Congresso debate a contribuição do direito e da cooperação jurídica no enfrentamento da crise

quinta-feira, 30 de julho de 2020 às 09:00

A prestação do serviço público de saúde foi um dos temas de destaque do I Congresso Digital da OAB, nesta quinta-feira (30). Os debates sobre as repercussões jurídicas e sociais da pandemia contou com um painel para discutir a “Tutela da Saúde Pública e a Responsabilidade da Pessoa Jurídica: aspectos penais e extrapenais”, com foco em uma abordagem no âmbito do Direito Administrativo. A palestra teve a participação de Fernanda Marinela, conselheira do CNMP, e de Rogério Sanches Cunha, promotor de justiça do MP-SP.

Os palestrantes falaram sobre a atribuição de competências para a prestação do serviço de saúde no país, regulamentação e controle desse serviço e responsabilidade administrativa, civil e penal. “A Constituição Federal norteia de quem é a responsabilidade e a distribuição da competência na prestação do serviço público de saúde. A competência é de cada um dos entes e a União precisa assumir o seu papel na coordenação dos trabalhos, conforme até mesmo decisão recente do STF. A saúde pública é indispensável para os avanços e para a manutenção da sociedade e da democracia brasileira”, afirmou Fernanda Marinela.

Já o promotor Rogério Sanches fez uma abordagem mais voltada para o campo do Direito Penal e levantou a hipótese da necessidade de se ampliar a responsabilidade penal das pessoas jurídicas para os crimes contra a saúde pública. Ele destacou diversas investigações em andamento contra gestores que, mesmo na pandemia, atuaram de forma ilícita na condução dos serviços públicos de saúde. “Entendo ser pertinente ampliar a responsabilidade penal da pessoa jurídica para os crimes contra a saúde pública. Temos que começar a repensar como queremos, efetivamente, colocar o Direito Penal nesse protagonismo, defendendo a saúde pública”, afirmou Rogério Sanches.

Epidemiologia e Direito

O painel “As pandemias e as visões da Epidemiologia, da Ciência de Dados e do Direito” trouxe uma visão multidisciplinar para o enfrentamento da pandemia. Como usar a análise de dados para tentar identificar e prever padrões e a melhoria do arcabouço legislativo nacional para responder às emergências de saúde pública em nível mundial. A conversa foi conduzida pela vice-presidente da OAB-AM, Grace Anny Zamperlini.

Apesar de serem cenários de incertezas, o doutor em epidemiologia, Wanderson Kleber de Oliveira explicou que é importante ter um plano estruturado para responder com rapidez. “Nós temos estratégias para responder antes que esses eventos ocorram, precisamos estruturar planos e capacitar a sociedade para identificar ameaças, estabelecer e reconhecer vulnerabilidades e estimar o risco diante de cada cenário”, pontuou. Atualmente já existe um regulamento sanitário internacional, porém a pandemia do novo coronavírus está mostrando que ele precisa de ajustes para melhorar a qualidade e rapidez de resposta.

Cooperação jurídica

A solidariedade e cooperação foram muito destacadas no painel “BRICS: Cooperação jurídica internacional na pandemia”. Moderado pelo coordenador de Relações Internacionais da ESA Nacional, Bruno Barata, o encontro mostrou que mesmo que cada país tenha suas particularidades no combate à pandemia, podem aprender muito uns com os outros e construir juntos práticas internacionais que fortaleçam a todos.

Para os palestrantes, é fundamental aprofundar os conhecimentos jurídicos e de saúde pública de todos, facilitando assim a coordenação de estratégias que possam ser empregadas em áreas-chave. Além da importância de resguardar o Estado de Direito, que tende a ficar fragilizado em momentos de crise, uma vez que há a tendência de se substituir os mecanismos do Direito por mecanismos administrativos adotados pelo Poder Executivo de vários países em situação de pandemia.

O BRICS é o grupo de países de economias emergentes formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. Todos foram representados no painel, que contou com os advogados Alexey Klishin, da Rússia; Chamy Vu, da Rússia; Ghandu Badela, da África do Sul; Prashant Kumar, da Índia; e Yin Baohu, da China.

Agronegócio

O painel “O agronegócio, as relações jurídicas e a pandemia”, com a moderação da vice-presidente da OAB de Tocantins, Janay Garcia, teve a participação do ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Raul Araújo.

O ministro disse que o setor já é dotado “de insegurança e não necessita da colaboração do Judiciário, para ampliar essa insegurança inerente aos negócios. O Judiciário deve ter cuidado ao interferir nas relações jurídicas”. Ao se referir ao agronegócio, lembrou que as repercussões da pandemia têm sido menos severas nesse setor, principalmente, em relação aos alimentos, gêneros de primeira necessidade, que têm “sofrido efeitos menores do que têm ocorrido em outros setores como a economia, o turismo e o entretenimento”.

Raul Araújo disse, ainda, que o STJ está enfrentando um interessante tema que diz respeito à recuperação judicial do produtor rural, uma vez que fixou marco temporal definidor dos créditos submetidos aos efeitos de recuperação judicial, em favor de produtor rural que exerce atividade empresária.

Fake News e eleições

O vice-presidente da OAB Nacional, Luiz Viana Queiroz, foi o moderador do painel “Fake news nas eleições: diálogo constitucional”, com a palestra do procurador-geral da República, Augusto Aras. Aras ressaltou que as fake news são uma grande preocupação e que o desafio maior que o país deve enfrentar é descobrir um remédio para combater esse mal que realiza grande desserviços para a democracia brasileira.

“Esta é a nossa dificuldade. Sabemos que o Poder Judiciário Eleitoral vem, de todas as formas, editando medidas de controle dessas fake news. A maior gravidade é que elas interferem na formação do consenso social, forja um eleito ou, pior, derrota candidaturas legítimas em razão de uma metodologia de comunicação de massa, muitas vezes, valendo-se de meios fraudulentos, de polarizações que tornam artificiais os graves problemas sociais, políticos e econômicos”, afirmou o procurador-geral.