Couto defende no CNMP fim do terrorismo institucional da Abin e PF

quarta-feira, 03 de setembro de 2008 às 01:18

Brasília, 03/09/2008 - O representante do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) no Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), Sérgio Frazão do Couto, defendeu, durante reunião plena do órgão de controle externo do MP, o fim imediato do "estado de bisbilhotice" que vive o país, citando inclusive o grampoefetuado no telefone do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Gilmar Mendes pela Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e tornado público pela revista Veja. "Não dá mais para se continuar com esse estado de barbaridade generalizado. É preciso que a cidadania se indigne e se revolte contra esse estado de terrorismo institucional que se implantou no Brasil". Segue o voto do representante da OAB:


"A mim preocupa, sobremaneira, os excessos praticados por agentes públicos e privados quando, à guisa de cumprir o dever, buscam oportunidade para desfrutar dos 15 minutos de fama a que se referia Andy Warhol.


Ninguém desconhece o poder da mídia em influenciar a condenação ou a absolvição perante a opinião pública, sem submeter o acusado a um mínimo e prévio julgamento legal e, portanto, supostamente, justo.


A utilização do poder de influência dos meios de comunicação para alcançar fins egoísticos, para escandalizar e para intimidar os cidadãos, via ameaça da manipulação da opinião pública, é uma das atitudes mais mesquinhas e covardes que alguém pode praticar contra a dignidade da pessoa humana.


Mesquinha porque somente uma alma pequena e/ou uma mente paranóica pode colher prazer em destruir a dignidade de uma pessoa que, por mais execrável que possa ter sido o seu proceder, continua sendo um ser humano. Não um verme abjeto, a ser pisoteado até a morte moral ou física.


Covarde, porque não dá à vítima do escândalo nenhuma chance de defesa ou de recuperação.


Por via dessas deploráveis atitudes de estrelismo usando indevidamente os cargos e funções públicas desempenhadas, invadem-se os lares ao amanhecer, portando armamentos pesados, na companhia das equipes de filmagens previamente convocadas.


Apontam-se as armas para as cabeças dos pais, na presença das esposas, das filhas adolescentes e das crianças aterrorizadas, ainda trajando as vestes sumárias de dormir, só para humilhar e causar traumas psicológicos irreversíveis.


São atos de selvageria institucional revoltantes, publicados sem o mínimo pudor ou comedimento.


Não dá mais para se continuar com esse estado de barbaridade generalizado!


É preciso que a cidadania se indigne e se revolte contra esse estado de terrorismo institucional que se implantou no Brasil.


Não se pode, em nome e ao argumento nobre de combater a corrupção, continuar a cometer atrocidades contra os acusados, - indefesos em todos os sentidos -, e suas famílias prostradas.


Chegou-se a um ponto tal que nem mesmo as mais altas e respeitáveis autoridades da república brasileira estão à salvo da sanha policialesca que toma substância na bisbilhotice oficial e na invasão desvairada da privacidade, via escutas telefônicas - autorizadas ou não -, que nos nivelam às mais degradadas republiquetas, onde o comando cabe aos tons-tons macoutes ou às milícias justicialistas.


Não é admissível que, à guisa de se defender a moralidade pública, se implante no Brasil o modelo sádico adotado na base militar americana de Guantánamo, que já provocou, até mesmo, a justa repulsa do traumatizado povo americano, via intervenção severa de sua Suprema Corte de Justiça, que garantiu aos acusados do massacre de 11 de setembro, o sagrado direito de defesa.


Aqui em nossa pátria amada, quando o Presidente do STF - Supremo Tribunal Federal, Ministro Gilmar Mendes, reprovou esse status quo de intimidação, via vazamentos de informações sigilosas, o mundo se lhe caiu sobre a cabeça.


Trataram-no como se estivesse ele cometendo um crime de mais alta traição e, não, falando a mais pura - conquanto que, desafortunadamente, a mais chocante das verdades, tal como, hoje, está chocentemenbte comprovado.


