STM julgava melhor que STF na ditadura, diz defensora pública
Brasília, 08/12/2004 - Com duras críticas ao comportamento do Judiciário, sobretudo ao Supremo Tribunal Federal (STF), no período da ditadura, a exposição da defensora pública da União, Elizabeth Diniz, foi a que mais impressionou os participantes do encontro “Visão Histórica do Período de Exceção”. A avaliação foi feita hoje (08) pelo presidente da Comissão Nacional de Direitos Humanos(CNDH) da OAB, Edísio Simões Souto, num balanço sobre o evento promovido pelo órgão. A defensora afirmou que os presos e perseguidos pela ditadura não podiam contar com o STF e que “o Superior Tribunal Militar julgava melhor”. Ela pediu mudanças nos critérios atuais para concursos de juízes e de nomeação de desembargadores e de ministros dos tribunais superiores, principalmente os do STF.
“O Superior Tribunal Militar julgava melhor do que o STF, pois nós tínhamos mais garantias em modificar uma pena no STM do que no STF”, afirmou Elizabeth Diniz, que foi advogada de vários presos políticos durante a ditadura militar. “Com a transferência do julgamento da Justiça ordinária para a Justiça de exceção, que eram os tribunais militares - o único recurso que nós tínhamos era o recurso ordinário para o Supremo, que nunca era admitido. Não conseguíamos sucesso nenhum, a não ser o voto do ministro Aliomar Baleeiro e de mais um ou dois ministros, que logo seriam cassados. Então, a Justiça não funcionava, não existia”, recordou.
Elizabeth Diniz destacou que esse quadro resultava do regime de exceção, do estado de terror e das inúmeras cassações que ele promoveu, inclusive na magistratura, alcançando até ministros do Supremo. Segundo lembrou, nesse quadro, a Ordem dos Advogados do Brasil foi uma das raras instituições a que as pessoas podiam recorrer e com a qual os advogados podiam contar. “O único apoio que tínhamos era ir correndo à OAB, que também tentava fazer valer os direitos, mas esbarrava no Judiciário, que não funcionava, pois os tribunais, como o STF, eram apenas mais um departamento; não havia mais os três poderes, apenas um, o Executivo na forma de ditadura”.
“E a Justiça ficava aonde nisso? Não existia Justiça. Passaram os jovens a ser julgados pela Justiça militar, pelas auditorias, cujo presidente era um militar e não um juiz togado. Ali se processavam os jovens garotos que tinham a audácia de contrariar o regime. Então, tivemos a lei 314 com a edição do AI-5, que foi a maior violência à ordem jurídica constituída de qualquer país. Cassaram senadores, cassaram deputados, qualquer um que fosse contrário, e os juízes passaram a viver um medo terrível. Então, o Judiciário não era independente. Qualquer coisa, ia para a Justiça militar. E como eram os presos? Eram presos, torturados e mortos e nós, advogados, assistíamos a tudo aquilo - eu ainda praticamente uma garota, num desespero terrível - e não podíamos fazer nada, não tínhamos a quem recorrer, pois aboliram o hábeas corpus”, relatou a defensora Elizabeth Diniz, em depoimento que impressionou os presentes.
Da mesa redonda promovida pela Comissão de Direitos Humanos da OAB nesta terça-feira (07), em alusão ao Dia Internacional dos Direitos Humanos que é comemorado na sexta-feira (10), participaram também o ministro Nilmário Miranda, da Secretaria Nacional de Direitos Humanos, o senador Pedro Simon (PMDB-RS), o bispo da Diocese de Volta Redonda (RJ), dom Waldir Calheiros, e o jornalista Rubem Azevedo Lima. O encontro foi aberto pelo vice-presidente da OAB, Aristoteles Atheniense, e o presidente da CNDH, Edísio Souto.