Britto apóia PL que prevê mudanças na lei do abuso de autoridade
Curitiba (PR), 27/07/2008 - "Há uma lógica de que, para combater o crime, tudo é possível, inclusive violar os direitos constitucionais. A atual lei de abuso data da época da ditadura militar, em que o estado era considerado o todo-poderoso e a única razão da democracia. Só isso já demonstra ser necessário revisar este tema tão importante para a cidadania." A afirmação foi feita por Cezar Britto, presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), em entrevista ao jornal Gazeta do Povo (PR). O PL foi apresentado ao governo e a partidos pelo deputado federal Raul Jungmann. Segue a íntegra:
P - O senhor é a favor de mudanças na lei de abuso de autoridade?
R - Claro que sim. Estamos assistindo nos últimos tempos, tanto no mundo quanto no Brasil, a um fortalecimento da cultura autoritária, em detrimento dos direitos individuais dos cidadãos. Há uma lógica de que, para combater o crime, tudo é possível, inclusive violar os direitos constitucionais. A atual lei de abuso data da época da ditadura militar, em que o estado era considerado o todo-poderoso e a única razão da democracia. Só isso já demonstra ser necessário revisar este tema tão importante para a cidadania.
P - A atual lei é de 1965. Não parece estranho que as sugestões de mudança ocorram logo agora no calor das investigações de crimes de colarinho branco, que envolvem pessoas ricas?
R - Não se muda uma legislação dentro de uma proporcionalidade temporal. A Lei de Imprensa, por exemplo, é de 1967 e somente agora é trabalhada pelo Supremo Tribunal Federal. No caso do abuso de autoridade, a mudança decorre diante do fortalecimento do autoritarismo após a queda das Torres Gêmeas (2001). Depois desse episódio, passou-se a espalhar pelo mundo idéias antes inimagináveis: prisões clandestinas, torturas, autorização para matar antes de se averiguar o crime, como ocorreu com o brasileiro Jean Charles em Londres.
P - Como essa onda internacional afeta o Brasil?
R - Começam a serem divulgadas as máximas autoritárias de que bandido bom é bandido morto, de que a polícia é boa porque prende e o Judiciário é ruim porque solta. Na dúvida, o cidadão é criminoso. Prende-se primeiro para se investigar depois. Ninguém é inocente até que se prove os valores. Advogado é tão criminoso quanto o cliente. É por esse contexto que precisamos adequar a lei aos tempos democráticos.