Até impeachment se lhe requereram, escrevendo-se, com a iniciativa, uma das mais vexatórias páginas da história da Justiça brasileira.


Sobre o episódio, ao que sei, somente o Presidente Nacional da OAB, em exercício, WLADIMIR ROSSI, teve a coragem de vir a público para dizer que a operação "recoloca em cena todo o aparato heterodoxo de investigação, que fere o devido processo legal e enfraquece a autoridade moral do Estado diante de uma das demandas fundamentais da cidadania brasileira: o combate ao crime - em especial, o crime do colarinho branco".


E que "O uso sistemático de grampos ambientais em escritórios de advocacia - e agora, segundo consta, até mesmo no gabinete do presidente do Supremo Tribunal Federal, autorizado por magistrado de primeira instância - infringe o direito à privacidade, prerrogativa que é não apenas do advogado, mas do cidadão, a quem seu trabalho se destina, e que está fundamentado na Constituição."


Esses despautérios tornaram-se tão alarmantes que exigem reflexão: ou optamos por conservar o estado democrático de direito pelo qual tanto lutamos, ou deixaremos que aqui se reinstale o estado policialesco do qual tanto já nos envergonhamos.


Conforme declarações do Presidente Nacional da Ordem dos Advogados do Brasil, CEZAR BRITTO, "O combate ao crime do colarinho branco só terá êxito quando os diversos segmentos que o integram se unirem em ação articulada. Não pode ser apenas policial, judiciário ou político, mas a soma de todos esses fatores, em prol da causa comum que os une."


Diz CEZAR BRITTO que quando os homens de bem do país, "sobretudo no âmbito da Justiça", se desunem, o crime sai vitorioso."


E adverte que "Não pode o combate ao crime se dar ao arrepio da lei. Quando isso acontece, o crime também vence, pois o réu vê-se transformado em vítima, e a discussão formal - a transgressão dos ritos legais - se sobrepõe inevitavelmente ao essencial: os delitos cometidos."


E conclui o Presidente Nacional da OAB que: "Basta de impunidade. Basta de revezes. Basta de espetáculos pirotécnicos inúteis. Combate ao crime não é show televisivo. É hora de os homens de bem se unirem na luta efetiva contra o mal."


Malgré tout, parece que as palavras dos homens de bens deste país estão soando no deserto.


No deserto de direitos e de garantias em que se transformou a paisagem institucional neste país, onde se chega ao cúmulo da Polícia controlar, por via da chantagem intimidatória e ameaçadora, a própria Justiça, obrigando os magistrados a emitirem torrentes de ordens de intercepção telefônicas e, avalizar as mais terríveis e carniceiras diligências policiais.


Agora, para espanto internacional, estamentos indispensáveis à administração da Justiça no Brasil, já chegaram, até mesmo, a propor a quebra do sigilo das comunicações entre advogado e seus clientes, assim como a revogação da garantia da inviolabilidade dos escritórios de advocacia.


Em nota técnica, a OAB denunciou que, "Em todo o país que se entende democrático, o direito de defesa é princípio fundamental. Permitir que o Estado-polícia, o Estado-ministério público e o Estado-juiz espionem, vasculhem, invadam e destruam a defesa é fortalecer a lógica autoritária que a Constituição Federal expressamente revogou há vinte anos. Rejeitar essa garantia é praticar grave injustiça contra a advocacia brasileira, que, desde o seu nascedouro, lutou bravamente para garantir as prerrogativas da magistratura e do Ministério Público, quando ameaçadas pela ditadura militar. Querer revogar o direito de defesa sob o argumento de que alguns advogados cometem deslizes éticos é o mesmo que querer acabar com a vitaliciedade da magistratura porque alguns magistrados compactuam com a corrupção. Da mesma forma é defender a mordaça do Ministério Público em razão de alguns dos seus integrantes não se escusarem a quinze minutos de fama nos noticiários nacionais. A advocacia sempre separou o joio do trigo. Não confunde a democracia com autoritarismo, não embaralha no mesmo conteúdo magistratura e Ministério Público com aqueles que não respeitam a ética e praticam o crime. A inviolabilidade não é do advogado, mas do cidadão e de seu direito amplo à defesa."


