Juiz do STJD defende mais rigor contra jogadores violentos

quinta-feira, 24 de março de 2005 às 07:35

Brasília, 24/03/2005 - Juiz do Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD), o advogado Oscar Otávio Coimbra Argollo considera que o maior rigor na aplicação de punições a jogadores violentos e indisciplinados, que vem sendo imprimido pela mais alta Corte desportiva com jurisdição sobre o futebol, tem sido pedagógico para todas as modalidades do desporto nacional. O reflexo dessa mão mais firme do STJD, segundo ele, pode ser a redução da violência em todo mundo esportivo, abrangendo outras categorias que não o futebol.

“Como o futebol é o principal esporte de preferência nacional, a mídia também transmite mais rapidamente a informação, o que cria um elemento coercitivo para que os partícipes, os desportistas, saibam que a partir do momento que cometerem uma irregularidade estão passíveis de sanções, às vezes extremamente danosas para eles, que pode repercutir moralmente e economicamente”, afirmou o juiz em entrevista a este site. Flamenguista, durante a entrevista ele não entrou no mérito - dada sua condição de juiz - mas deixou entrever sua decepção com o gesto do atacante do Fluminense, Felipe (ex-Flamengo), que agrediu um colega e foi suspenso das competições pelo STJD por seis meses.

Ex-conselheiro federal da OAB pelo Rio de Janeiro, Oscar Argollo é um dos dois juízes do STJD indicados pela entidade - o outro é o ex-presidente nacional da OAB e torcedor do Corinthians, Rubens Approbato Machado. Membro atual das Comissões do Conselho Federal da OAB de Defesa e Valorização da Advocacia e de Defesa dos Credores Públicos (Precatórios), nessa entrevista ele explica as preocupações e o funcionamento do STJD e, principalmente, como se dá a atuação da representação da entidade dos advogados no Tribunal.

A seguir, a íntegra da entrevista do advogado Oscar Argollo:

P - O sr. poderia explicar como é a atuação de um representante da OAB dentro do Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD). Como é que funciona?
R - A Ordem tem uma representação nos Tribunais desportivos, da mesma forma que há nos Tribunais judiciários. Há aquela regra de representação, como se fosse um quinto constitucional. No STJD nós temos duas vagas destinadas ao Conselho Federal da OAB, enquanto nos Tribunais Desportivos Estaduais, as Seccionais é que fazem as indicações. A nossa participação é de julgador, um magistrado desses processos administrativos, que corresponde, mutatus mutanti, ao que acontece na Ordem com os Tribunais de Ética, porque o código disciplinar nada mais é do que um Código de Ética Desportivo.

Eu não diria que o STJD é o mais importante, mas, talvez, o mais exposto dos tribunais desportivos, em razão da preferência nacional desportiva, que é o futebol. Daí porque a mídia enfoca muito a figura deste Tribunal desportivo, que funciona na cidade do Rio de Janeiro, porque lá ainda está sediada a Confederação Brasileira de Futebol, a CBF, que é quem patrocina ou, melhor, mantém este Tribunal, a lei determina que assim o seja. Ainda que nós, auditores e membros do Tribunal não recebemos absolutamente nada. É um trabalho de amor ao esporte.

P - O STJD é a última instância no futebol, tal como os Tribunais superiores de Justiça?
R- O STJD funciona verdadeiramente como a instância superior dos Tribunais desportivos. Estes são vinculados às Federações estaduais. Portanto, suas decisões, havendo a possibilidade, são recorridas ao STJD. A outra hipótese - e talvez aí resida uma confusão no entendimento, também, da população, com relação a essa figura, é no que diz respeito aos campeonatos que são patrocinados pela Confederação Brasileira de Futebol, ou seja, os campeonatos nacionais. Nós temos hoje, no Brasil, a Copa do Brasil e o Campeonato Brasileiro. Essas duas competições não são atreladas aos Tribunais desportivos das Federações. Elas estão vinculados ao STJD, que tem competência originária para os casos relativos a essas competições. Funciona nessa hipótese e em duas instâncias. No STJD funcionam também quatro Comissões Disciplinares.

