Editorial: Mudanças penais

quarta-feira, 21 de fevereiro de 2007 às 09:03

Rio de Janeiro, 21/02/2007 – O editorial “Mudanças Penais” foi publicado na edição de hoje (21) do Jornal do Commercio (RJ):

“A aprovação, na Câmara e no Senado, de projetos classificando como agravantes da pena o aliciamento de menores para a prática de ações criminosas, reflete o empenho do Congresso no exame e votação de propostas, algumas das quais já antes em tramitação, contendo modificações de dispositivos do Código Penal e do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), após a morte recente, no Rio, em circunstâncias cruéis e que abalaram o País, do menino João Hélio Fernandes, durante roubo de veículo dirigido por sua mãe.

Se por um lado a apreciação de tais propostas ocorre em clima que ainda se caracteriza como de comoção pública - suscitando por isso mesmo algumas restrições por parte de eminentes juristas - por outro é compreensível que os congressistas não queiram parecer omissos diante não só das repercussões desse crime como, de um modo geral, em face das cobranças da sociedade brasileira em relação ao fortalecimento dos instrumentos de defesa contra a espiral da criminalidade, atualmente a assumir, como assume, dimensões e características inquietantes.

Enquanto isso, está em análise na Comissão de Constituição e Justiça do Senado Proposta de Emenda Constitucional (PEC) antecipando a maioridade penal de 18 para 16 anos de idade, em caso de crime hediondo, tortura e tráfico de drogas. Trata-se de matéria obviamente polêmica, do ponto de vista doutrinário, apesar das razões invocadas para justificar a referida proposta.

De todo modo o debate se amplia e as sugestões se sucedem a diferentes níveis, concentrando-se justamente no Congresso Nacional as expectativas em torno de alterações normativas que logrem sustar e reverter de alguma forma as estatísticas de delitos contra a pessoa e contra o patrimônio, na escala em que ora se apresentam.

A propósito, aliás, da superposição de projetos de conteúdo assemelhado, no Senado e na Câmara, disse o presidente desta, Arlindo Chinaglia (PT-SP), vê-la sob um ângulo otimista, na medida em que está a mostrar que em ambas as Casas do Congresso existem parlamentares preocupados com o tema e apresentando propostas. Registra-se, por outro lado, no tocante ao agravamento da pena para crimes em que haja aliciamento de menores, que embora tenham objetivos semelhantes os projetos aprovados modificam leis diferentes, ou seja, o Código Penal e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).

As alterações produzidas estão sendo feitas sem ouvir os juízes, comentou, por sua vez, o juiz Guaraci Vianna, titular da 2ª Vara da Infância e Adolescência do Rio, enquanto o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Cezar Britto, declarava: Aumentar a pena não resolve o problema de combate à violência, mas é a posição mais cômoda achar que o problema da violência é a lei penal. O problema é a ausência do Estado, é preciso refundar o Estado brasileiro.

Já o primeiro secretário da mesa diretora da Câmara, deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR), informa haver na Casa 23 propostas de emenda constitucional atinentes à questão da maioridade penal, advertindo-se ainda, como o fazem especialistas na matéria, para implicações potenciais de algumas mudanças propostas, quanto ao agravamento do problema da superpopulação carcerária. O País tem hoje 300 mil presos e, no entender desses especialistas, é preciso investir no sistema prisional, sob pena de exacerbação das disfunções nele existentes, sem perder de vista, em relação aos menores internados em decorrência de condutas delituosas, e aos apenados, de acordo com o perfil comportamental de cada um, a perspectiva da ressocialização.

Importa que a prudência nas modificações em curso coexista, entretanto, com a busca de soluções condizentes com o que a realidade nacional a esse respeito reclama, em um contexto no qual o combate eficaz à criminalidade confunde-se, em boa medida, com a manutenção da própria paz social.”