As demências tirânicas que estão ocorrendo no Brasil não são novidades na história dos desvarios da humanidade.


Napoleão, irritados com os advogados que se lhes opunham, pregou a necessidade de cortar-lhes a língua. Para enfraquecê-los, mandou fechar o Barreau parisiense.


As atrocidades nas masmorras de Paris tornaram-se tão chocantes e assustadoras que o imperador não teve outra alternativa senão reabrir o Barreau e garantir o direito de defesa a todos os acusados.


Hitler e Mussolini também fecharam os escritórios de advocacia, de modo a mais livremente poderem cometer os crimes contra a humanidade que cometeram.


Aqui no Brasil, RAIMUNDO FAORO, indagado pelo Presidente GEISEL sobre o que deveria fazer para conter as torturas nos quartéis, respondeu seco e sereno:- restabeleça a garantia do habeas corpus.


Assim foi feito e assim se deu passagem para a reconquista da liberdade democrática, hoje posta de volta em perigo.


Ainda na aludida nota técnica da OAB, são feitas outras advertências. "É missão da advocacia, aqui e nos demais países democráticos, cuidar do direito de defesa do cidadão. Enfraquecer, proibir ou criminalizar a advocacia é também atacar o direito de defesa... da mesma forma com que a ditadura militar revogou o habeas corpus para os presos políticos."


E que, "Todos têm que observar os limites e garantias constitucionais. O Estado tem o dever de punir, mas não poder retirar o direito do cidadão de se defender. Por exemplo: a caso legalizado o grampo da conversa do advogado com o seu cliente, o que nem a ditadura militar ousou fazer, somente restará ao cidadão o silêncio como defesa. Nem seu advogado saberá o que ocorreu, pois caso ouse perguntar algo ao seu cidadão-cliente estará contribuindo para que este se auto-incrimine. Sobrar-lhe-á, para que efetue a defesa, o recurso da telepatia."


Prossegue afirmando que "O erro cometido por alguns advogados não pode justificar o erro de se revogar o direito de defesa. Transformar a advocacia em cúmplice da criminalidade é o maior sonho dos inimigos da democracia. Assim ficariam eles livre para errar, perseguir ou tornar verdadeiras as suas teorias morais. Ser o responsável pelo direito de defesa não faz do defensor o próprio criminoso. Confundir esta regra é extremamente grave."


Finaliza lembrando que "Proteger a fé dos cristãos foi o principal argumento da Inquisição para perseguir, torturar e assassinar os próprios cristãos. Proteger os colonos da má-leitura foi o argumento utilizado pelo Marquês de Pombal para estabelecer a censura no Brasil. Não são diferentes os argumentos utilizados pelos censores e autoritários espalhados pelo mundo. Direito fundamental não se castra, se reconhece."


Diante do que se vê, é de se perguntar: Será que vamos desprezar as lições do passado e enfrentar novamente todas as desgraças pelas quais já passamos?


Será que teremos de implodir o estado democrático de direito tão duramente conquistamos para, só depois de muitos outros sofrimentos, recuperar a razão pura e a razão prática que devem nortear o caminhar evolutivo de uma república que se dá ao respeito?


Ou será que chegou a hora e a vez de se reagir contra esse estado de coisa que se implantou no Brasil e retomar o respeito pelos direitos e garantias fundamentais que o povo brasileiro consignou em sua Lei das leis?


Que cada um responda a essas preocupantes perguntas para as suas próprias consciências, e escolha qual o melhor caminho que deve ser seguido. Se aquele do progresso e das luzes, ou se aquele outro do obscurantismo e das trevas.


Quanto à pretensão deduzida, não a conheço porque a mesma não se insere entre as competências deste CNMP - Conselho Nacional do Ministério Público.


É COMO VOTO".