Editorial: Aliança pela ética
Curitiba (PR), 13/06/2010 - O editorial "Aliança pela ética" foi publicado na edição de hoje (13) do jornal Gazeta do Povo (PR):
"Após a série de reportagens Diários Secretos , publicadas pelo jornal Gazeta do Povo e veiculadas pela RPC TV, as quais revelaram irregularidades, crimes e desvios de dinheiro público ocorridos em quase todos os cantos da Assembleia Legislativa deste estado, a Ordem dos Advogados do Brasil no Paraná (OAB-PR) lançou corajosa campanha de combate à impunidade e à corrupção, estimulando todos a refletirmos: Afinal, que Paraná queremos?. Uma reflexão apropriada e fundamental diante do maior escândalo da história política da nossa terra.
Pois bem, a resposta não demorou a surgir. O movimento O Paraná que Queremos , que teve início com algumas poucas e valorosas entidades, respondeu: Queremos um Paraná ético, honesto, transparente e trabalhador. Um Paraná à altura da dignidade do nosso povo .
Um movimento em prol da ética e que defende, principalmente, o afastamento da mesa diretora da Assembleia Legislativa; a aprovação de um projeto de lei que garanta a transparência nos órgãos públicos paranaenses, a chamada Lei da Transparência ; e a criação e a implantação de um Observatório Social , que possa acompanhar e fiscalizar, de maneira independente, as ações do Legislativo.
Pois bem, o movimento cresceu e, no último dia 08 de junho, o povo paranaense foi às ruas para exercer a sua cidadania.
Das mais variadas formas, as mobilizações ocorreram em pelo menos 16 cidades paranaenses: Campo Mourão, Cascavel, Curitiba, Foz do Iguaçu, Guarapuava, Imbituva, Londrina, Marechal Cândido Rondon, Maringá, Paranaguá, Paranavaí, Pato Branco, Ponta Grossa, Rio Branco, Toledo e Umuarama.
Em Curitiba, por exemplo, milhares de pessoas se reuniram na Boca Maldita, palco das Diretas Já e de outras importantes manifestações populares. Milhares de gatos pingados (mas não gatunos!) com bandeiras em punho e que se emocionaram ao ouvirem o Hino Nacional, na bela e inesquecível voz de Mel Maia, atriz e cantora paranaense.
Artistas, funcionários públicos, profissionais liberais, aposentados, donas de casa, estudantes secundaristas e universitários. Sindicatos, entidades de classe, associações de moradores e militantes políticos. Universidades, centros acadêmicos, centrais sindicais, federações e confederações. Empregados e empresários. Políticos. Famílias inteiras. Todos juntos.
Milhares de pessoas que não se importaram com o frio e que ouviram atentas os discursos de Ophir Cavalcante, presidente da OAB Nacional; de Alberto de Paula Machado, paranaense e vice-presidente da OAB Nacional; de José Lúcio Glomb, presidente da OAB-PR; de Anderson Furlan, presidente da Associação Paranaense dos Juízes Federais (Apajufe); do professor Zaki Akel, reitor da Universidade Federal do Paraná (UFPR); do advogado e professor René Dotti; de Sérgio Butka, presidente da Força Sindical em nosso estado; de Avani Slomp, presidente da Associação Comercial do Estado do Paraná; de Rodrigo Rocha Loures, presidente da Federação das Indústrias do Estado do Paraná (FIEP); e de todas as outras e não menos importantes lideranças que fizeram uso da palavra e que ocuparam, lado a lado, o palco da Boca Maldita.
Lideranças que, ao final do ato, juntas, entregaram aos deputados Tadeu Veneri (PT), Marcelo Rangel (PPS) e Ney Leprevost (PP), o projeto da Lei da Transparência elaborado pela OAB-PR.
O que se viu no centro de Curitiba e em todo o Paraná, portanto, foi uma grande e marcante aliança em torno de ideais comuns. Um basta à corrupção e ao mau uso do dinheiro público. Uma convocação aos homens e mulheres de bem.
O ato público do dia 08 de junho representa um passo importante em direção ao aprimoramento da nossa democracia. Um passo importante em direção a uma democracia mais madura e que não se contenta com a liberdade de voto. Com uma liberdade acanhada e pontual. E, aliás, sobre a liberdade ocidental, pertinentes são as indagações do sociólogo polonês Zygmunt Bauman: ... se a liberdade foi conquistada, como explicar que entre os louros da vitória não esteja a capacidade humana de imaginar um mundo melhor e de fazer algo para concretizá-lo? E que liberdade é essa que desestimula a imaginação e tolera a impotência das pessoas livres em questões que dizem respeito a todos? . A liberdade de voto é, sem dúvida, algo absolutamente essencial. Mas a verdadeira democracia, não nos esqueçamos, é muito mais do que isso.
De qualquer modo e como bem restou destacado durante o ato, o Paraná de hoje, definitivamente, não é mais o mesmo daquele de antes das denúncias e, certamente, também já não é mais o mesmo daquele de antes das manifestações do dia 8 de junho.
Em 8 de junho o movimento O Paraná que Queremos contava com mais de 21 mil adesões. Pois bem, o movimento continua crescendo e conta hoje com mais de 31,6 mil adesões.
E o amanhã? E a atual Mesa da Assembleia? Ora, sobre o amanhã e sobre a atual Mesa da Assembleia, lembremo-nos das palavras de Chico Buarque, escritas em um outro triste e sombrio momento da história política deste país: ... apesar de você... amanhã há de ser...outro dia...você vai ter que ver... a manhã renascer... e esbanjar poesia... como vai se explicar... vendo o céu clarear... .
O futuro há de ser melhor. Além das propostas já em andamento e de tudo aquilo que ainda pode ser feito nesta legislatura, em breve teremos novas eleições e a possibilidade concreta de, com consciência, realizarmos mudanças ainda mais significativas. Teremos a oportunidade de renovação dos nossos representantes e, sobretudo, da nossa esperança. E como lembrou o jurista paranaense René Dotti, em seu emocionante e vigoroso discurso na Boca Maldita, a esperança, nas palavras de Padre Vieira, é a mais doce companheira da alma . E alma... alma é o que não falta ao povo paranaense."