OAB-BA envia a Lula carta cobrando resultado de apuração
Brasília, 12/01/2005 - O presidente da Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) da Bahia, Dinailton de Oliveira, assinou hoje (12) juntamente com a Associação Bahiana de Imprensa (ABI) e o Grupo Tortura Nunca Mais, carta aberta ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, cobrando os resultados da apuração de recente queima de documentos relacionados à ditadura na Base Aérea de Salvador.
Dinailton Oliveira, destacou a importância do ato para a preservação da memória nacional e para reforçar o reclame popular pela abertura dos arquivos da ditadura: "Esses documentos, muitos deles ainda desconhecidos, podem revelar o quadro real e triste desse período, não para efeito de retaliações, mas para que nossa nação não repita os mesmos equívocos”, afirmou o presidente da OAB-BA. “Por isso, é importante o empenho de todos para que esses documentos não sejam destruídos. Estamos vigilantes".
A carta será encaminhada também ao ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos; ao ministro da Defesa, José Alencar; ao Secretário Nacional dos Direitos Humanos, ministro Nilmário Miranda; à Comissão de Averiguação e Análise de Informações Sigilosas e à Comissão Especial Arquivos Governamentais Confidenciais.
Segue a íntegra da carta:
“A Ordem dos Advogados do Brasil - Seccional Bahia (OAB-BA), a Associação Bahiana de Imprensa (ABI) e o Grupo Tortura Nunca Mais - Seção Bahia, diante do recente episódio da queima intencional de arquivos do regime militar em dependências da Aeronáutica em Salvador-Bahia e da celeuma que se está alimentando com a regulamentação e o cumprimento da abertura de arquivos sigilosos, vêm cobrar transparência e satisfações devidas à sociedade brasileira, inclusive com a divulgação das providências adotadas na fase de inquérito, assim como os resultados que forem obtidos.
Ainda que as investigações constatem que a queima dos documentos tenha sido uma trama, a guarda, ao que tudo indica, estava com um órgão público que, assim, fica envolvido com o ato criminoso. Tais documentos não são propriedades de integrantes de nenhum organismo. Eles pertencem ao Brasil, pertencem ao seu povo. O Governo e a sociedade têm o dever de preservá-los. Portanto, essa exigência é feita em nome de todo o povo brasileiro.
Conseqüentemente, as entidades acima relacionadas mantêm-se reunidas em articulação permanente, aguardando a participação de outras entidades, do povo e de parlamentares, independente de partido, que se queiram integrar a este movimento, até que seja devidamente atendido o interesse público.
A garantia de que devem ser revelados os arquivos da ditadura militar de 1964 abre perspectiva importante para se reconstruir uma das páginas mais sombrias da história do Brasil. Isso irá constituir-se também como providência muito importante para as famílias daquelas inúmeras pessoas que foram vítimas de perseguição política, foram mortas e outras são consideradas desaparecidos políticos, até hoje, sem qualquer consideração nem satisfações do Poder que então dominava o país.
Agora, o Estado e segmentos que a ele estejam subordinados devem garantir a disponibilização das informações indispensáveis sobre o que aconteceu em passado recente no Brasil, durante o período de regime militar tão duro e prolongado, que ceifou a vida de milhares de brasileiros.
Tanto as Forças Armadas, como os órgãos de segurança e seus agentes que se constituíram em braços da repressão política (Polícia Federal, Departamento Estadual de Ordem Política e Social - DOPS, SNI, DOI-CODI, Cenimar, Cisa - incluindo-se, aí, alguns extintos ou substituídos) têm a responsabilidade legal e o dever de preservar os arquivos, por mais danosos que possam ser considerados, porque tais documentos pertencem, em última instância, à nossa memória histórica. As informações neles registradas são um direito da cidadania. Querer queimá-los intencionalmente, criminosamente, é pretender sonegá-los à Pátria.
Entendem as entidades signatárias que nem mesmo documentos referentes ao período ditatorial que, porventura, hoje estejam em mãos de particulares devem ficar perdidos e esparsos.
Ademais, com o estabelecimento da Medida Provisória Nº 228, de 9 de dezembro de 2004, que cria a Comissão de Averiguação de Informações Sigilosas, para viabilizar a abertura e análise dos arquivos, levando-se em consideração as ressalvas constitucionais, o que agora se reivindica é a participação de entidades da sociedade civil em nível nacional, para acompanhar os trabalhos da referida comissão.
A transparência dos fatos concernentes à abertura dos arquivos do regime militar tem de ser assegurada e feita com fidelidade, ainda que ressalvando-se o cuidado de que devem ser preservadas informações relacionadas à intimidade, vida privada, honra e imagem das pessoas, conforme estabelece a Constituição Brasileira.
O atual Governo é depositário de muitas esperanças do povo e tem a responsabilidade de dar um passo significativo para que a história seja revelada com a consolidação de princípios da democracia que é pregada.
A reconciliação nacional está a exigir esse gesto de grandeza, inclusive das Forças Armadas, pois a normalidade democrática também caminha pela trilha de um país que tem a sua história passada a limpo, sem censura, sem omissões, sem torturas e com o respeito aos Direitos Humanos”.
Salvador, 12 de janeiro de 2005.
Dinailton Oliveira, Presidente da OAB-BA
Samuel Celestino, Presidente da ABI-BA
Ana Guedes, Presidente do Grupo Tortura Nunca Mais (Bahia)