Editorial: Causas e sintomas

terça-feira, 12 de julho de 2005 às 07:13

Brasília, 12/07/2005 – O editorial “Causas e sintomas” foi publicado na edição de hoje (12) do jornal Folha de S. Paulo:

“Não resta dúvida de que a culpa pelo péssimo nível de formação de bacharéis, especialmente em direito e medicina, deve ser atribuída a sucessivos governos. No plano mais imediato, autoridades educacionais permitiram a proliferação de escolas de nível superior sem atentar como deveriam para a qualidade do ensino ministrado. Mas, na realidade, nunca se investiu seriamente num ensino médio público universal e de bom nível.

O resultado, como não poderia deixar de ser, beira o catastrófico. O último exame de habilitação aplicado pela seccional paulista da Ordem dos Advogados do Brasil apresentou um índice de reprovação de incríveis 93%. Para médicos, não existe uma prova como a da OAB, mas é consenso entre os profissionais da área que a formação deixa muito a desejar.

Debate realizado pela Folha sobre a qualidade do ensino e a realização de exames de habilitação dividiu especialistas. Como mostrou reportagem publicada ontem, três dos quatro debatedores apóiam a aplicação da prova. Apenas o diretor da Faculdade de Medicina da USP, Giovanni Cerri, se disse contrário.

Ele parece correto tanto ao afirmar que o exame trata de um sintoma e não da causa como ao sustentar que a utilização desse expediente pode levar a uma situação de acomodação, na qual se deixaria de pressionar as autoridades educacionais para restringir a abertura de novos cursos. O risco é real. Mas não é porque sintomas não se confundem com causas que se deve deixar de tratá-los. Se um paciente de câncer tem febre, deve tomar um antitérmico.

A exigência de exame é antes de tudo uma defesa da população. Um advogado incompetente representa ameaça à liberdade e ao patrimônio do cidadão que o contrata. No caso do médico, o que está em jogo pode ser a própria vida do paciente.

Deve-se, portanto, insistir na adoção da prova de habilitação para médicos, sem prejuízo de combater também as causas da má formação”.