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Artigo: Advogado não pode ser delator

quarta-feira, 14 de novembro de 2012 às 17h29

Brasília – O artigo “Advogado não pode ser delator” é de autoria do secretário-geral do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Marcus Vinicius Furtado Coelho, que já presidiu a Comissão Nacional de Legislação da entidade, e foi publicado no jornal O Globo desta quarta-feira (14).

Segue a íntegra do artigo:

Imagine o cidadão necessitando de um advogado, narra-lhe todos os fatos, com riqueza de detalhes. O advogado, em vez de apresentar a defesa do cidadão, dirige-se à parte adversária e delata o seu cliente. Aquilo que seria a defesa se torna prova de acusação. Seria o fim do direito de defesa. Tal quadro é o que busca impor a Lei 12.683, que cuida da antilavagem de capitais.

O devido processo legal, com plenitude do direito de defesa, pressupõe a preservação do sigilo na relação entre o advogado e o cidadão que necessita da defesa de seus direitos. Ao longo de sua história, a Ordem dos Advogados do Brasil tem adotado medidas contrárias ao ferimento a tal postulado, seja impedindo escutas e interceptações na conversa entre o advogado e seu constituinte, seja vedando busca e apreensão em escritórios de advocacia. O atual desafio é não possibilitar que seja o advogado transformado em delator de seu cliente, contestando a aplicação da Lei 12.683 ao exercício da advocacia.

A Constituição Federal, art. 133, considera o advogado inviolável e indispensável à Justiça. Com tal medida, visa a proteger o cidadão que necessita da atuação profissional em defesa de seus direitos. Com tal visão, foi sancionada a Lei 11.767, que veda a busca e apreensão em escritórios de advocacia, exceto quando o advogado for autor de um crime, sendo indiciado ou denunciado por algum tipo penal. Mesmo no caso de busca e apreensão permitida, veda-se a utilização dos documentos, das mídias e dos objetos pertencentes aos clientes.

A confidencialidade que deve presidir a relação entre advogado e cliente impede a incidência da Lei 12.683, de 2012, que versa sobre os crimes de lavagem de dinheiro ao exercício da advocacia. O advogado não pode ser transformado em instrumento de acusação, subvertendo o sistema de defesa, violando frontalmente o necessário devido processo legal e desprezando a indispensabilidade do advogado.

O parecer da Procuradoria Geral da República, nos autos da Ação Direta de Inconstitucionalidade 4.841, admite a "discussão específica em relação à advocacia, em razão de sua conformação constitucional". Para o Ministério Público, a lei antilavagem "não alcança a advocacia vinculada à administração da justiça, porque, do contrário, se estaria atingindo o núcleo essencial dos princípios do contraditório e da ampla defesa". Ainda segundo o parquet, o sigilo profissional também deve ser "assegurado ao advogado no âmbito do processo administrativo, das atividades de consultoria preventivas de litígio e da arbitragem". O parecer, embora signifique um reconhecimento à essencialidade da advocacia ao devido processo legal, constituindo um avanço, é insuficiente, por não afastar da incidência da norma todas as atividades do advogado.

O desrespeito ao sigilo profissional do advogado viola o Pacto San José da Costa Rica, de Direitos Humanos, especialmente no capítulo destinado às garantias judiciais. Tal pacto foi positivado e incorporado no direito brasileiro pelo Decreto 678, de 06/11/1992, possuindo natureza de norma constitucional, sendo garantia individual contra indevida e abusiva ingerência do Estado na esfera de autonomia do cidadão.

A dignidade da pessoa é o limite para a ação investigativa do Estado. A defesa dos interesses do cidadão, expressada pela atividade de advogado, não pode ser utilizada como instrumento de acusação. Não é lícito ao Estado invadir a sacralidade da relação entre o cliente e seu advogado. O constitucional exercício da advocacia não há de ser criminalizado. Também não pode ser utilizado como forma de condenar, como meio de prova para punir, subvertendo por completo os cânones constitucionais asseguradores do direito de defesa e do devido processo legal.

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