Artigo: Em defesa da República e da democracia
Fortaleza, 23/11/2004 - O artigo “Em defesa da República e da democracia” , de autoria do presidente da Seccional da OAB do Ceará, Hélio Leitão, foi publicado hoje (23) no jornal O Povo, do Ceará:
“No ano de 2003, em pesquisa realizada por uma instituição chilena (Latinobarómetro), constatou-se que 65% dos brasileiros indagados não acreditam mais na democracia, não se-lhes importando que uma ditadura retornasse ao poder, contanto que fossem resolvidos nossos problemas econômicos. Para se entender tal descrédito, mister se faz realizar rápido apanhado de nosso histórico republicano e democrático, além de análise do próprio conceito do termo ''''democracia''''.
Há 115 anos foi proclamada a República. Não por um movimento popular, mas por parcela minoritária dos políticos (os republicanos), aliados aos militares que, insatisfeitos com o governo, inauguraram tal forma de governo no Brasil. Desde então nos sucedemos em governos, ora autoritários (sem qualquer participação do povo na escolha de seus governantes), ora com um mínimo de participação popular, por meio do sufrágio. Até chegarmos à chamada Constituição cidadã. A Carta de 1988 ampliou o espectro de participação popular no processo de escolha dos titulares do poder, cristalizando a democracia como princípio que impõe a alternância necessária de tais representantes.
Mesmo assim, o grau de democracia alcançado não foi suficiente. Em outras palavras, a mera alternância de representantes eleitos não está mais satisfazendo o povo, que enxerga os políticos eleitos com enorme desconfiança. E tal descrédito pode ser explicado facilmente: não se confia em um processo em que, quem detém o poder soberano escolhe intermediários que, não raro, uma vez eleitos, deixam de prestar quaisquer contas ao verdadeiro titular do Poder.
Refere-se aqui a apenas uma das espécies de democracia, a denominada ''''democracia indireta''''. Ou, em termos mais claros: aquela em que o povo, ao invés de diretamente decidir, tão somente escolhe seus intermediários (os representantes eleitos do Executivo e Legislativo), que irão, por substituição, realizar as escolhas pelos representados, a saber, o povo.
A Constituição, porém, prevê outros mecanismos, da chamada ''''democracia direta'''', instrumentos praticamente não utilizados. Por democracia direta é de se entender todos os mecanismos possíveis em que o povo diretamente decide, sem intermediários.
E que meios seriam estes? Onde estariam eles previstos na Constituição? De que forma funcionariam?
Os meios de democracia direta previstos na Carta Magna estão expressamente previstos, tanto em seu art. 1º, parágrafo único. (''''Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição''''), quanto nas denominadas subespécies de democracia direta, previstas em seu artigo 14, a saber: plebiscito, referendo e iniciativa popular.
Tais meios, acredito, efetivamente implementados, trarão ao verdadeiro titular do poder - o povo - a possibilidade real de realização de decisões. E isso, com um grau muito maior de probabilidade, fará retornar uma democracia renovada e revigorada.
É com tais objetivos que, nos 115 anos de comemoração da proclamação da República, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), com o apoio da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), promove a Campanha Nacional em Defesa da República e da Democracia. Tal campanha tem por meta a propositura de um projeto de lei que regulamenta, desta feita de forma efetiva, o plebiscito, referendo e a iniciativa popular em nosso País. E diz-se de forma efetiva porque a atual regulamentação legal destes instrumentos democráticos - a lei nº 9.709/98, na verdade, obstruiu seu emprego, por preverem formas praticamente impossíveis de efetivação de tais notáveis meios democráticos.
Tal projeto de lei, que a Ordem dos Advogados do Brasil tem a honra de encampar, em bandeira a ser desfraldada em todo o País, fará o jogo democrático adquirir contornos inéditos em nossa federação, vez que colocará o povo, ao invés de mero coadjuvante, como ator principal de nossa política”.