Em Xinguara, preso fica na cadeia mesmo após ter sido absolvido
Belém (PA), 14/04/2008 - Em Xinguara, no sul do Pará, há um único juiz para duas varas lotadas de processos, faltam servidores no Fórum e na cadeia um preso, absolvido, ficou 100 dias atrás das grades mesmo depois da decisão que mandava soltá-lo. Em novembro do ano passado, quando a situação já era crítica, uma comissão de representantes de moradores esteve em Belém reunida com a presidente do Tribunal de Justiça do Estado, desembargadora Albanira Lobato Bemerguy. Ela recebeu a "Carta de Xinguara", documento que a informava da situação caótica e continha todas as reivindicações da comunidade local.
A reunião no Tribunal de Justiça foi considerada um sucesso pelos líderes do município, visto que a presidente demonstrou sensibilidade com os problemas e assumiu compromissos com a comarca, alguns dos quais já cumpridos no final de 2007. Mas, em alguns aspectos, a situação ficou até pior do que já estava. Agora, entidades de empregados e patrões, igrejas católica e evangélica, sindicatos de fazendeiros e trabalhadores rurais, Ordem dos Advogados do Brasil e Comissão Pastoral da Terra (CPT) voltam a reclamar maior atenção das autoridades judiciárias.
Em nota enviada a O Liberal, oito entidades do município narram fatos que consideram absurdos sobre o funcionamento da Justiça em Xinguara. O primeiro deles se refere ao caso de Claudinei Fernandes dos Reis, que respondia a um processo criminal preso. No dia 27 de novembro do ano passado, Claudinei foi julgado e absolvido pela juíza da comarca, Heloisa Helena da Silva Gato. Deveria ter sido libertado no mesmo dia, para que a lei fosse cumprida. Mas não foi. O rapaz permaneceu na cadeia por mais três meses e só foi solto no dia 5 de marco deste ano. Um constrangimento ilegal praticado pelo próprio Poder Judiciário.
Promessa
Isto ocorreu, segundo as entidades, devido ao "funcionamento ineficiente do serviço judiciário da comarca". Ou seja, feriu-se um principio constitucional da mais alta importância, que é o direito à liberdade. "Esse verdadeiro escândalo é apenas um exemplo do mau funcionamento da Justiça em Xinguara", observa a nota. O documento também chama a atenção para um dos compromissos mais importantes assumidos pela desembargadora Albanira Bemerguy durante a audiência com líderes de Xinguara, em novembro do ano passado, que foi a lotação na comarca de, pelo menos, mais três servidores concursados e treinados para assumirem os trabalhos da 2ª Vara. Esse compromisso, até agora, não foi cumprido pela presidente.
"Por conta disso, a situação na comarca ficou ainda mais grave, especialmente com a remoção da juíza Heloisa Helena da Silva Gato, pois agora são duas Varas funcionando com um único juiz e sem servidores qualificados", critica a nota, acrescentando que o resultado "é uma prestação jurisdicional ainda mais deficiente do que o quadro descrito na "Carta de Xinguara" em 2007.
Segundo as entidades, os funcionários do município cedidos para o trabalho forense - cuja cedência encontra-se desacobertada de instrumento adequado para tal - não têm qualificação para o serviço judiciário. Eles estão sobrecarregados de trabalho, vivendo sob pressão por causa das exigências do serviço, além de sofrer inclusive transtornos psicológicos quase insuportáveis, a ponto de abandonar o posto de trabalho, "em função das péssimas condições oferecidas pelo TJE".
Na segunda-feira passada, os reclamantes enviaram uma nova carta à presidente do TJE, cobrando o compromisso por ela assumido em novembro de 2007. "Queremos o quanto antes mais três servidores devidamente qualificados para melhorar a prestação jurisdicional, bem como a determinação de juízes titulares para assumirem apenas as duas Varas existentes na comarca de Xinguara, sem qualquer cumulação de outras comarcas". (O Liberal).