OAB: EUA estão bem informados sobre tráfico no Brasil

sexta-feira, 24 de agosto de 2007 às 08:10

Washington (EUA), 24/08/2007 – O presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Cezar Britto, fez hoje (24) um balanço positivo da reunião com dirigentes de diferentes áreas do Departamento de Estado do governo norte-americano, com quem discutiu, em Washington, a questão do tráfico de mulheres, homens e crianças no Brasil. Segundo Britto, o Departamento de Estado dos EUA está bem informado quanto às estatísticas brasileiras relacionadas ao tráfico de mulheres para fins sexuais e do número de homens que são forçados a trabalhar como escravos, principalmente na agricultura.

As estatísticas constam do relatório ‘Tráfico de Pessoas’, elaborado pelo Departamento de Estado do governo dos EUA e entregue ao presidente nacional da OAB. Entre os dados que dele constam, está o de que, no Brasil, existem hoje 500 mil crianças e mulheres brasileiras na prostituição. Quando são forçadas a deixar o Brasil para se prostituir, seus destinos mais freqüentes são, conforme o estudo, países da América Latina, Caribe, Europa e os Estados Unidos.

Entre os homens a realidade do tráfico também existe, mas o foco é na mão-de-obra escrava para a agricultura, principalmente nos Estados do Pará e Mato Grosso. O relatório do governo norte-americano foi elaborado com dados a partir de estudos de instituições brasileiras, como a Universidade de Brasília, citada na publicação.

Em todo o estudo, no entanto, são feitos elogios a programas que o governo brasileiro tem deflagrado a fim de minimizar este problema. A publicação cita, por exemplo, o plano de ação contra o tráfico e as formas de exploração, desenvolvido pela Secretaria de Justiça brasileira. Tais dados, segundo acrescentou Cezar Britto, provocarão uma modificação no rumo da política internacional da OAB e devem trazer um novo direcionamento aos trabalhos da Comissão Nacional de Direitos Humanos da entidade.

Para Britto, entre as alternativas para acabar de vez com esse tipo de crime no Brasil está a de elaborar ações conjuntas para punir países e instituições que praticam ou são coniventes com tais crimes. É preciso melhorar a legislação brasileira no que se refere à equiparação entre o tráfico de drogas e o de pessoas humanas, inclusive com o confisco de bens neste último caso’, afirmou Britto, lembrando que, hoje, a legislação do Brasil só permite o confisco dos bens em caso de condenações por tráfico de drogas. ‘No entanto, essa sanção não é estendida àqueles que se envolvem ou praticam o tráfico de pessoas’.

A seguir, a integra da entrevista feita com o presidente nacional da OAB, Cezar Britto, sobre a reunião com dirigentes do Departamento de Estado do governo norte-americano:

P – Qual o balanço da segunda etapa do programa de visitas aos Estados Unidos, durante a qual o senhor esteve reunido com vários dirigentes do Departamento de Estado do governo norte-americano?
R – O resultado foi extremamente positivo e certamente provocara uma modificação no rumo da política internacional da OAB, criando-se, ainda, um novo foco de trabalho para a nossa Comissão Nacional de Direitos Humanos.

P – Quais os principais temas que foram discutidos?
R – O combate ao crime organizado, ao trafico de entorpecentes e ao trafico de pessoas humanas. Essas indústrias que sobrevivem do crime movimentam bilhões de dólares e estruturas complexas e transnacionais. Combatê-las exige, também, organização, interelacionamento entre os diversos países e uma maior solidariedade por parte da sociedade. Com os Estados Unidos, podemos fazer mais parcerias e efetivar troca de experiências, a exemplo da elaboração do que se denomina ‘listas sujas’, isto é, listas que contenham o nome de países e instituições que se recusam a adotar medidas de combate a tais crimes.

P – Que outras medidas o senhor entende que poderiam ser implementadas?
R – Punir países e instituições que praticam ou são coniventes com tais crimes. E preciso melhorar a legislação brasileira no que se refere a equiparação entre o tráfico de drogas e o de pessoas humanas, inclusive com o confisco de bens neste ultimo caso. Digo melhorar porque, hoje, a legislação brasileira permite o confisco dos bens daqueles que são condenados por tráfico de drogas. No entanto, essa sanção não é estendida aqueles que se envolvem ou praticam o tráfico de pessoas.

P – O relatório sobre o trafico de pessoas humanas entregue ao senhor pelo Departamento de Estado norte-americano mostra que 500 mil crianças e mulheres brasileiras estão na prostituição, sendo que seus destinos mais freqüentes são América Latina, Caribe, Europa e os Estados Unidos. O senhor enxerga a possibilidade de ações integradas entre países para inibir essa realidade?
R – Não tenho duvida que esta é a única forma de inibir essa cruel realidade. É preciso atacar as duas fontes que mantem o tráfico ativo: a fonte receptora e a doadora. Aliás, o Brasil e também receptor de tráfico de pessoa humana, especialmente dos países que integram a chamada ‘fronteira-seca’. Sem integração efetiva, o combate está fragilizado, razão porque a Comissão de Relações Internacionais da OAB não economizará esforços no sentido de buscar esta harmonização de ações.

P – Esse mesmo relatório indica que cerca de 25 mil homens também estão sendo vitimas do tráfico, só que destinado ao trabalho forçado na agricultura, principalmente em áreas da Amazônia e Mato Grosso. O que a OAB acha dessa estatística?
R – Realmente esses Estados ainda são receptores de trabalho escravo, ainda mais quando a clandestinidade e motivada pela devastação da floresta amazônica. Portanto, são dois crimes que se quer esconder. Duas medidas adotadas pelo governo brasileiro foram elogiadas nas reuniões de hoje porque contribuem para a redução dessa triste estatística. A primeira e o veto que foi dado a chamada Emenda 3, que pretendia dificultar a ação dos fiscais do trabalho quando se deparavam com denuncias de relação contratual irregular. A outra é a recente decisão do Supremo Tribunal Federal, quando reconheceu a competência da Justiça Federal para julgar crimes que envolvem o trabalho escravo.

P – Outro dado importante e o de que o turismo sexual existe em 398 dos 1.514 destinos de turismo ao longo da costa brasileira nordestina, conforme afirma o documento. O que fazer para driblar essa realidade?
R – Primeiro, reconhecer que exploração sexual não se confunde com exploração econômica. Exploração sexual e crime e é assim que deve ser entendido. Encarar o turismo sexual como atividade econômica a ser estimulada, inclusive em propagandas que expõem a nudez da mulher brasileira, e uma pratica que deve ser proibida. A adoção de medidas sociais que amparem as vitimas e seus familiares e outra política que se faz urgente no Brasil, pois parte desse turismo tem na miséria e desesperança de milhares de brasileiros o seu maior motivador.