OAB: legislação sobre aborto vem de 1940 e não é intocável
Brasília, 09/12/2004 - O presidente em exercício da Ordem dos Advogados do Brasil, Aristoteles Atheniense, afirmou hoje (09) que a decisão do governo de propor a revisão da legislação sobre o aborto no País “é iniciativa que comporta ampla discussão e um exame democrático da sociedade, acima de manifestações irracionais”. Ele observou que a punição ao abordo no Brasil é definida pelo Código Penal, uma lei de 1940, “mas nesses sessenta e tantos anos ocorreram profundas transformações sociais e modificações substanciais em relação aos direitos da mulher e seu papel na sociedade”.
Aristoteles lembrou que o Conselho Federal da OAB, em sessão de 16 de agosto passado, decidiu, por maioria de votos, favoravelmente à tese do direito da mulher à interrupção da gravidez de feto anencefálico (sem cérebro), não a considerando como prática abortiva. “Naquela oportunidade, o tema foi debatido amplamente em relação a um caso concreto que estava em curso no Supremo Tribunal Federal”, lembrou, obsevando que o Conselho deverá ser pronunciar também, quando provocado, sobre o projeto governamental de liberalização do aborto.
Devido às transformações ocorridas nas últimas seis décadas, Aristoteles Atheniense afirma que não se pode considerar hoje intocável a legislação sobre o aborto. Portanto, ele entende que as alterações na legislação do aborto devem considerar o longo período de sua proibição pelo Código Penal, assim como as condições em que vivem hoje a mulher brasileira. ”A mulher brasileira hoje sofre as influências do mundo globalizado, e, naturalmente, não se conforma com o status de que desfrutava à época da Segunda Guerra Mundial”, comparou.
Aristoteles Atheniense entende também que o projeto de mudança na legislação do aborto não pode, “por uma questão ética que deve cercar o assunto, servir de instrumento político-partidário, não se prestando às campanhas políticas ou promessas eleitorais, no pleito de 2006”.
Da mesma forma, considera que “as justificativas para mudança na lei, que tenham por base a experiência de outros países, deverão ser recebidas com cautela”. E acrescentou: “A legislação estrangeira, no caso, não passará de um subsídio. A iniciativa governamental destina-se, como é óbvio, aos brasileiros, devendo atender às nossas peculiaridades”.
O presidente em exercício da OAB considera também que a reforma nessa legislação deve levar em conta a mulher em suas diversas categoriais sociais. “Ela não pode ter por alvo apenas as mulheres que vivem nos grandes centros, nem às de classes privilegiadas”, observou. E concluiu: “De outra forma, o projeto anunciado será apenas um a mais em nossa abundante produção legislativa e, como a experiência tem demonstrado, todo país onde há muitas leis, acaba sendo carente do mínimo de direito”.