Em casos como o da recente agressão de um jogador (Felipe, do Fluminense) a outro, e da entidade desportiva (São Caetano) que foi punida pelo falecimento daquele atleta -, como se tratavam de competições nacionais, esses casos foram apresentados e julgados em primeira instância pelas Comissões do STJD. De suas decisões foram apresentados recursos, ou são apresentados recursos ao STJD propriamente dito, que é composto de representantes da Confederação Brasileira de Futebol, dos árbitros, dos profissionais atletas e da Ordem dos Advogados.

P - Na sua opinião, qual é a importância de o Conselho Federal da OAB indicar dois membros para o STJD?
R - A importância vem no mesmo critério do chamado “quinto constitucional’, que é a participação dos advogados nos Tribunais do país, trazendo o seu conhecimento e sua vivência, juntamente com magistrados e outras figuras. O STJD é um Tribunal desportivo e eclético, porque você pode ter a participação de pessoas que não sejam advogados, mas que tenham algum conhecimento jurídico, como por exemplo a entidade dos jogadores pode indicar um atleta ou um ex-atleta. Que possa, de alguma maneira, contribuir para isso. Normalmente, as figuras e as pessoas que compõem esse Tribunal têm por formação o Direito porque, na verdade, o que se está fazendo ali é um trabalho de atuação no campo do Direito e dessas profissões todas.

O presidente do STJD é o doutor Luiz Zveiter, um advogado que pelo quinto constitucional foi guindado ao Tribunal de Justiça do Estado do Rio e é desembargador há algum tempo. Outro integrante do Tribunal, o doutor Lanfred, de São Paulo, também é juiz de Direito.

P - Na sua opinião, cuidando especificamente sobre a questão do futebol, a atuação do Tribunal tem ajudado a reduzir o índice de violência no esporte no Brasil?
R - Eu creio que sim. Não só índice de violência mas também outras questões. Inclusive na própria organização. Nós temos uma legislação mais moderna e recente que é o Estatuto do Torcedor; tem ainda o Código Disciplinar, que foi reformado e está em vigência há pouco mais de um ano. Não que tenha trazido tantas novidades, porque ética é comportamento. Se o comportamento está errado, não será necessariamente uma regra que vai indicar, é esta conduta que será observada como anormal, dentro do comportamento que a sociedade entende como normal. Como é um esporte de preferência nacional, a mídia também transmite mais rapidamente a informação, o que cria um elemento coercitivo para que os partícipes, os desportistas saibam que a partir do momento que cometerem uma irregularidade, estão passíveis de sanções, às vezes sanções extremamente danosas para eles, que pode repercutir moralmente e economicamente, enfim, de várias maneiras.

Então, eu quero crer que essa componente, que essa modernidade e a própria atuação do STJD, mediante a sua interferência nos casos que ocorrem nos campeonatos nacionais, vão refletir em todo o país aquilo que deve ser feito de correto e o que não deve ser feito, o que é errado. Acho que essa é a natureza da Justiça, a natureza do Direito e a natureza, basicamente, da Deontologia, da Ética. É isso que eu gosto de examinar e de trabalhar.

P - O STJD funciona no Rio de Janeiro. O certo não seria ele funcionar em Brasília, como os demais Tribunais superiores?
R - Sobre isso fica difícil nos manifestarmos, porque ele está vinculado à CBF. Como ela tem sede no Rio de Janeiro, mantém a sua sede no Rio de Janeiro, o Tribunal está ungido a essa situação geográfica.

P - No caso do jogador Felipe, do Fluminense, punido com suspensão de seis meses pelo STJD por agredir um jogador do Campinense, como é que funcionou esse julgamento?
R - Eu não externarei uma opinião técnica.

