Busato: uso de aposentadoria para burlar processo é imoral
Brasília, 21/09/2004 - O presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil, Roberto Busato, criticou hoje (21), durante entrevista coletiva, o comportamento de magistrados que recorrem ao pedido de aposentadoria para escapar de processo administrativo disciplinar de apuração de conduta irregular no cargo. “O pedido de aposentadoria tem base legal, todos sabemos, mas o considero uma imoralidade quando usado como subterfúgio por juízes que violaram a conduta ética desejada para o cargo e buscam se livrar do processo”, afirmou Busato. “A aposentadoria acaba funcionando como um prêmio e não como punição”.
A opinião foi manifestada por Busato durante entrevista coletiva, na qual foi questionado sobre o pedido de aposentadoria do desembargador do Tribunal de Justiça do DF, Valter Xavier. Busato equiparou a atitude do juiz à tomada recentemente por um ministro da Suprema Corte Argentina. Quando o órgão argentino encarregado de fazer o controle externo da magistratura abriu procedimento investigativo contra o ministro para apurar eventuais improbidades, ele entrou com o pedido de aposentadoria.
“Na verdade, o ministro argentino quis se livrar do processo administrativo, o que este desembargador também parece ter feito. Ao pedir a aposentadoria, o desembargador dá a entender que reconhece a veracidade das acusações feitas a ele, quando caberia a ele enfrentar o procedimento administrativo e provar que não tem culpa”, comparou o presidente da OAB.
Conforme informações divulgadas pela imprensa, o desembargador Valter Xavier pediu aposentadoria dois dias depois de ter sido afastado pelos colegas sob suspeita de favorecer donos de cartórios no DF. Em sessão fechada, 28 desembargadores do TJDF defenderam a instalação do processo e 24 acharam apropriado o afastamento do juiz de suas funções até o término da investigação. Com o pedido de aposentadoria, Valter Xavier ficou livre do desgaste de um processo administrativo, antecipando-se à pena máxima que lhe seria imposta caso o Tribunal entendesse que o juiz de fato usou o cargo em benefício de cartórios.
O desembargador Valter Xavier é juiz de carreira, mas o ex-desembargador Wellington Medeiros, que também pediu aposentadoria há dez dias, é oriundo da advocacia. Questionado sobre a atitude que a OAB poderia tomar contra Medeiros, Roberto Busato explicou que se o magistrado praticou algum delito, não o fez na condição de advogado, mas na de magistrado.
“A OAB sempre afirmou que pessoas que deixam a advocacia para ingressar na magistratura perdem a sua origem porque tornam-se magistrados”, explicou Busato. “Isso ocorreu, por exemplo, com o presidente do STF, ministro Nelson Jobim, que veio da advocacia e hoje é o magistrado número um do País. Nós consideramos como perda de origem, a pessoa passa a ser membro da magistratura”.
Caso Wellington Medeiros deseje retornar à advocacia, caberá à Seccional da OAB-DF examinar os aspectos de idoneidade e se ele preenche os requisitos da legislação que regula a inscrição na entidade. “O eventual pedido de aposentadoria para escapar de um processo administrativo pode pesar na aferição da entidade quanto às condições do pleiteante de retornar aos quadros da advocacia”, afirmou Busato.
Para avaliar a indicação, pela OAB, de candidatos a cargos de magistrado nos tribunais por meio do quinto constitucional, a entidade constituiu uma Comissão presidida pelo conselheiro federal pela Bahia, Arx Tourinho, que examinará a questão. O objetivo é passar a limpo a prerrogativa que a OAB tem de indicar advogados para compor os tribunais por meio do quinto constitucional e elaborar um diagnóstico completo de como têm atuado nos tribunais os magistrados oriundos dessas listas compostas pela OAB.