Britto: pulseira eletrônica é Big Brother e não ressocializa preso

quarta-feira, 28 de março de 2007 às 07:15

Brasília, 28/03/2007 – O presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil, Cezar Britto, criticou hoje duramente a proposta de monitoramento eletrônico de presos - principalmente aqueles em regime aberto ou de liberdade condicional - que está em estudos no Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária. “Hoje é uma pulseira eletrônica, amanhã um chip, depois se estende para as crianças, para os adolescentes e, por fim, passaremos a viver num lugar Big Brother, com todo mundo sendo vigiado pelo Grande Irmão onipotente e onipresente”, sustentou Cezar Britto, durante entrevista. Para ele, o sistema da pulseira eletrônica em estudo, ao representar um agravamento além da pena, atenta também contra a ressocialização que se deve buscar para todos os presos, visando sua reintegração à sociedade.

O presidente nacional da OAB avalia que a proposta dificilmente passaria pelo crivo do Congresso Nacional, “que vai ponderar melhor e deve até evitar que seja criado esse precedente”. Na opinião dele, o monitoramento eletrônico – sistema que funciona por meio de um transmissor adaptado em uma pulseira ou tornozeleira eletrônica, enviando para um banco de dados a localização do apenado fora do presídio – fere também os princípios da intimidade e da privacidade. Cezar Britto afirmou ainda que o monitoramento eletrônico de presos contraria também o direito constitucional de ir e vir das pessoas, mesmo que sejam condenados cumprindo pena em regime aberto ou em liberdade condicional.

A seguir, a íntegra da entrevista do presidente nacional da OAB sobre a proposta do monitoramento eletrônico de presos:

P - Como senhor vê a proposta de monitoramento eletrônico dos condenados no Brasil?
R – Com bastante preocupação. Primeiro porque está-se a discutir, com esse mecanismo, os princípios da intimidade e da privacidade. Parece que eles ficam quebrados quando se dá um tratamento diferenciado para essas pessoas condenadas. E quebra outro princípio, o da isonomia, porque o cidadão tem e ir vir que as pessoas têm ao ficar livre livre, mesmo cumprindo sua pena, mesmo que condicional, mas um direito que têm da mesma forma que os demais cidadãos. E mais uma questão: no sistema prisional brasileiro, a reeducação é importante. Você não pode reeducar com diferença. Se você está monitorado, sem poder ir para qualquer lugar; se você tem demonstrações externas de que você tem a marca da prisão, você está descumprindo essa função importante do sistema prisional brasileiro que é a reeducação.

P – Nos EUA, já utilizam esse sistema, inclusive há dois brasileiros presos nos quais isso está sendo utilizado. Como o senhor vê essa questão na comparação do quadro de lá com o Brasil?
R – Os EUA não são exemplos para o mundo. Eles estão legitimando a tortura, estão dizendo que os presos não têm direito de acesso aos advogados. Pode-se prender o tempo todo, sem comunicar a ninguém. Então, os EUA não podem servir de paradigma para os direitos humanos.

P – Há números que mostram que muitos presos que gozam do direito de indulto ou liberdade vigiada, fogem e não voltam mais para as prisões. Qual seria a saída, então, para esse problema?
R – Tem que haver uma fiscalização maior, um controle maior pela polícia, com o Judiciário executando melhor a pena, ou liberando os presos nos casos que ele julgar mais seguros, menos graves. A solução não é agravar as penas com medidas como o monitoramento eletrônico. Se queremos ressocializar o preso, não podemos pensar em punir cada vez mais, tornar cada vez mais dificultoso que o cidadão apenado seja depois recebido na sociedade.

P - Essa é uma questão que precisaria passar pelo Congresso, na opinião da OAB?
R - Acho que o Congresso vai ponderar melhor e deve até evitar que seja criado esse precedente. Hoje é uma pulseira eletrônica, amanhã um chip, depois se estende para as crianças, para os adolescentes e, por fim, passaremos a viver num lugar Big Brother, com todo mundo sendo vigiado pelo Grande Irmão.