P - Não, a pergunta é sobre como funcionou Tribunal nesse caso, como foi que o STJD julgou?
R - Sim, vou explicar qual foi o procedimento. O fato se deu dentro de uma competição nacional, chamada Copa do Brasil. Houve uma denúncia de agressão. Esta denúncia foi entregue a um procurador, porque o Tribunal tem uma espécie de Ministério Público, a sua Procuradoria. Este procurador apresentou a denúncia numa das Comissões, por acaso foi na 2ª Comissão Disciplinar, cujo julgamento ocorreu recentemente, com aplicação da pena. Agora, a partir dessa decisão o advogado do desportista denunciado e sancionado alardeia que interporá um recurso. Havendo o recurso, este recurso, então, será apresentado ao Colegiado Pleno, formado por esses membros, dentre eles eu. Razão pela qual eu não posso me manifestar sobre o caso.

P - Mas, uma questão sobre a qual que o sr. pode se manifestar: porque na Justiça Desportiva o caso aconteceu há menos de 15 dias, o atleta foi denunciado, e já foi julgado e já foi punido? Porque que a Justiça Desportiva a justiça é rápida e a Justiça convencional é tão lenta?
R - Olha, essa questão é altamente tormentosa para que eu possa responder com tanta rapidez. Primeiro, são estruturas completamente diferentes. A estrutura do Poder Judiciário nacional é, a meu juízo, um modelo arcaico, ainda que esta reforma que tenha ocorrido no Poder Judiciário brasileiro, eu acho que a única coisa vantajosa foi a criação dos conselhos nacionais e estaduais de Justiça, para que se desenvolvam novas políticas e, quiçá - essa é a minha esperança - que se reorganize o modelo e a estrutura desse poder.

Bom, o poder desses Tribunais desportivos está vinculado ao comportamento do atleta daquela modalidade no nosso caso o futebol. Todas as modalidades têm que possuir esses Tribunais. Enfim, o voleibol também haverá de ter, sei lá, o seu STJD do voleibol, assim como o nosso é o do futebol. Como é um processo administrativo e não judicial, nós temos prazos, porque o Código assim determina, mais rápido. Isto, dado ao movimento que é previsto no Código Disciplinar, e porque as regras não são tão rígidas e tão formais como as regras do Poder Judiciário, isso admite e permite uma celeridade como, por exemplo: há um fato com um jogador, numa entidade, chega lá a denúncia e é recebida. Imediatamente, a administração do Tribunal, a Secretaria do Tribunal faz a comunicação por fax ou telegrama, e faz a intimação para a defesa ou para o julgamento. São utilizados mecanismos modernos do meio de comunicação, daí, portanto, você ter a possibilidade de acelerar esses julgamentos. Além do mais, porque há prazos prescricionais mais curtos, sob pena de nós não julgarmos o caso e o denunciado vir a ser liberado, em razão da prescrição.

P - Os senhores julgam só jogador de futebol, ou também dirigentes e árbitros de futebol que cometem ilícitos?
R - Tudo que está vinculado ao futebol: os árbitros, os dirigentes e as entidades desportivas, os clubes. Não só os clubes, pois agora há também as empresas desportivas que atendem a esse tipo de esporte, e os atletas de maneira geral, os dirigentes e os envolvidos, até o massagista. Além do sujeito que tem lá, eventualmente, uma participação como o preparador físico, ou junto ao atleta ou já entidade desportiva, ele está sujeito porque nós julgamos as entidades e os desportistas em geral.

P - E com relação à questão das dívidas dos clubes para com os órgãos como INSS, Receita e outros, o STJD tem de alguma intervenção ou pode ser provocado?
R - Talvez esse seja o grande problema das entidades desportivas. Talvez seja a natureza do que hoje nós estamos assistindo com o futebol, uma fase sem grandes expoentes, sem grandes expressões, até um pouco um afastamento do próprio povo, quando se examina a renda e o público dos jogos. Mas nós não estamos diretamente ligados à questão do endividamento dos clubes. De alguma maneira, futuramente poderemos estar. Na medida em que eventualmente haja um problema muito grave com uma entidade dessas, talvez venhamos a receber alguma denúncia com relação a isso. Se recebermos, vamos examinar para ver se isso está de acordo com a norma e o procedimento que seja apresentado.