Juizado Especial Federal de SC garante presença de advogado
Brasília,26/08/2004 - O presidente da Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil de Santa Catarina, Adriano Zanotto, aplaudiu hoje o resultado emitido pela Turma Recursal dos Juizados Especiais Federais do Estado que, em sessão realizada recentemente, anulou um processo em que a parte autora foi representada em juízo por um contador. Segundo o voto do relator, juiz federal João Batista Lazzari, acompanhado pelos outros dois integrantes da Turma, embora a lei dos juizados permita que o autor ajuíze a ação pessoalmente ou por representante, "essa representação deve ter limites para que não haja colisão com o disposto no art. 133 da Constituição Federal, segundo a qual o advogado é indispensável à administração da Justiça".
Segundo Zanotto, a não-obrigatoriedade da presença do advogado nos Juizados Especiais Estaduais e Federais, além de um flagrante desrespeito às partes, que necessitam de um profissional habilitado para não terem seus direitos violados, é uma verdadeira afronta às garantias constitucionais inerentes aos cidadãos brasileiros. “A Constituição da República, em seu artigo 5º, inciso LV - que versa sobre os direitos e garantias fundamentais dos cidadãos - assegurou à população o acesso irrestrito ao Poder Judiciário, garantindo que aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a eles inerentes". frisou.
O dispositivo, entretanto, só tem sua eficácia garantida se, na defesa dos interesses dos cidadãos, seja nos processos judiciais, seja nos administrativos, esteja atuando um profissional com conhecimento específico e plenamente habilitado para tanto. Esse profissional é o advogado. Diante disso, é indiscutível que não pode haver sequer uma lide sem a presença do advogado para defender os interesses das partes, sob pena de as garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa não serem amplamente asseguradas, acentuou o presidente da Seccional.
Adriano Zanotto lembrou que o Conselho Federal da OAB também já propôs Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) para mudar os dispositivos das leis 9.099/95 e 10.259/01, que afrontam diretamente o artigo 133 da Constituição da República, visando fazer cessar o desrespeito com que têm sido tratados os jurisdicionados do nosso país, uma vez que a representação por outros profissionais que não os advogados viola a Constituição Federal e se caracteriza como exercício ilegal da profissão. Por sua vez, a OAB de Santa Catarina elaborou minuta de projeto de lei, encaminhado em agosto do ano passado ao deputado federal catarinense Cláudio Vignatti, que torna obrigatória a presença de advogado nos juizados especiais.
Íntegra do voto do relator:
"Trata-se de ação previdenciária em que o Autor postula: a) o reconhecimento do labor rural nos períodos de 11.07.1968 a 30.11.1978 e de 01.06.1982 a 30.10.1983; b) o reconhecimento da atividade exercida em condições especiais nos períodos de 01.12.1989 a 30.12.1994, com direito à conversão para tempo comum; c) a averbação do labor urbano nos períodos de 02.01.1995 a 31.01.1999 e de 01.03.1999 a 31.07.1999; d) a concessão de aposentadoria por tempo de serviço/ contribuição; e) a condenação do INSS ao pagamento das parcelas em atraso.
O Magistrado a quo julgou o pedido parcialmente procedente, para: a) reconhecer o tempo de atividade rural nos períodos de 11.07.1968 a 10.07.1970 e de 01.01.1977 a 30.11.1978; b) reconhecer o labor urbano nos períodos de 02.01.1995 a 31.01.1999 e de 01.03.1999 a 31.07.1999; c) reconhecer a especialidade da atividade exercida de 01.12.1989 a 30.12.1994; d) condenar o INSS a conceder a aposentadoria por tempo de serviço proporcional; e) condenar o INSS a pagar das parcelas em atraso. O INSS interpôs recurso inominado. O autor apresentou contra-razões. VOTO Da análise da inicial observo que o autor foi representado pelo contador XX , com endereço profissional em XX (SC), ao qual foi outorgado mandato procuratório nos seguintes termos (fl. 11): "PODERES: Poderes para representá-lo no foro em geral, podendo transigir, firmar compromissos e acordos, dar e receber quitação, especialmente para propor ação previdenciária contra o INSS, no Juizado Especial Federal Previdenciário, podendo interpor recursos, praticar enfim, todos os atos inerentes ao bom desempenho do presente mandato, não podendo o outorgado, em hipótese alguma, atuar em nome do outorgante, em outros processos judiciais ou administrativos que não digam respeito a ação supra mencionada, enfim praticar todos os demais atos necessários ao fiel e cabal cumprimento do presente mandato, o que tudo dará por bom, firma e valioso". O artigo 10, caput, da lei nº 10.259/2001 estabelece que: "As partes poderão designar, por escrito, representantes para a causa, advogado ou não". Norma similar encontra-se na lei nº 9.099/95, que prevê: "Art. 9º. Nas causas de valor até vinte salários mínimos, as partes comparecerão pessoalmente, podendo ser assistidas por advogado; nas de valor superior, a assistência é obrigatória". Referidas normas objetivam democratizar e simplificar o acesso ao judiciário, especialmente às pessoas desprovidas de recursos para contratar profissional habilitado a postular em juízo. Essa situação leva em consideração a precária assistência judiciária prestada aos cidadãos pelo Estado. Muito embora o texto legal que instituiu os JEFs faculte ao Autor ajuizar o seu pleito pessoalmente ou por representante, essa representação deve ter limites para que não haja colisão com o disposto no art. 133 da Constituição Federal, segundo a qual o advogado é indispensável à administração da justiça. Ou seja, a exceção à regra de que o advogado é essencial à administração da justiça, merece interpretação restritiva no sentido de tão-somente franquear-se ao Autor o ajuizamento da própria ação ou, ainda, por pessoa que o represente, nos casos de impossibilidade de locomoção ou de dificuldade de expor sua pretensão. O juiz federal Antônio F.S. do Amaral e Silva comenta esse dispositivo assinalando que: "Os representantes devem ser parentes ou pessoas conhecidas do autor(a), de sua confiança, que possam representá-lo na impossibilidade de comparecer na audiência." Dessa forma, a admissão da representação da parte autora por outros profissionais que não o advogado, tais como contadores ou despachantes, implica violação direta do art. 133 da Constituição Federal e ao art. 1º da Lei nº. 8.906/1994, caracterizando o exercício ilegal da profissão. Por sua vez, a representação em Juízo por profissionais não habilitados implica a nulidade dos atos processuais, a teor do que dispõe o art. 4º da Lei 8.906/94. Sendo assim, concluo que o processo deve ser anulado pelo fato de o Autor haver sido representado por Contador, desde o pedido inicial até o momento em que tomou ciência da interposição do Recurso Inominado pelo INSS, quando então constituiu advogado para apresentar contra-razões (fl. 126). Em face do exposto, voto no sentido de anular o processo e determinar o retorno dos autos ao Juizado de origem, a fim de que o autor seja intimado para ratificar os termos da petição inicial por intermédio de seu advogado, constituído à fl. 126, ou para que o próprio autor subscreva a petição inicial. Sala de Sessões da Turma Recursal. Florianópolis, 19 de agosto de 2004. João Batista Lazzari Juiz federal.