Artigo: A defesa do quinto constitucional
Brasília, 11/05/2009 - O artigo "A defesa do quinto constitucional" é de autoria do presidente da Comissão Nacional de Legislação e conselheiro federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) pelo Piauí, Marcus Vinícius Furtado Coelho, e foi publicado na edição de hoje (11) do jornal Correio Braziliense (DF):
"A edição de quinta-feira do Correio Braziliense publicou artigo de autoria do presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros, Mozart Valadares, propugnando pela extinção do quinto constitucional, que é previsão de escolha de um quinto dos membros dos tribunais entre os advogados e membros do Ministério Público. Eis a necessária defesa do instituto, que oxigena e legitima o Poder Judiciário.
O julgador oriundo do quinto constitucional ultrapassa diversos filtros. O concurso público para promotor de justiça ou procurador da República, ou exame de ordem para ingresso na advocacia, auferindo a capacidade técnico-juridica. O preenchimento do critério temporal, pela exigência de 10 anos na carreira, assegura a sabedoria fruto da experiência. Assim, também a escolha pelos órgãos de representação das respectivas classes a OAB e o Colégio de Procuradores indicam uma lista sêxtupla. Ademais, há seleção pelo tribunal dos mais adequados à prestação jurisdicional formulando lista tríplice. Por fim, a indicação pelo chefe do Poder Executivo, como representante do povo, exercendo a constitucional delegação social.
O magistrado oriundo do quinto é, desse modo, integrante de carreiras essenciais à Justiça, que emprestam os melhores quadros; selecionado pelo Tribunal, que apresenta os mais indicados; e escolhido pela sociedade, por intermédio de seus representantes. Não sendo o julgamento ato estanque, mas fruto, por igual, da dialética atuação da advocacia e do Ministério Público, essas carreiras possuem conhecimento e habilidades que contribuem para a distribuição da Justiça.
O Judiciário exerce uma das funções do poder do Estado, que é uno. No regime democrático, vigorante o princípio majoritário, não é estranho, antes natural, o acesso ao poder por designação popular. O chefe do Executivo, quando exerce a competência de nomear o membro do tribunal, seja em relação ao quinto, seja em relação a todos os membros do STF, do STJ, dos TRFs e dos TRTs, representa a sociedade. O concurso público não gera maior ou menor legitimidade ao exercente do Poder de Estado. Todos possuem a mesma idoneidade, fruto de norma da Constituição Federal.
A presença de membros das carreiras essenciais ao Judiciário serve, também, para apresentar visão distinta dos membros da corporação de juízes de carreira. Como sabido, o Conselho Nacional de Justiça possui apenas função administrativa, não lhe sendo cabível desenvolver atividade julgadora, donde concluir que a criação do CNJ em nada diminui a indispensabilidade do quinto.
O quinto constitucional, no Brasil, é oriundo da Constituição democrática de 1934, que estatuiu o voto das mulheres e os direitos sociais ou direitos humanos de segunda geração, sendo mantido por todas as cartas constitucionais posteriores. O art.60, parágrafo quarto, da Constituição de 1988 veda seja objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir a separação dos poderes. O quinto constitucional, enquanto legítimo elemento de harmonização e controle dos poderes entre si, inclui-se no núcleo imutável da Constituição, tornando-se indubitável a inconstitucionalidade de sua extinção.
O poder constituinte derivado não possui competência para extinguir o quinto, seja porque ele integra o núcleo imodificável implícito da Constituição, seja porque ele constitui elemento conceitual integrativo da separação dos poderes. No dizer de José Afonso da Silva, atribuir a qualquer dos poderes atribuições que a Constituição só outorga a outro importará tendência a abolir o principio da separação de poderes (in Curso de Direito Constitucional Positivo, 23ª. ed. Ed. Malheiros, SP, p. 67). A extinção do quinto retiraria do chefe do Executivo a competência prevista pelo poder constituinte originário, outorgando-a a outro poder, sendo, desse modo, materialmente inconstitucional.
A independência e a imparcialidade do magistrado não são garantidas por concurso público, nem retiradas pelo democrático processo do quinto. Na realidade, tais qualidades são ínsitas à índole do ocupante do cargo e ao controle social sobre o exercício da função. Inexorável a conclusão da adequação do quinto constitucional, bem assim da inconstitucionalidade da proposta de sua extinção."