Artigo: A Inconfidência Mineira e a liderança da OAB

sábado, 12 de março de 2005 às 08:25


Brasília, 12/03/2005 – O artigo "A Inconfidência Mineira e a liderança da OAB" é de autoria do membro da Comissão de Relações Internacionais do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, José Anchieta da Silva:

"A desmedida sanha arrecadadora do Estado brasileiro, sem pudor e sem limites, tem sido tema recorrente, desde os tempos do Brasil colônia. Na Inglaterra, em 1.215, o monarca João, batizado de João Sem Terra, foi obrigado a assinar a denominada Carta Magna (que só era magna porque era muito extensa) onde teve extraordinariamente limitada a sua capacidade de gastança. Com a carta impôs-se ao monarca inglês um regime espartano, conferindo-lhe apenas o direito de armar cavaleiro o seu filho primogênito e o de celebrar, por uma única vez, as núpcias de sua filha mais velha. O rei ficou proibido de aumentar os impostos na Inglaterra, particularmente na cidade de Londres.

Os historiadores anotam que este acontecimento teria sido um marco da democracia e dos direitos humanos. À brasileira, pode-se acrescentar nestes tempos novos, que aquela foi a primeira insurreição legítima contra a edição de medidas provisórias.

No Brasil colônia, em 1.720, mais precisamente nas Minas do Ouro (Na Província de São Paulo e das Minas do Ouro) ocorreu a Sedição de Vila Rica, liderada pelo português Felipe dos Santos, que acabou sendo morto e teve esquartejado o seu corpo e por Pascoal Guimarães que também foi condenado e teve as suas propriedades incendiadas. A sedição tinha por causa a proibição do livre comércio de ouro em pó e em pepitas, com a criação da chamada ‘Casa de Fundição’, meio encontrado pela coroa portuguesa para garantir o controle e o recolhimento do ‘quinto’ cobrado por Portugal. O Conde de Assumar, representante da Coroa, fingiu negociar com os revoltosos, enquanto na verdade estava aguardando reforços vindos do Rio de Janeiro para sufocar o levante. Vale o registro: a revolta decorria da insatisfação com a cobrança do quinto, isto é de exatamente 20% (vinte por cento) a título de imposto. Se Felipe dos Santos soubesse o que o Estado brasileiro reservava para os contribuintes desse século vinte e um, não teria, com certeza, colocado o seu pescoço a prêmio.

O movimento sedicioso de 1.720, foi um movimento que mobilizou militares, mineradores, parte do clero e do povo. O resultado do movimento foi significativo. Foi em função dele que se separou a capitania de São Paulo de Minas Gerais. Foi a partir daí que a sabedoria daqueles habitantes da província criou os ‘santos de pau oco’ para esconder o ouro e evitar o quinto, ficando mais generosos na construção de ricos altares e ornamentos nas igrejas, evitando-se que o ouro fosse parar em Portugal.

Em 1.789 outro movimento se deu, a Inconfidência Mineira, cujo término, em 1.792, levou Tiradentes, seu líder, ao cadafalso no Largo da Lampadosa, no Rio de Janeiro levando uma dezena de outros conspiradores: padres, políticos, magistrados e homens de posse ao exílio na África.

O inconfidente José de Resende Costa, o pai, em seu depoimento nos autos da devassa respondeu a seus inquisidores sobre o motivo do movimento: ‘pela liberdade e para construir uma universidade igual à de Coimbra’. Prestes à condenação à pena capital, afinal convolada em degredo, Resende Costa, o filho, também condenado, consolava o pai dizendo-lhe: ‘...ah! meu pai amado, o que é a vida? Aspiremos a imortalidade.’ (O Inconfidente José de Resende Costa (pai e filho) e o Arraial da Laje por Rosalvo Gonçalves Pinto, Edição do Senado Federal, 1.992).

Também a inconfidência trazia a marca da irresignação com aquela cobrança do quinto, agravada com a derrama que correspondia a um cerco da Coroa portuguesa querendo receber os atrasados, sem levar em consideração o fato de as minas, em boa medida, encontrarem-se em fase de visível esgotamento.

A inconfidência mineira também não se deu em vão. Emoldurou o sentimento de liberdade e plantou as sementes que quarenta anos mais tarde resultou na independência do Brasil.

Mais de duzentos anos são passados e o Brasil, como nação independente, faz ouvidos moucos a estes comprovados fatos que a história registra, adotando um sistema de tributação que abocanha praticamente duas vezes aquele quinto, o suficiente para os líderes de nossa história se rebelarem.

Neste momento em que todos os setores da vida privada brasileira, abraçando todos os setores da atividade produtiva, se levantam contra a sanha arrecadadora do Estado brasileiro, cabe à Ordem dos Advogados do Brasil, por sua liderança no Conselho Federal empunhar esta bandeira na busca de um desejável Estado Ético.

Nenhum povo poderá ser considerado verdadeiramente livre e independente enquanto admitir uma ação do Estado, espoliando-o na propriedade de seus haveres a título de tributação – qualquer que seja o nome que se adote para as exações – sem uma correspondência mínima que possa justificar este procedimento reconhecidamente fiscatório.

Ninguém melhor que a Ordem dos Advogados do Brasil para empunhar esta bandeira, atendendo aos reclamos que vêm de todos os lados e de todos os setores da sociedade brasileira".