Artigo: "Ecos medievais"
Bauru (SP), 11/11/2009 - O artigo "Ecos medievais" foi publicado na edição de hoje (11) do Jornal da Cidade, de Bauru (SP) e é de autoria dorepórter Marcos Brogna, editor-chefe do jornal O Liberal, de Americana-SP.
"Na Idade Média, Joana D Arc foi queimada na fogueira da inquisição católica, na Europa, porque ousou ser líder numa época em que a mulher jamais poderia sair da condição de subserviente aos homens. No Oriente Médio, até hoje, mulheres são condenadas ao apedrejamento por crimes como adultério, enquanto homens podem não só ser adúlteros como ter mais de uma mulher, oficialmente . Isso sem contar a burca, roupa que, em pleno calor do deserto, esconde todo o corpo, inclusive a cabeça, exceto através uma rede no grosso tecido, à altura do rosto, para possibilitar um mínimo de respiração e visão.
São exemplos do machismo que sempre fez parte da história da humanidade, foi parcialmente vencido após o advento do Iluminismo em países que separaram o Estado dos dogmas religiosos e evoluíram nos direitos individuais, mas ainda é presente, até nas democracias ocidentais. Até no caloroso país do Carnaval, o Brasil, e bem ao lado da maior e mais moderna cidade da América Latina, São Paulo. Pior: dentro de uma universidade.
O caso da garota que quase acabou estuprada porque foi à aula com um vestido curto e chegou a ser expulsa porque a Uniban considerou que ela era a culpada por incitar os alunos é uma volta à era medieval. Os gritos de puta, puta, puta de uma multidão de estudantes que quase arrombou a porta da classe em que estava a menina para violentá-la acabou sendo, para a universidade, apenas um efeito natural diante da roupa que ela vestia. Uma versão acadêmica para o estupra, mas não mata de Paulo Maluf.
Ou seja, para a Uniban a violência está no tamanho da roupa, não na violência em si, escancarada no ato explícito dos jovens homens que a ofenderam e ameaçaram estuprá-la, barbaramente. Uma inversão de valores que escancara o machismo dentro de um lugar que tem a obrigação de ser do saber, do debate, dos valores humanos e da liberdade.
Nas palavras de Cezar Britto, presidente nacional da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), a expulsão da garota (agora revertida) chancela a barbárie e o preconceito . São duas expressões muito pertinentes: barbárie, o contrário de civilização; e preconceito, em antagonismo aos direitos de homens e mulheres à vida digna. Mas há algo ainda pior, que já presenciei: ouvir até mulheres repetindo coisas como ah, mas ela provocou!".