Busato: movimentos contra impeachment ignoram seu passado

terça-feira, 25 de abril de 2006 às 03:33

Cidade do Panamá, 25/04/2006 - O presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil, Roberto Busato, criticou hoje (25) duramente “o radicalismo inconseqüente de movimentos tidos como sociais, mas que estão derivando de sua posição”. As críticas de Busato foram uma resposta ao presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), João Felício, que em entrevista ao blog de Josias de Souza, na Folha Online, classificou a OAB de “neoliberal” e “tresloucada” por estar discutindo no seu Conselho Federal uma proposta de impeachment do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Felício disse ao blog que a CUT, o MST e a UNE preparam uma estratégia de reação ao impeachment. Para Busato, esse radicalismo pode levar o País a uma indesejável divisão.

“A Ordem continua do mesmo lado em relação à sociedade brasileira, na sua luta a favor da ética, da moral e, infelizmente, vê hoje movimentos sociais que sempre foram abrigados por ela tachá-la de tresloucada, de neoliberal, o que é um atentado a tudo que a entidade construiu a favor da República”, afirmou Busato em entrevista. Ele reafirmou a decisão do Conselho Federal da OAB de examinar a proposta de impeachment no próximo dia 08, “sem qualquer interesse político-partidário” - como ele declarou ao próprio presidente Lula em audiência na terça-feira passada (18). O presidente nacional da OAB disse ainda que CUT, MST e UNE estão isoladas e lamentou que essas entidades “se esqueceram de seu passado, de suas parcerias históricas e do abrigo que a Ordem sempre lhes deu na bandeira em prol de seus movimentos”.

A seguir, a íntegra da entrevista concedida hoje pelo presidente nacional da OAB, Roberto Busato, que participa na Cidade do Panamá de encontro da União Ibero-Americana de Colégio de Advogados (UIBA):

P - A CUT, o MST e a UNE preparam reação caso haja um pedido de impeachment do presidente Lula pela OAB. Como a entidade encara esse posicionamento dos movimentos sociais?
R - A Ordem lamenta profundamente essa reação radical, que não constrói nada neste momento; muito pelo contrário, coloca mais fervura dentro desse caldeirão que é a crise política brasileira. A Ordem dos Advogados não é nenhuma neoliberal, ela não é essa entidade tresloucada que leve a população a uma crise intransponível. Muito pelo contrário. É preciso que os movimentos mais modernos como a CUT, o MST, que não têm tanta história como a Ordem, olhem para trás e vejam a história da Ordem. Ela passa pela história do Brasil. A Ordem não construiu a sua história sendo neoliberal, ou sendo uma entidade absolutamente de esquerda. No tempo dos militares - para lembrar a este pessoal da CUT e do MST, que não existiam naquele momento -, a Ordem foi tachada de subversiva, de entidade de esquerda, e mesmo assim ela fez a defesa de todos aqueles que estavam na trincheira da oposição do regime discricionário. Agora, mais uma vez, a Ordem, sem qualquer facção política, esteve junto do presidente da República, explicando sua posição, e não pode ser tachada de uma entidade que leve o País a uma situação de divisão. Divisão é esse radicalismo inconseqüente de movimentos tidos como sociais mas que estão derivando de sua posição. A Ordem continua do mesmo lado em relação à sociedade brasileira, na sua luta a favor da ética, da moral e, infelizmente, vê hoje os movimentos sociais que sempre foram abrigados por ela tachá-la, por meio de seus dirigentes, de tresloucada, de neoliberal, o que é um atentado a tudo que a Ordem dos Advogados do Brasil construiu a favor da República.

P - A Ordem dos Advogados do Brasil vai entrar com pedido de impeachment contra o presidente da República?
R - A OAB vai discutir no dia 8 de maio este assunto, sem qualquer intenção político-partidária. Eu disse isso ao presidente da República, claramente, e foi entendido pelo presidente da República, nesse ponto. O ministro das Relações Institucionais, Tarso Genro, em declarações públicas, também entendeu a posição da Ordem. Eu disse ao presidente da República que, em relação a essa questão, ele poderia ter uma certeza: a entidade não transformará esse processo num palanque eleitoral, seja a favor dele, seja a favor da oposição. Nós não podemos aceitar qualquer tipo de patrulhamento, seja ele dos radicais, de que lado for, de que situação for. Não vamos aceitar esse tipo de patrulhamento. E essas pessoas deveriam pensar em não dividir o País, em não jogar segmentos contra segmentos, nós temos que sair desta crise juntos, todos juntos, a bem do Brasil. Nós não podemos persistir nessa crise ética e moral que vem assolando o País há praticamente dois anos. Nós temos que dar fim a isso e talvez seja a maneira da Ordem contribuir para o país, examinando o impeachment e dizendo se é caso ou não é caso impeachment, para que se tente de uma vez por todas apaziguar a nação brasileira nesse ponto e para que tenhamos eleições que sejam absolutamente isentas, sem qualquer revanchismo de lado a lado.

P - Em governos passados, esses movimentos sociais procuravam a OAB para discutir as questões críticas do País. Agora, com a atual crise, considerada a mais grave da história do País, a CUT, MST ou UNE procuraram a Ordem em algum momento para discutir a crise?
R - Isso é o que mais lamentamos. Nós sempre fomos parceiros da CUT do MST e da UNE, como somos da ABI, da CNBB, da Unafisco e outras entidades. Nós não tivemos nenhum tipo de contato, não fomos procurados pela CUT, MST e UNE par civilizadamente discutirmos esse assunto. Apenas a CNBB, uma parceira que veio a manter interlocução com a Ordem a respeito da crise política. Já estivemos na própria CNBB discutindo este assunto. Por isso, lamentamos profundamente que CUT, MST e UNE esqueçam seu passado democrático, esqueçam as suas parcerias históricas, esqueçam o abrigo que a Ordem sempre lhes deu na sua bandeira em prol de seus movimentos. Neste ponto, achamos que foram de uma ingratidão muito grande com a Ordem dos Advogados ao falarem em entidade tresloucada, entidade neoliberal. É realmente uma ignorância da história e do passado das próprias instituições que esses líderes representam. Não sentam hoje conosco, mas sentam absolutamente isolados e tentam tachar a Ordem de entidade retrógrada. Nós respondemos a eles o que fizemos com o presidente da República. Fomos até o presidente e cara a cara dissemos a ele que estaríamos estudando esse assunto, tendo em vista que é hoje uma iniciativa absolutamente colocada dentro do Conselho e a entidade não pode virar as costas a ela. No meu discurso de posse, disse que não poderiam esperar de mim aulas acadêmicas, não poderiam esperar de mim nenhuma outra atitude que não fosse aquela de honrar as tradições da Ordem. E a Ordem honrou a sua tradição com ações, e não com omissões.

P - A OAB, que vai julgar no dia 8 um processo importante de impeachment ou não do presidente da República, recebe algum tipo de subvenção do Estado ou do governo?
R - Não. A Ordem não recebe nenhum dinheiro público, ela vive absolutamente por conta da anuidade do advogado. Todos os diretores da Ordem dos Advogados do Brasil, desde os mais humildes até o presidente nacional da entidade, não recebem absolutamente nada para exercer seu cargo. Não há verba de representação, não há jetom, não há cédula de presença, não há nada. Nós vivemos apenas do nosso voluntariado e não estamos absolutamente blindados com qualquer tipo de dinheiro público.