Britto destaca importância do Quinto na posse do primeiro juiz deficiente visual
Brasília, 18/09/2009 - O presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Cezar Britto, enalteceu a importância do mecanismo do Quinto Constitucional para o preenchimento de vagas de magistrados a partir de indicações feitas pela advocacia e o Ministério Público, destacando que, não fosse pelo quinto, não seria possível a posse do desembargador Ricardo Tadeu Marques da Fonseca - o primeiro magistrado portador de deficiência visual no Brasil.
Ao discursar na solenidade de posse de Fonseca no Tribunal Regional do Trabalho do Paraná, em Curitiba, Cezar Britto lembrou que Ricardo não conseguiu chegar à magistratura pela via do concurso público. "Não lhe foi dado este direito. Mesmo ingressando com medida judicial para assegurar-lhe a possibilidade de concluir a seleção para o TRT da 2ª Região, não obteve êxito em sua postulação", afirmou. No entanto, acrescentou Britto, ele percorreu o caminho mais longo e desenvolveu carreira brilhante no Ministério Público. "É mestre em Direito pela USP, doutor pela Universidade Federal do Paraná e ingressa, agora, no TRT como magistrado em vaga destinada ao quinto constitucional. Esta é mais uma prova da importância desse sistema da construção de um Judiciário plural".
Ainda segundo o presidente da OAB, a chegada do deficiente visual ao cargo de magistrado acaba por se reverter em verdadeira política de inclusão. "Não porque a escolha seja impregnada de simbolismo, mas porque corrige um grave erro ao garantir assento no Poder Judiciário a um profissional que está sendo reconhecido por seus méritos".
A seguir, a íntegra do discurso proferido pelo presidente nacional da OAB, Cezar Britto, na sessão de posse do desembargador Ricardo Tadeu Fonseca:
"Cada um de nós presentes nesta sala participa de um momento que, sem dúvida, vai ficar marcado na história da Justiça brasileira. Entre tantas solenidades das quais esta Casa já foi palco, ouso dizer que nenhuma teve um significado tão importante. È como se, finalmente, as portas do Poder Judiciário se abrissem para a diversidade que faz deste país uma nação única e rica. Um país diverso, que precisa encontrar principalmente na sua Justiça a capacidade de absorver todas as características de um povo que é formado por rostos das mais diferentes cores, culturas e origens. Só um Judiciário com a cara do Brasil será capaz de garantir a cidadania e encontrar o equilíbrio nas relações sociais.
Assistimos, hoje, à posse de um homem que é exemplo de competência, de vida, de superação e que, certamente, trará ao Tribunal a rica vivência de alguém que enfrentou todas as dificuldades e os desafios possíveis
É paradoxal a situação. Ricardo Tadeu Marques da Fonseca não entrou no Judiciário pela via do concurso público, não lhe foi dado este direito. Mesmo ingressando com medida judicial para assegurar-lhe a possibilidade de concluir a seleção para o TRT da 2ª Região, não obteve êxito em sua postulação.
Percorreu o caminho mais longo. Ingressou no Ministério Público, desenvolveu carreira brilhante. É mestre em Direito pela USP, Doutor pela Universidade Federal do Paraná e ingressa, agora, no Tribunal do Trabalho como magistrado em vaga destinada ao chamado quinto constitucional. Esta é mais uma prova da importância desse sistema da construção de um Judiciário plural.
O magistrado Ricardo Tadeu Marques da Fonseca rompeu, definitivamente, muitas das barreiras erguidas para isolar portadores de deficiências físicas em guetos excludentes. Cumprimento o Ministério Público por incluí-lo na lista sêxtupla; ao TRT por tê-lo incluído na tríplice; e ao Presidente da República por nomeá-lo.
Todos, no âmbito de suas atribuições, foram além do discurso e praticaram a verdadeira política de inclusão. Não porque a escolha seja impregnada de simbolismo, mas porque corrige um grave erro ao garantir assento no Poder Judiciário a um profissional que está sendo reconhecido por seus méritos.
Ganha a justiça e ainda mais a sociedade brasileira ao ver integrados, num tribunal, membros com diferentes históricos profissionais e pessoais. Porque ao aplicar a lei ao caso concreto, a experiência de vida, o equilíbrio e o bom senso são ferramentas indispensáveis. É natural que cada um identifique os problemas e suas soluções a partir da própria compreensão de mundo e das perspectivas individuais. Por esse motivo é tão importante que a diversidade da nossa sociedade esteja representada no Poder Judiciário.
Advocacia, Magistratura e Ministério Público compõem a estrutura da Justiça. A grandeza do quinto constitucional está exatamente em trazer para o Judiciário essas três visões de justiça e de direito. Como assinalou a Ministra do TST Maria Cristina Peduzzi: "A composição dos tribunais de forma ampla, com a participação de pessoas de destaque em outras carreira da organização judiciária, apenas confirma o já positivado na Constituição de 1988, no sentido da indispensabilidade dos advogados e do Ministério Público à organização da justiça (...) O que se deve ter em foco, em verdade, é a busca da formação de um Poder Judiciário capaz de viabilizar a reciclagem de idéias e experiências, objetivo que passa necessariamente, pelo sistema de composição dos tribunais. A qualidade da prestação jurisdicional, a par de comunicar com a compreensão das relações sociais formadoras da coletividade, bem como das possibilidades e limites do direito."
O embate de idéias, o antagonismo, o choque cultural são salutares à justiça. Ela não pode se fechar. É um dos Poderes da República e, como tal, deve ser permeável aos anseios do povo, pois o poder dele emana e em seu nome será exercido, conforme preconiza artigo 1º da nossa Carta Política.
Ao cidadão comum interessa o acesso ao que Kazuo Watanabe denominou de uma Ordem Judiciária Justa.
"Sentenças, decisões, comandos e remédios ditos heróicos concedidos por juízes e tribunais não passariam de puras balelas, não fora pelo resultado prático que sejam capazes de produzir na vida das pessoas e nas efetivas relações com outras e com os bens da vida".
Faço uso desta observação de Candido Dinamarco para dizer que a sociedade brasileira está, hoje, dando um passo histórico no sentido de aproximar a Justiça do povo, de, como diz Saramago, torná-la justiça pedestre, uma justiça companheira quotidiana dos homens, uma justiça para quem o justo serio o mais exato e rigoroso sinônimo de ético. Uma justiça que chegasse a ser tão indispensável à felicidade do espírito como indispensável à vida e ao alimento ao corpo."