Artigo: Honorários de sucumbência
Brasília, 26/10/2006 - O artigo " Honorários de Sucumbência" é de autoria do presidente em exercício do Conselho Federal da OAB, Aristoteles Atheniense:
"O jornal “O Estado de S. Paulo”, em sua edição de 21 do corrente, além de afirmar que o Supremo Tribunal Federal tem favorecido “as pretensões corporativas da OAB”, assumiu a defesa dos interesses empresariais, ocupando-se de tema em que demonstrou estar mal informado.
Segundo a notícia, “no caso da destinação dos honorários de sucumbência, a pretensão da OAB de assegurar ao advogado empregado o direito de ficar com eles é absurdo. Como diz a CNI, se as empresas já pagam salários desses profissionais e arcam com os custos e riscos das ações judiciais, por que motivo não podem ficar com o valor da sucumbência?”
Não é preciso muito esforço ou conhecimento jurídico para satisfazer a indagação da Confederação Nacional das Indústrias.
A resposta foi dada pelo ministro Cláudio Santos, do STJ, ao afirmar que “O direito autônomo do advogado à verba honorária de sucumbência, sem sobra de dúvida, é Direito Material, de natureza creditícia. Não se cuida de direito processual”.
Como sucede no Direito italiano, trata-se de “direito de crédito originário em que o advogado adquire a qualidade de parte” (“Advogado credor de honorários em sentença”, Revista Teia Jurídica – www.teiajuridica.com).
Ora, a prevalecer o entendimento daquela entidade patronal, caso a empresa saia vencedora na causa não estaria sendo simplesmente indenizada do que despendeu na demanda, mas lucrando com o excedente que o vencido foi condenado a lhe pagar.
Portanto, o fato de já ter pago salário ao advogado não é motivo suficiente para que o empregador se aproprie dos honorários arbitrados na sentença.
Ainda quanto ao argumento de que o advogado empregado já é pago para defender os interesses do patrão, também não favorece a tese contestadora.
Como bem assinalou o jurista Sérgio Ferraz: “É repulsivo ao Direito tal assertiva, exatamente porque, se admitida, estaria sendo sufragada como legítima a hipótese de alguém explorar os serviços profissionais de um advogado ou até de um consórcio de advogados, pagando-lhes certo salário e auferindo vantagens com os honorários fixados por sentença, segundo o Código de Processo Civil” (“Honorários de sucumbência e advogado empregado”, RT 633/240).
Examinada a questão sob o prisma defendido naquela matéria jornalística, ou seja, que devido à finalidade compensatória dos honorários estes pertenceriam à parte vencedora, ela conflitaria com a própria natureza comutativa do contrato de trabalho.
Foi o que demonstrou Jayme Soares da Rocha, em precioso artigo de doutrina, lembrando que “o pacto laboral é oneroso, resultando para o empregado a obrigação de pagar a remuneração ao empregado. Se o empregador for compensado do que paga ao advogado empregado, o contrato de trabalho se descaracterizaria, entrando, assim, na espécie dos negócios gratuitos”.
Não convence, igualmente, a exegese sustentada com amparo, apenas, no art. 20 do CPC.
Aquela norma processual somente pode ser dirigida aos litigantes, ou seja, ao autor e ao réu.
O juiz compõe o direito das partes. Assim, é óbvio que a lei adjetiva não poderia mandar que o vencido pagasse os honorários do advogado do vencedor, se este não figura na relação processual.
A interpretação desse dispositivo, nascido de uma hermenêutica mais abrangente e avançada, é de que o pagamento é feito à parte vencedora, embora o seu destinatário mediato seja o advogado.
A falta dessa declaração expressa, entretanto, não pode levar à conclusão de que a verba honorária é para reparação da parte vencedora, pelo que despendeu com o seu patrono. Pois, neste caso, seria de se exigir, também, que a lei dispusesse textualmente que o vencido indenizará ao vencedor o quanto pagou ao seu advogado (“Honorários de sucumbência: pertencem à parte vencedora ou ao seu advogado?” - RT 633/236).
Cabe lembrar, que, antes mesmo do advento da Lei 8906/94 (EOAB), o Tribunal Regional Federal da Primeira Região já proclamara a legitimidade do advogado para recorrer em seu próprio nome da decisão que homologa o cálculo de seus honorários (AI 90.01.02668-0/MG, rel. Juiz Tourinho Neto, DJ 10.12.90, p. 29861).
O critério perfilhado pela CNI reproduz o que foi sustentado pelo então presidente José Sarney nas razões do veto ao Projeto de Lei 161/85, que dispunha sobre o salário mínimo do advogado, em cujas razões ficou consignado: “A condenação ao pagamento visa ressarcir a parte das despesas que teve de realizar para ver reconhecido o seu direito. Tem natureza compensatória, indenizatória”.
O equívoco cometido pelo autor do veto é desculpável por não se tratar de pessoa que esteja atualizada com o direito processual ou trabalhista.
Ao contrário do que doutrina e jurisprudência têm sustentado, na atualidade: “Honorários de sucumbência, incluindo os vindos por qualquer forma de sentença, constitui crédito e direito originário do advogado, do Poder Público ou da empresa, valendo como hipótese de expropriação, sem justa causa, qualquer lei ou ato que determine em contrário” (Luiz Ricardo Gomes Aranha, cit. RT 633/241).
Qualquer outra consideração destinada ao reconhecimento do direito à sucumbência, pelo advogado contratado ou assalariado, torna-se ociosa, tal a autoridade dos precedentes coletados nesta resposta".