Britto: autoritarismo leva país a Estado de Bisbilhotagem em vez de democrático
Brasília, 03/09/2008 - Ao discursar hoje (03) na cerimônia de posse do presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro Cesar Asfor Rocha, o presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil, Cezar Britto, fez duras críticas às crescentes manifestações de autoritarismo e de ataques ao direito de defesa no País, inclusive por setores do Poder Judiciário. Para Britto, por conta desse quadro de anomalias proliferou ultimamente o uso de grampo telefônico, fato que, segundo ele, transformou o Brasil de Estado democrático de Direito em Estado de Bisbilhotagem. "Instalou-se então a Grampolândia e, com ela, um paradoxo: o guardião da Constituição é o Supremo Tribunal Federal, mas o Guardião do Estado é uma engenhoca eletrônica de bisbilhotagem, disputadíssima pelo Ministério Público e policiais, em todas as suas instâncias: Federal, Rodoviária, Civil", afirmou.
"Não obstante a nossa Constituição ter revogado a lógica autoritária e policialesca, vemos com preocupação crescente ela se restabelecer", sustentou Britto em pronunciamento da tribuna do STJ. Conforme analisou, acompanhando tendência de diversos países que a partir dos avanços do terrorismo, aproveitaram para revogar práticas democráticas do Estado de Direito, também no Brasil "já se sustenta que a lei e o devido processo legal nem sempre favorecem o combate ao crime e que, em nome de uma suposta eficácia operacional, seria admissível - e até necessário - descumpri-los".
O presidente nacional da OAB observou que os adeptos do descumprimento de conquistas civilizatórias como o direito de defesa, em nome do combate ao crime, situam-se hoje tanto nos aparelhos policiais quanto no Ministério Público e no Judiciário. "Recentemente, um magistrado chegou a sustentar que leis civilizadas só fazem sentido em países civilizados, excluindo desse rol o Brasil; ora, se o combate à barbárie se der com mais barbárie, então tudo estará barbarizado", afirmou Britto.
De acordo com o presidente nacional da OAB, esse clima está hoje refletido nos ataques comandados por setores da magistratura, do Ministério Público e da polícia à lei 11.767, de 8 de agosto deste ano, que tornou inviolável o escritório de advocacia e, por conseqüência, o direito de defesa. "Pregava-se que o Estado pode investigar, denunciar, processar e julgar sem que o cidadão tivesse o direito de defesa. Felizmente, não foram escutados e a lei 11.767, aprovada por unanimidade pelo Congresso Nacional, foi, finalmente, sancionada".
Britto disse que o lógico seria esperar que, num país democrático, não fosse necessária uma lei de proteção ao direito de defesa, como a que foi sancionada recentemente. "Achávamos que a Constituição-Cidadã já dava guarida à idéia", disse."Mas num país que confunde tortura com crime político, anistia com amnésia e em que, para alguns, portaria de delegado vale mais que a Constituição Federal, tudo se pode esperar - até mesmo que seja necessário ajuizar, como o fizemos recentemente, um pedido de edição de súmula vinculante para que os advogados tenham acesso aos autos".