, tutor e advogado de Suzane, o irmão nega alimentos, paga caseiros para tomar conta dos sítios, para tomar conta dos imóveis, para sustentar cachorro, cães de estimação.
"Acho que Suzane tem esse direito, pelo menos, do mínimo e de ter moradia", reclama Denivaldo.
O caso de Suzane Von Richthofen entrou para a galeria dos crimes em família que marcaram São Paulo. Em dezembro de 1988, na véspera do Natal, o advogado Jorge Bouchabki e sua mulher, Maria Cecília, são mortos a tiros. O crime da rua Cuba é um mistério até hoje. Dezoito anos depois, ninguém sabe quem assassinou o advogado e a esposa, dentro de casa. A polícia e a promotoria chegaram a apontar um suspeito: o filho mais velho do casal, Jorge Delmanto Bouchabki. A Justiça acabou arquivando o caso por falta de provas contra ele. A casa da rua Cuba foi vendida em 2001.
Em abril de 2004, o ex-seminarista Gil Rugai é acusado de matar o pai e a madrasta a tiros, para encobrir um desfalque financeiro. O Fantástico o entrevistou na cadeia, em julho de 2005. Gil alegou ser inocente. Ele continua preso, à espera do julgamento.
Fevereiro do ano passado, uma família inteira é envenenada com arsênico, em Campinas. Morrem o pai - médico homeopata -, a mulher e a filha mais velha, de 17 anos. A única sobrevivente, a filha caçula, de 15 anos, é apontada como suspeita. A adolescente vive hoje com um tio, no Rio de Janeiro.
Em agosto de 2000, o jornalista Antônio Pimenta Neves mata a ex-namorada, Sandra Gomide, com dois tiros à queima-roupa. O primeiro foi pelas costas e o segundo, quando Sandra já estava caída no chão, atingiu o ouvido esquerdo.
"Eu me sinto humilhado, como se não fosse cidadão brasileiro. Todos os amigos falam: "ele não vai ser preso". Eu pergunto: "por quê"? A resposta: "porque ele é muito poderoso". Então, isso dói por dentro", desabafa João Gomide, pai de Sandra.
Hoje, Pimenta Neves vive isolado e sozinho, numa casa em São Paulo. Os advogados dele conseguiram adiar por tempo indeterminado o julgamento, que estava marcado para o dia 3 de maio.
"Para mim, a Justiça não presta nesse país. A Justiça é boa nesse país sabe para quem? Para quem tem dinheiro", acusa João Gomide.
O Fantástico tentou conversar com Pimenta Neves, mas ele se recusou a receber a equipe de reportagem.
Suzane Richthofen deve ser julgada depois dos irmãos Cravinhos, que também estão presos. Se for condenada, a pena prevista é de até 60 anos de prisão. O julgamento dos três jovens é um dos mais aguardados do país. Depois de nove meses em liberdade, Suzane passou o Domingo de Páscoa na cadeia.